O trabalho do italiano Gaetano Pesce, 70 anos, é conhecido pela busca da multifuncionalidade. Criador do Organic Building (em Osaka, Japão), de objetos copiados no mundo todo como a cadeira Up (que ele desenvolveu em 1969), com obras expostas no MoMA, Centre Georges Pompidou (Paris) e Museu D?Arte Moderna (Turim), o arquiteto e designer acaba de apresentar um objeto cuja proposta de interação está além da sua própria inventividade.
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É assinado por ele o novo modelo lançado pela marca Melissa. O calçado tem o formato de uma ankle boot, mas pode dar origem a variadas opções, com a eliminação de alguns dos círculos de plástico de que é composto (eles são vazados e unidos apenas pelas bordas).
O arquiteto, radicado em Nova York (Estados Unidos) desde os anos 1980, concedeu entrevista exclusiva ao Diário Catarinense durante a temporada de moda carioca, o Fashion Rio. No evento, foi instalado um lounge para apresentar a Melissa + Gaetano Pesce.
DC – Há algumas temporadas a moda brasileira tem buscado muitas referências na arquitetura. Você vê alguma conexão entre estas duas áreas?
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Gaetano Pesce – As duas áreas são muito diferentes para mim. Não acho que a moda siga a arquitetura. A moda é mais livre na forma, a arquitetura é mais rígida. A moda é mais abstrata e muito mais rápida: vem, acontece e logo se desfaz. A arquitetura fica, tem uma duração longa. Mas atualmente os arquitetos estão percebendo que a arquitetura também pode ser um pouco mais livre. A arquitetura era muito fria e agora está mais quente, e a moda é quente.
DC – O que você acha da arquitetura criada atualmente por profisisonais brasileiros?
Pesce – Acho que o Brasil está num ótimo momento, fazendo história, e melhor do que outros países. Sinto aqui uma energia que não é muito forte nos outros países. Sobre o próprio Oscar Niemeyer, me impressiona o fato de ele conseguir ter ideias tão novas depois de tantos anos de profissão. Há 20 anos ele era concreto, forte, hoje consegue inovar com criações bem figurativas.
DC – A poltrona Up, criada por você, é bastante copiada no Brasil, vendida até mesmo em lojas populares. O que você acha das cópias?
Pesce – Quando você é copiado, você vê que a coisa é mesmo boa. Quem copia é porque teve interesse, porque gostou. Acho que a cópia é, na verdade, um tributo. Tenho certeza que daqui a um ano todo mundo vai estar produzindo calçados iguais a este da Melissa.
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DC – Você já tinha produzido antes um objeto que servisse para ser vestido ou calçado?
Pesce – Não é a primeira vez que crio, mas a primeira em que foi colocado em produção. Em 1970, criei um suéter para a revista Elle francesa. Era para os leitores copiarem a ideia, mas eu mesmo não cheguei a produzi-lo. Depois, desenhei uma sandália, mas ela também não foi produzida.
DC – Quais as dificuldades que você encontrou para trabalhar neste projeto?
Pesce – Achei muito fácil criar o calçado para a Melissa, porque o projeto possuía um histórico e outros designers já o tinham feito, como Vivienne Westwood e os irmãos Campana. Só que os designers anteriores criaram uma extensão de seu próprio trabalho anterior, transformado em plástico. Eu quis fazer mais do que isso. Tentei trabalhar com o conceito de criar algo que a pessoa pudesse deixar do jeito que ela gosta. Concebi um sapato que já é elegante, mas além disso a pessoa possa intervir e deixar de seu jeito. Quando as pessoas compram, recebem a sugestão de que podem cortar o sapato usando uma tesoura, para expressar o seu gosto. É como comprar um pedaço de papel e um lápis.
DC – Existem alterações já propostas pelo fabricante, mas o consumidor também pode criar um modelo exclusivo?
Pesce – Sim, mas quando o consumidor fizer o corte precisa ter a noção de que é um sapato, e que este deve continuar usável.
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DC – O material plástico usado é o mesmo de outros modelos da marca?
Pesce – Sim, mas há o projeto de um material que mude de cor conforme a temperatura, por meio da injeção de um pó. A cor pode ir mudando ao longo do dia, conforme a temperatura cai. É uma proposta para a próxima coleção. Também há a ideia de lançar outros acessórios, como cintos e bolsas.
DC – Você costuma trabalhar com plástico em suas criações como arquiteto e designer? O que acha deste material?
Pesce – Eu sempre crio com material mais contemporâneo. Não gosto de materiais tradicionais como madeira, vidro e metal.
DC – Quanto tempo você levou para desenvolver o modelo Melissa + Gaetano Pesce?
Pesce – Fui convidado há um ano e meio. Fiquei muito feliz e comecei a trabalhar nele com muito entusiasmo. Precisei de uns três meses para criar o modelo. Quando vim a São Paulo, no ano passado, já tinha o modelo pronto. Mas levou cerca de um ano para desenvolver o protótipo.
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:: Leia mais sobre a Melissa + Gaetano Pesce no blog O Básico