Deonísio da Silva é catarinense de Siderópolis, cidade do Sul do Estado, próxima a Criciúma, e este mês recebeu da Academia Catarinense de Letras (ACL) o prêmio de Melhor Romance com o livro Lotte & Sweig. Morador do Rio de Janeiro, Deonísio é professor titular de Literatura na Universidade Estácio de Sá e concilia sua vida de escritor com a colaboração na imprensa com crônicas e até uma coluna sobre etimologia na revista Caras. Com 34 livros publicados, sendo que alguns foram traduzidos para o sueco, alemão, italiano e espanhol, com Deonísio o mito do escritor-sofredor não tem vez.

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– Nunca tive uma concepção dolorosa da existência. Acredito na alegria – declarou o escritor durante a entrevista concedida ao Diário Catarinense em Florianópolis, no apartamento de seu amigo de infância, Wilson Volpato.

DC – Como foi a entrega do Prêmio de Melhor Romance do Ano da ACL?

Deonísio da Silva – Foi bem legal. Eu não conhecia o restaurante Lindacap, adorei. Eu já ganhei prêmios importantes, um deles, o prêmio internacional Casa de las Américas, em júri presidido por José Saramago, para o livro Avante, soldados: para trás, de 1992, mas sinceramente, receber um prêmio da sua terra, de onde você nasceu, é diferente, é um afago interessante.

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Como você começou a escrever?

Deonísio – Eu sempre quis ser escritor, mas não ousava dizer isso. Achava que não podia manifestar essa vontade, era meio inconfessável. A partir dos 16 anos trabalhei como professor para pagar as contas – lecionava português, inglês, francês, história, geografia, tudo que fosse da área de humanas.

Escritor não era uma profissão que prestasse, não fazia parte do leque das profissões disponíveis, como engenheiro, médico, administrador. Não dá dinheiro, então é difícil confessar isso. As pessoas confundem sucesso com capacidade de ganhar dinheiro. É isso que se mede. Se a pessoa é infeliz com muito dinheiro, ou feliz com pouco, isso ninguém vai ver.

Com 14 comecei a escrever diários, poesia, e acabei começando minha vida de escritor de uma forma apavorante, publiquei meu primeiro conto no jornal e no dia seguinte fui preso pelo Dops. Fiquei 72 horas incomunicável, depois fui liberado pelos militares, mas os civis me condenaram a dois anos de prisão, que eu cumpri em liberdade. E nunca parei de escrever. Continuei reincidindo no crime (risos).

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Você tem algum projeto em andamento?

Deonísio – Ano que vem vou lançar um livro sobre Alberta Rosenbroque, que está sendo canonizada e será a primeira santa brasileira. Ela nasceu na região de Laguna. Aos 12 anos ela foi assassinada por um empregado da família em uma tentativa de estupro, em 1931. Ela era dada como milagreira e para fazer o romance consegui o processo de canonização dela com o Vaticano. Agora só falta a condenação pela Justiça brasileira do homem que a matou. Foi mais fácil o Vaticano do que a Justiça brasileira.

Fica um carinho diferente para o Lotte & Sweig com o prêmio da ACL?

Deonísio – Livros são como filhos. Fica difícil dizer “esse é mais bonito”, mas de alguns a gente gosta diferente. O Avante, soldados: para trás eu tenho uma afeição diferente porque foi um livro que me abriu as portas para o exterior em 1992. Lotte também já nasceu projetado para o exterior. Temos uma tradução em italiano aprovada e uma alemã que não foi aprovada. As pessoas não sabem o quanto a gente sofre com livro publicado…

Você acredita que a língua é uma barreira para a literatura brasileira? A obra da Clarice foi relançada esse ano em uma nova edição e a tradução parece ter sido um problema para a difusão da obra dela.

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Deonísio – Gosto muito do outro modo de dizer, então não acho que a tradução seja uma barreira. Conheci a Clarice, fomos companheiros de editora. Uma vez fomos com amigos ao Luna almoçar, ela era conhecida do restaurante e quando o garçom veio perguntar o que queríamos ela disse que não queria nada do menu e pediu ao garçom que fosse comprar um galeto para ela. É uma lembrança incrível essa dela, tão linda, destroçando aquela galinha, pura, sem arroz, sem nada, em pleno almoço. Fiquei embasbacado vendo aquilo. Rubem Fonseca, que estava com a gente, dizia “liga não, Clarice é louca”.

Lotte & Sweig

128 páginas

Editora Leya

Valor médio: R$ 39,90