Entregar crianças voluntariamente para adoção é permitido por lei no Brasil. Desde novembro de 2017, a legislação respalda a decisão da mulher de não ficar com a criança após o parto e liberá-la para ser acolhida por alguma família integrante do Cadastro Nacional de Adoção. Recentemente, o assunto voltou a ser discutido após a atriz Klara Castanho relevar que engravidou ao ser vítima de estupro e que decidiu entregar o bebê para ser adotado. 

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Segundo o promotor de Justiça João Luiz de Carvalho Botega, que é coordenador do Centro de Apoio da Infância, Juventude e Educação do Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), é necessário que as mulheres saibam que têm esse direito, que são amparadas pela lei e que todo o processo ocorre de forma sigilosa.  

— A entrega voluntária é um direito da mãe e da criança, mas por ser algo muitas vezes desconhecido, as pessoas acham que é crime, que é errado… Ao contrario, entregar não é só direito, mas um ato de amor porque a mãe diz: “Eu não me acho apta a cuidar desse bebê por ‘n’ motivos e vou entregar essa criança para uma familia que já foi preparada”. Infelizmente ainda tem muito julgamento e as pessoas desconhecem o próprio fluxo do Eca [Estatuto da Criança e do Adolescente] que garante sigilo, sem expor a mãe e a criança — afirma o promotor. 

De acordo com o coordenador, a Lei nº 13.509 não define motivos específicos para que a entrega seja feita, podendo ser por razões financeiras, psicológicas ou qualquer outra. Segundo o Tribunal de Justiça de Santa Catarina, a legislação também define que as mulheres que desejem fazer essa entrega devem ser acompanhadas por uma equipe especializada e multidisciplinar. 

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— Quando a genitora manifesta esse desejo, ela tem que ser acolhida e informada. Essa é uma decisão que ela tem de tomar voluntariamente, não pode ser obrigada por ninguém. Então quando a mãe manifesta esse desejo, ela deve ser ecaminhada para a Vara da Infância e Juventide, onde vai ocorrer o processo jurídico — explica João Botega.

Na Vara da Infância e Juventude é feito um estudo para evidenciar se esse é o desejo da mãe e, quando a criança nasce, é feita uma audiência com o Judiciário.

— Nos dias seguintes ao nascimento do bebê já é feita uma audiência com um juiz e promotor. Se a mãe reiterar esse desejo, a criança vai para o cadastro de adoção e segue para a família. O ideal é que a criança seja imediatamente levada para a familia adotiva — ressalta o promotor do MPSC. 

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De acordo com a legislação, a vontade da mãe ou de ambos os genitores – se houver pai registral ou pai indicado – pode ser apresentada em qualquer momento da gestação e deve ser confirmada na audiência. Em caso de desistência, há um prazo de 10 dias para que eles informem que não querem mais entregar o recém-nascido. Se isso acontecer nesse período, a criança poderá ser mantida com pais biológicos e será determinado pela Justiça da Infância e da Juventude o acompanhamento familiar por 180 dias.

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— Depois dos 10 dias, o processo de adoção vai seguir e será concluído. Esse processo é irrevogável, por isso tem de ser uma decisão muito bem pensada e informada. O que temos de fazer é entender o desejo da mãe, acolhê-la e encaminhar essa criança de forma rápida para uma família preparada — destaca o promotor. 

Segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em 2020, no Brasil foram registradas 1.012 entregas voluntárias no Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento. O número cresceu no ano seguinte e chegou a 1.238 entregas. Já em 2022, até o mês de junho, foram recebidas 484 crianças com adoções já encaminhadas. A reportagem entrou em contato com o Tribunal de Justiça de Santa Catarina para saber os números do Estado, mas foi informada de que os dados são sigilosos.

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Em julho do ano passado, o MPSC sugeriu à Comissão de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente da Assembleia Legislativa a criação de um Projeto de Lei para a colocação de placas informativas em unidades públicas e privadas de saúde de Santa Catarina. 

As placas estariam em locais de fácil visualização para esclarecer que “a entrega de filho ou filha para adoção, mesmo durante a gravidez, é direito da mulher, e aqueles que queiram fazê-lo ou conheçam alguém que queira, devem procurar a Vara da Infância e Juventude, e esse procedimento além de contar com amparo legal possui caráter sigiloso.”.

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Segundo o ofício do Ministério Público, a propagação dessa informação seria de suma importância e “certamente viabilizará o fortalecimento desse direito garantido às mulheres pelo Estatuto da Criança e do Adolescente”. 

Scheila Frainer Yoshimura é coordenadora voluntária da Casa de Acolhimento Semente Viva, instituição que recebe crianças e adolescentes entre 1 e 15 anos, encaminhados pela Justiça. Para ela, a divulgação sobre este direito é bastante necessário e evitaria outros problemas. 

— A gente entende que essa entrega voluntária, quanto maior disseminada, resulta em menos riscos para as crianças. Muitas mães não têm condições para cuidar da criança e, com a entrega, voluntária uma série de problemas sociais são evitados como os abortos calndestinos e o abandono afetivo. Se mais pessoas soubessem desse direito, teríamos menos crianças em situação de vulnerabilidade — pontua Scheila.  

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