Ao final de fevereiro, a Redação do Diário Catarinense recebeu a (falsa) informação de que crianças estavam sendo raptadas em creches municipais de Florianópolis. O alerta falso disseminado pela internet fez até a prefeitura emitir um comunicado oficial e convocar entrevista coletiva para esclarecer o tema, não sem antes acionar sua Guarda Municipal. Mesmo sem cumprir todos os trâmites básicos de apuração jornalística, o assunto ganhou espaço em veículos de comunicação da cidade, entre eles o Diário Catarinense. Mas nada se confirmou. Somente a posteriori a polícia fez os devidos esclarecimentos. Era apenas um mal-entendido, que veiculado na imprensa tradicional assume ares de verdade e gera mal-estar desnecessário.
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Em 7 de março, outro fato: uma mãe usa uma rede social para emitir um apelo do que seria um sequestro de sua filha. Segundo ela, o pai estaria por levar a garota para o exterior. O uso intenso da rede social pela mãe fez parecer verdadeiro o pedido de socorro. Como o caso chegou a ser registrado na polícia, também acabou sendo noticiado por alguns veículos de comunicação. O DC, com base em apuração que envolveu contato com a mãe, o advogado do pai e a polícia, conseguiu agir de forma bem prudente e esclarecer que não havia tentativa de sequestro, mas um drama familiar.
Em um mundo digital, onde o consumidor assume muitas vezes o protagonismo dos fatos, os jornalistas precisam redobrar cuidados e ser ainda mais céticos. Numa era em que um boato vira verdade instantaneamente com base em dezenas de curtidas ou número de compartilhamentos, aumenta a responsabilidade dos veículos no sentido de ajudar o consumidor a separar boatos e fatos. Se sempre houve a necessidade de certificar a veracidade de lendas e rumores, hoje isso passou a ser prioridade.
Veja outros casos:
Na terça-feira passada, um taxista ligou à Redação, se identificou e afirmou que o suspeito de assassinar o motorista de táxi Robson Tiago Andrade, 30 anos, no sábado de Carnaval, dia 1º de março, teria se enforcado na cela. Era boato.
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Em meio ao Carnaval, espalhou-se uma suposta ameaça de guerra entre traficantes de comunidades que tumultuariam as festividades de Florianópolis. O boato correu pelo WhatsApp de policiais e depois pelo Facebook. Não era verdade.
Ambos os casos, seguidos nos trâmites básicos de apuração, puderam ser esclarecidos antes de chegar à população. Não foram sequer publicados.
No caso das falsas tentativas de sequestro em creche o ponto inicial foi o Facebook, seguido de comentários e temores de motoristas de vans escolares. A direção da creche, igualmente assustada, emitiu um alerta. A lenda urbana teve em sequência a manifestação oficial da prefeitura, um boletim de ocorrência exibido pela própria polícia de uma tentativa de rapto e a informação policial de que seria realizado, inclusive, um retrato falado dos suspeitos de rapto. Tudo isso deu ar de verdade. Não era.
O boletim de ocorrência (BO), se bem analisado, permitia perceber que se tratava apenas de um desentendimento entre famílias vizinhas. Erramos todos, da polícia à prefeitura, da creche aos jornalistas. No caso da mãe desesperada, uns erraram mais do que outros e, apesar de baixa repercussão, o episódio também serve para reapertar os parafusos da credibilidade.
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Com o impressionante fenômeno de proliferação de novas mídias, o substantivo feminino cautela foi alçado ao patamar de postura chave. Tanto para o leitor comum, mas especialmente para quem trabalha em comunicação. Pesquisa do Ibope divulgada na semana passada mostrou que os impressos são líderes em credibilidade. Esta confiança depositada nos jornais só faz aumentar a responsabilidade de cada jornalista.