Se não tivesse escrito seu nome na vida política, Darci de Matos talvez fosse lembrado hoje como um ex-jogador de futebol. Não teria sido um craque, é verdade, mas o deputado estadual do PSD, no alto dos seus 54 anos, ainda trata a bola com jeito nas peladas entre amigos. Seu lugar no gramado é a meia-esquerda. Darci costuma ser o dono da camisa 10, embora diga que prefere jogar do meio para trás.
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A escolha pela carreira pública, assim como seria no campo de jogo, se divide entre vitórias e derrotas. E Darci tem mais histórias de sucesso do que fracassos para contar. Se elegeu e reelegeu vereador em Joinville, além de acumular três mandatos consecutivos na Assembleia Legislativa. A primeira tentativa de ser prefeito, no entanto, bateu na trave em 2008. Embalado pela “onda Lula”, Carlito Merss (PT) somou mais votos naquele segundo turno e adiou os planos de Darci. Não haveria revanche tão cedo.
Quem concorreu à prefeitura pelo PSD na disputa seguinte, em 2012, foi o deputado e colega de partido Kennedy Nunes, desta vez superado pelo atual prefeito Udo Döhler em um concorrido e surpreendente segundo turno. Como quem confia que o tempo trabalha a favor, Darci se agarrou ao discurso de que a chance de se reorganizar e crescer vem na derrota. Ganhou mais cabelos brancos, reuniu o apoio do partido e novamente se vê tão próximo de tocar a cadeira de prefeito quanto esteve oito anos atrás.
A apreensão às vésperas de encarar as urnas neste domingo, ainda que esteja em jogo seu futuro político e o sonho de governar a cidade, ficaria pequena se comparada à incerteza de quando pisou pela primeira vez em Joinville. Darci era adolescente e trazia no currículo uma vida de lida na roça com a família em Cafelândia, Oeste do Paraná. Seguiu os passos de um dos oito irmãos (todos homens), que já buscava uma vida menos sofrida na maior cidade de Santa Catarina. Largou a foice e a enxada para sonhar com a bola. Queria ser jogador de futebol.
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O ex-boia-fria do interior paranaense chegou a vestir a camisa do time juvenil da Sociedade Tigre em Joinville. Só que o futuro nos gramados também desenhava um enorme ponto de interrogação. Darci morava em uma casa simples do bairro Comasa, quando a região ainda era uma grande área de invasão próxima ao mangue, e só sabia que não queria tomar o rumo de volta à lavoura. Escolheu, então, o caminho para aprender na teoria o que já tinha intimidade na prática: mexer com a terra.
Era 1978, ano em que passou a ocupar uma das carteiras da Escola Agrícola de Araquari, município vizinho de Joinville. Darci tinha 17 anos e não fazia ideia, mas dava o pontapé inicial em sua trajetória política. Além de pendurar um diploma de técnico agrícola na parede, virou líder estudantil e assumiu a presidência da cooperativa dos agricultores.
A passagem por Araquari também guarda um capítulo pouco conhecido de sua biografia: foi lá que, pela primeira vez, ele se candidatou a vereador, em 1982. O jovem Darci de Matos somou 98 votos e não conseguiu um lugar na Câmara do município, mas já ganhava prática em memorizar nomes e agendas inteiras de telefone — provavelmente começava ali o hábito de retornar até 30 ligações diárias.
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Naquele mesmo ano, conheceu o serviço público na Fundação 25 de Julho, onde prestava assistência técnica a agricultores da área rural de Joinville. A pedagoga Aparecida do Carmo trabalhava no mesmo lugar. Cinco anos mais tarde, subiram juntos ao altar. A filha do casal, Mariana, veio dois anos depois.
Hoje servidora municipal aposentada, Aparecida fez carreira na assistência social e construiu a ponte para que Darci tivesse contato de perto com moradores de rua e pessoas em situação de risco. É a principal conselheira do marido. Nomes como o governador Raimundo Colombo e o deputado Gelson Merisio, ambos do PSD, também trocam telefonemas frequentes com o candidato.
Um de seus padrinhos políticos já não está mais presente. Foi o falecido Wittich Freitag, ex-prefeito de Joinville, quem nomeou Darci para a presidência da Fundamas, uma referência no ensino profissionalizante, em 1993. Curiosamente, o atual oponente Udo Döhler participou da criação e chegou a assumir a presidência da mesma fundação três décadas antes.
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Com campanha mais acirrada, família virou refúgio e terapia
O retrato de família revela o quanto a vida de Darci de Matos mudou desde a eleição em 2008. Ele e a mulher, Aparecida, viram a única filha, Mariana, se formar em direito e trazer ao mundo a primeira neta do casal, Valentina. A bebê foi um presente que a família ganhou uma semana após o primeiro turno. A casa, agora, está mais cheia. Isto porque a filha e o genro, Gabriel, decidiram se juntar a Darci e Aparecida depois que o rapaz se formou em medicina, no ano passado.
— Chegaram dizendo que queriam ficar juntos da gente para sempre. Foi a maior alegria da vida do Darci — diz a mulher, Aparecida.
Ter a netinha por perto é como uma terapia para o candidato na reta final da campanha. Ao menos no fim do dia. Tem vezes que a agenda de compromissos vai longe, e o deputado encontra a casa quase às escuras. Esse não tem sido o único contratempo que as eleições trouxeram. Com a temperatura subindo nos bastidores da disputa, o candidato pediu que a família não respondesse a ataques e tentasse ficar de fora das polêmicas, especialmente nas redes sociais.
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A exemplo do que Udo Döhler fez na disputa em 2012, Darci de Matos também reservou um espaço na página oficial da candidatura para dar sua versão sobre temas controversos. “Xô boato” é o nome da seção. Um dos textos diz que o patrimônio do candidato é “10 vezes menor do que o alegado pelos seus adversários”.
O apartamento da família, comprado no último ano e financiado até 2040, o sítio de Campo Alegre e as diárias recebidas pelo deputado na Alesc também ganharam esclarecimentos no espaço do site.
Nas horas vagas, paixão por flores e “loucura” por camisas
Que o futebol faz a alegria de Darci nas horas vagas, ninguém discute. É assim desde que ele e os irmãos corriam chutando um amontoado de meias _ ou qualquer coisa que virasse bola _ no interior do Paraná. Mas Darci pendurou as chuteiras nos últimos dias da eleição. É que um escorregão em campo ou uma entrada mais dura poderiam desfalcá-lo da campanha.
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Para não ficar de molho à essa altura do campeonato, como se diz na gíria do futebol, tem sido melhor se poupar. Passatempo inofensivo não falta. Aliás, um dos hobbies preferidos do candidato exige toda a delicadeza do mundo: Darci é apaixonado por flores.
— Gosto muito de flores. Tenho lá no sítio sete espécies de lírios diferentes, quatro tipos de cerejeiras, três tipos de ipês. Gosto de plantar, vibro quando ela floresce, acho bonito—conta.
O sítio da família em Campo Alegre é a casa de outros dois “xodós”. Um deles é Nero, um labrador preto. Outro é Nerinha, uma cachorrinha que apareceu sem ser chamada na propriedade e acabou ficando. Darci também tem uma maltês, Sophie, privilegiada por viver no apartamento do deputado. O sítio ainda tem ovelhas, cavalo pangaré e peixes. Mas ver Darci pescando é coisa rara. Dizem que ele tem “dó” dos bichinhos.
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A vida de trabalho duro na roça, além do jeito com as plantas e a terra, deixou como lição ao candidato o apego às coisas simples. Ele se dá por satisfeito com arroz, feijão, ovo e carne de porco (com bastante alho), por exemplo. Mas admite que, hoje, se permite um luxo inimaginável nos tempos de criança. Darci tem “loucura” por camisas. Fica até confuso quando tem de escolher uma só entre várias opções.
A explicação vem do passado. Havia poucas peças no seu guarda-roupas, e o uniforme da escola era a única escolha possível nos programas de sábado e domingo. Darci lembra que a camisa era bordada com um emblema pouco discreto do colégio, impossível de ser disfarçado. O bullying – que, na época, não tinha esse nome – era inevitável nas idas à missa e às festinhas de fim de semana.
— Isso me traumatizou. Depois de muitos anos eu fui perceber que tenho loucura por camisa. Não dou bola para sapatos, calça, cinto, relógio, nada. Tenho uma loucura por camisa — explica.
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Para ler, biografias; para ouvir, música gauchesca
Ter um filho, plantar uma árvore e escrever um livro. Se esse fosse o projeto de vida de Darci de Matos, ele poderia dizer que a missão já foi cumprida. Não só porque plantou de tudo na vida e até se tornou avô em meio à campanha, mas porque é autor de um livro lançado em 2011: “Drogas —Vidas Roubadas”. Trata-se de um apanhado de histórias de pessoas que trabalham na área e de familiares de jovens usuários de entorpecentes.
O deputado ainda não teve tempo de se debruçar completamente sobre um novo projeto literário, mas já prepara a publicação de um exemplar que reúna artigos assinados por ele mesmo nos últimos anos. A maior influência vem das biografias. Nas prateleiras do candidato estão guardados livros sobre nomes como Albert Einstein, Nelson Mandela, o filósofo Sócrates e Jesus Cristo.
Darci é um homem de fé. Costuma deixar a TV da chácara ligada em algum canal religioso da antena parabólica. Gosta de ouvir os pastores pregando. De vez quando assiste a documentários no Discovery Channel. Quase não vê filmes. Música gauchesca é o que põe para tocar no tempo livre, uma influência dos pais e dos irmãos mais velhos, nascidos no Rio Grande do Sul.
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Confira a carta em que Darci escreve os motivos pelos quais deve ser eleito