Aliada à crise econômica, a inchada folha de pagamento do governo de Santa Catarina começa a expor um problema difícil de ser solucionado. O desafio é como fechar a conta entre as reposições e aumentos de salário e a capacidade da máquina pública de absorver esses valores sem que os impactos sejam sentidos a médio e longo prazos.
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As soluções apontadas pelos dois lados das negociações, fontes ouvidas pela reportagem e especialistas, entretanto, vão além das negociações salariais. Passam principalmente por uma reorganização da previdência e das contas públicas, além, dos famigerados cortes internos. Caso contrário, a conta não ficará apenas restrita aos envolvidos nas discussões salariais, mas também será mais alta para a “maioria silenciosa”, como definiu o secretário estadual da Fazenda, Antonio Gavazzoni, em artigo publicado no Diário Catarinense na última quarta-feira.
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O Estado enfrenta atualmente oito rodadas de negociação com servidores de diferentes órgãos e autarquias. Para todas a oferta é única: zero, nenhum aumento ou reposição. A determinação vem de uma resolução do Grupo Gestor do governo de abril deste ano, que prevê a rejeição de novos aumentos até o final de 2016. Enquanto os trabalhadores cobram a recolocação ao menos de 9,83% do INPC e ameaçam greves, o governo desabafa e critica sindicatos, que segundo ele forçam um gasto impossível de ser feito.
A queda na arrecadação é o principal argumento do Executivo, somada à redução de 5,1% do PIB nos últimos 12 meses. Em agosto, a receita caiu 0,51% em relação a julho e 1,14% em comparação com o mesmo período do ano passado. O Estado alega que a folha de pagamento subiu 100,9% entre 2011 e 2015, contra 40,57% do INPC no mesmo período.
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O grande temor dos governistas é chegar ao nível do Rio Grande do Sul, onde salários são parcelados e serviços básicos ficaram afetados. Gavazzoni diz que a solução passa diretamente por conter despesa, “sobretudo a folha de pagamento”.
Deputado e sindicato pedem revisão das renúncias fiscais
O deputado estadual Dirceu Dresch (PT), que faz oposição ao governo na Assembleia Legislativa, pondera que as categorias com salários menores não podem ser prejudicadas. Ele afirma que a folha precisa ser discutida, mas questiona o aumento de teto salarial do Estado ocorrido em 2013. Assim, segundo ele, servidores que não pagaram a previdência e chegam a postos mais altos esperam chegar ao valor máximo para pouco tempo depois se aposentarem:
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— Tem que repensar. Isso é um saco sem fundo. O servidor não pode ser tratado como vilão, principalmente o que ganha menos.
Dresch ainda aponta dois fatores a serem resolvidos para amenizar a situação financeira: os incentivos fiscais, que de acordo com ele são de R$ 5,1 bilhões em Santa Catarina, e as dívidas de impostos das empresas com o Estado.
— O Estado não tem controle se esse setor beneficiado pelo incentivo fiscal se recuperou. Tem que ter uma reavaliação_ cobra o parlamentar.
Na mesma linha segue o diretor do Sindicato dos Trabalhadores em Empresas e Órgãos de Assistência Técnica e Extensão Rural, Pesquisa e Planejamento Agropecuário e Defesa Sanitária Animal e Vegetal de Santa Catarina (Sindaspi), Daniel Nunes das Neves, que responde por cinco categorias que atualmente discutem reposição salarial:
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— A renúncia fiscal que esse governo está fazendo para a iniciativa privada é astronômica. Chega a ser um quarto da arrecadação.
Neves ainda critica os argumentos do Estado de que não há recursos para pagar a reposição aos servidores. Afirma que levantamentos do sindicato apontam para a manutenção do limite da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) mesmo com os aumentos para as categorias neste ano.
Especialistas recomendam gestão fiscal
Mudanças no regime fiscal são apontadas como fundamentais para o equilíbrio das contas pelo doutor em Sociologia Política pela UFSC e professor da Univali, Flavio Ramos. Alia-se a isso, conforme o especialista, a reavaliação das dívidas:
— Tornou-se consenso de que a economia política dos estados da federação necessitam de aperfeiçoamentos institucionais. Os déficits fiscais se elevam a cada ano, a dívida pública aumenta consideravelmente e forma-se um gap entre receitas, gastos e investimentos. Esforços para equilibrar tal equação passam necessariamente por uma renegociação das dívidas e por um repensar dos mecanismos institucionais que envolvam o regime fiscal dos estados.
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O mestre em Sociologia Política pela UFSC, Eduardo Guerini, critica a forma com que o governo do Estado tratou a crise econômica. Segundo ele, os gestores minimizam os impactos.
— O governo e seus gestores optaram por fazer um gestão de tesouraria, quando deveriam realizar uma gestão fiscal efetiva. Neste contexto, a contração de arrecadação com elevação de gastos com folha e elevado endividamento – fruto de uma taxa de juros abusiva praticada pelo Banco Central e agentes financeiros— corrói a saúde financeira, impedindo a realização de investimentos — avalia.
Negociações salariais
Veja os órgãos que pleiteam reajuste junto ao Estado
Udesc
Ciasc
Epagri
Cidasc
Ceasa
Santur
Sindsaúde
Defensoria pública
Codesc
O que pedem: a maioria reivindica reajuste do INPC de 2015/2016 no valor de 9,83%. Alguns órgãos também discutem cláusulas próprias e vale-alimentação.
O que o Estado oferece: zero
As discussões salariais estão indo parar na Justiça, que decidirá ou não pelo dissídio.