Blumenau bateu recordes de mobilização nas manifestações de 2016. Em 13 de março, 60 mil blumenauenses tomaram as principais ruas pedindo, principalmente, o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, mas também lutando contra a corrupção de qualquer partido ou político. Alguns muros pela cidade ainda ostentam cartazes com a sentença “Fora todos eles!”, estampado com as faces de Dilma, Lula, Michel Temer, Renan Calheiros, Eduardo Cunha e Aécio Neves. O impeachment aconteceu. No Brasil, milhares se manifestaram novamente para pedir a saída do novo presidente e de outros suspeitos de corrupção. Mas, dessa vez, Blumenau não foi às ruas, não bateu recordes. A saída da presidente petista parece ter sido suficiente para os anseios de mudança na política.
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A ausência dos blumenauenses nas ruas tem explicação. Especialistas afirmam que, historicamente, a sociedade iniciada por Hermann Blumenau é conservadora e rejeita com veemência qualquer agenda progressista. Com isso, os movimentos ganharam força pelo descontentamento com o governo do Partido dos Trabalhadores, mas não buscaram, propriamente, um aprofundamento do processo de democratização, avalia o sociólogo e professor da Furb Marcos Mattedi.
Para ele há pelo menos três aspectos que fazem com que a cidade esteja satisfeita com o resultado do processo de cassação da chefe de estado e entenda que não há motivos para novos protestos: a cultura política conservadora, o enfraquecimento da capacidade de organização dos movimentos de esquerda e o entendimento de que a saída do novo governante só pode representar o retorno da anterior.
– Não existem movimentos de “Fora, Temer!” porque as pessoas associam diretamente com um “Volta, Dilma!”, e não enxergam que mais mudanças fazem parte do processo de evolução democrática, como a saída de políticos que não são idôneos, a realização de novas eleições… (Novos movimentos) têm que ser lidos como parte de reestruturação do processo de democratização – explica.
O perfil conservador do blumenauense e a cultura política da região são fatores determinantes que influenciam na ausência de movimentos nas ruas segundo o sociólogo e professor da Furb Luciano Florit.
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– Blumenau é uma região com um reduto anti-PT muito forte e esse movimento existia antes mesmo de aparecerem os escândalos políticos recentes. O pensamento do cidadão daqui é extremamente conservador, com elementos elitistas que se aliam ao discurso empresarial justamente em uma região com tradição em ter aversão ao governo federal – avalia Florit.
:: Lideranças de movimentos admitem distanciamento de protestos em Blumenau
O professor de Ciência Política da Furb, Oklinger Mantovaneli Júnior, pontua que, se há alguns meses a imagem defendida na opinião pública era de que manifestantes que defendiam o governo da época pertenciam a movimentos aparelhados ou defensores de um grupo de poder, agora há um sentimento de que o fisiologismo continua, a ponto de pessoas que foram às ruas protestar contra Dilma cogitarem ir novamente contra Temer em defesa de novas eleições.
Para ele, Blumenau costuma sim demonstrar suas insatisfações, como no movimento Furb Federal ou nos protestos de 2013 e contra Dilma, mas isso depende de autenticidade das manifestações.
– Acho que em boa medida muita gente que está indo às ruas agora é porque tem convicção de que alguma coisa está errada. Acredito que o novo governo deve consolidar algum apoio, ao menos com o empresariado no momento em que ele avançar com a reforma trabalhista. Mas quando fizer isso, vai ser problematizado por outras forças – alerta.
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Conservadorismo e articulações virtuais
Para Nelson Garcia, mestre em sociologia política e professor da Furb, além do conservadorismo da região, a falta de debates entre lideranças de esquerda contribui para não haver manifestações – principalmente contrárias ao governo de Michel Temer em Blumenau:
– Não há mobilização, e a campanha eleitoral até agora mostra isso. As pessoas com influência não estão participando ativamente e, sem liderança, há apenas pequenos grupos que se formam, sem muito apelo. Não há descrédito e sim falta de mobilização.
A professora de Sociologia da Furb e que estuda movimentos sociais da América Latina, Marilu Antunes da Silva, avalia que uma das explicações da falta de manifestação dos descontentes até o momento está no fato de que uma grande parcela da juventude se articula pela internet e redes sociais e em uma linha extremamente conservadora e imediatista. A exceção seriam grupos ligados à questão ambiental, à economia solidária e ao transporte cicloviário, mas cujas pautas são segmentadas e nem sempre envolvem a política nacional.
Como comparação, segundo ela, em Florianópolis o público dos protestos costuma ser formado por homens e mulheres usuários de serviços públicos como transporte coletivo, saúde e universidades federais – onde já foram registrados cortes de orçamento, fazendo-os sentir na pele mudanças de gestão.
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– Quando se fala em movimento social, ele vai se ampliando à medida em que a população sente ter direitos ameaçados. Mas a adesão não vai passar de 40% em Blumenau, porque aqui historicamente a direita leva ao menos 60% dos votos. É só associar que quem esteve no “Fora, Dilma”, que teve um número maior, não estará no “Fora, Temer”. Ainda assim, acredito que a partir de outubro, após as eleições municipais, haja mais mobilização – projeta.