As prisões do ex-secretário de Turismo, Cultura e Esporte de Florianópolis, Ed Pereira, e de outros três ex-servidores municipais na segunda fase da Operação Presságio dão sequência à investigação sobre contratos públicos em Florianópolis. O caso começou com a apuração de um suposto esquema ilegal de contratação de uma empresa terceirizada para a coleta de lixo — a companhia teria sido acionada para atuar durante uma greve da companhia de Melhoramentos da Capital (Comcap), mas permaneceu prestando serviço sem licitação por dois anos.
Continua depois da publicidade
Receba notícias de Santa Catarina pelo WhatsApp
Durante a investigação, no entanto, os policiais também passaram a apurar supostas fraudes em contratos de eventos esportivos, repasses a organizações sociais e até em um estacionamento da Festa Nacional da Ostra (Fenaostra), na Capital, em 2023.
Dos quatro presos nesta quarta-feira (29) na segunda fase da Presságio, dois são citados em uma representação de fevereiro deste ano da Polícia Civil, que detalhava parte das investigações, com fatos relacionados justamente às supostas irregularidades em eventos e repasses para organizações sociais. Trata-se do próprio ex-secretário Ed Pereira e de Renê Raul Justino, ex-diretor de projetos da Fundação Franklin Cascaes, submetida à Secretaria de Turismo, Cultura e Esporte, comandada por Ed.
Na decisão judicial que autorizou a prisão dos quatro investigados nesta quarta, também são citados casos como uma suposta intervenção do então secretário Ed Pereira para favorecer uma empresa na contratação de instalação de estruturas metálicas na Cidade do Samba, em Florianópolis. Também são citados supostos pagamentos de um dono de uma empresa promotora de eventos ao ex-assessor de Ed, Renê Raul Justino, que posteriormente teria sido contemplado com um repasse de R$ 130 mil para apoiar um evento organizado pelo empresário.
Continua depois da publicidade
Veja o que se sabe sobre a investigação
Renê Raul Justino, ex-diretor de projetos da Fundação Franklin Cascaes, submetida à Secretaria de Turismo, Cultura e Esporte
- A representação de fevereiro da Polícia Civil traz informações coletadas no telefone celular de Renê Raul Justino, apreendido na primeira fase da operação, em janeiro deste ano. O documento desta semana afirma que a análise das informações coletadas no celular ainda não chegou ao fim.
- O documento de fevereiro cita uma conversa entre Renê e um interlocutor do ramo de lutas. Renê teria explicado que parte dos recursos públicos destinados à realização de eventos esportivos seria desviada para supostamente ser repassada ao chefe dele, o então secretário Ed Pereira. Em um áudio, ele explica que na hipótese de um evento que custasse R$ 150 mil, iriam “75 pra realização do evento, 75 pro Ed”, segundo um trecho descrito pela investigação da Polícia Civil. O dinheiro destinado ao ex-secretário seria para que ele pagasse dívidas de campanha eleitoral.
- Outro fato com suposta participação de Renê citado no documento da investigação ao que a NSC teve acesso em fevereiro diz respeito a pagamentos feitos pela secretaria a organizações sociais. Uma delas, chamada Instituto Bem Possível, segundo os investigadores seria controlada pelo ex-secretário Ed Pereira. Segundo a Polícia Civil, as organizações sociais emitiriam notas fiscais frias, referentes a serviços não prestados, e repassariam os valores desviados “geralmente para Renê”, segundo outro trecho da investigação. Renê é suspeito de ter feito ao menos um pagamento de R$ 16 mil a Samantha Santos Brose, esposa de Ed Pereira.
- Por fim, Renê também é citado na terceira frente da investigação, que envolve um estacionamento fraudulento que teria sido montado ao lado da Festa Nacional da Ostra (Fenaostra), em novembro de 2023, em Florianópolis. Em uma troca de mensagens com Ed Pereira, Renê teria afirmado que a Polícia Militar esteve no local após a primeira noite de funcionamento do estacionamento, com questionamentos como quem era o responsável pelo espaço e se o dinheiro pago pelos motoristas iria para a prefeitura ou para particulares. Após a abordagem, Renê explicou que por precaução ele teria mandado “esconder tudo” e aconselha o ex-secretário que, pelo movimento registrado na noite anterior, a empreitada “não valeria o risco”. Outro fato curioso deste episódio é que o ex-diretor admite que pessoas que estavam no albergue (supostamente a Passarela Nego Quirido, que fica ao lado do local onde ocorreu a Fenaostra) é que teriam cuidado dos carros estacionados.
- No despacho que autoriza as prisões de Ed Pereira e dos outros três investigados, Renê também é citado como assessor que teria recebido dois orçamentos de Ed Pereira, para elaboração de uma licitação para contratar a instalação de estruturas metálicas na cidade do samba, de Florianópolis. Ele também teria sido cobrado pelo então secretário para que atuasse com mais agilidade na elaboração do termo de referência desta licitação. Segundo os investigadores, Ed teria repassado um áudio de um sócio da empresa a ser beneficiada em que ele daria orientações para elaborar o edital. Ao fim do processo, a empresa a ser beneficiada foi contratada por R$ 980 mil, em contrato prorrogável por até cinco anos.
- Ainda segundo o documento que autoriza as prisões preventivas, Renê teria intermediado o contato de Ed com um empresário do ramo de corridas. Ele teria recebido valores indevidos do dono da empresa promotora de eventos, e também teria participado de negociações que resultaram em um repasse de R$ 130 mil com inexigibilidade de licitação para apoiar evento do empresário citado.
- Segundo investigação da Polícia Civil detalhada na decisão que autoriza as prisões preventivas, Renê seria o operador financeiro da suposta organização criminosa.
Ed Pereira, ex-secretário de Turismo, Cultura e Esporte de Florianópolis
- A representação da Polícia Civil cita o ex-secretário nos mesmos fatos relacionados à participação de Renê Raul Justino na Operação Presságio.
- Ed Pereira é apontado por Renê como o beneficiário de recursos supostamente desviados de eventos esportivos, como uma competição realizada no Norte da Ilha e que teria rendido R$ 80 mil.
Continua depois da publicidade
- O ex-secretário também é citado como beneficiário de recursos que seriam destinados pelo poder público a organizações sociais, e que depois seriam repassados a Renê. A investigação também apresenta mensagens em que Ed teria determinado mudanças nos valores pagos a prestadores de serviço do instituto. Segundo a polícia, isso indicaria que seria o ex-secretário quem comandaria a organização.
- Por fim, no episódio do estacionamento da Fenaostra, a investigação da Polícia Civil também apresenta mensagens trocadas por Ed Pereira com Renê, em que o então secretário pergunta quantos carros haviam estacionado no local na noite anterior, antes da abordagem da Polícia Militar, e se o resultado “vale o risco”.
- Já no despacho que autoriza as prisões preventivas dos quatro investigados, Ed é citado tendo encaminhado a Renê dois orçamentos e um áudio com orientações de um empresário para elaboração de um termo de referência de licitação. O edital visava contratar a colocação de estruturas metálicas para a “Cidade do Samba”. Ele também teria cobrado agilidade no processo.
- Outro fato citado no pedido de prisão é uma suposta irregularidade no patrocínio da Secretaria de Cultura, Turismo e Esporte a uma corrida de rua. Segundo a Polícia Civil, Ed teria feito uma solicitação de que um empresário deste ramo pagasse valores mensais ao ex-assessor Renê, até a nomeação dele em algum cargo na prefeitura. Após a nomeação de Renê na direção da Fundação Franklin Cascaes, o empresário teria perguntado se Ed havia debatido com o assessor sobre o incentivo de R$ 200 mil para uma corrida na Capital. Ao fim das negociações, em junho de 2023, foi publicado no Diário Oficial uma autorização para repasse de R$ 130 mil ao evento pretendido pelo empresário.
Lucas Rosa Fagundes, ex-gerente de Projetos da Fundação Municipal de Esportes
- Lucas da Rosa Fagundes é citado no pedido de prisão como um funcionário público em cargo de comissão na prefeitura de Florianópolis. Segundo a investigação, ele teria tido a conta bancária usada por Ed Pereira para fazer operações e dificultar o rastreamento dos recursos obtidos.
- Conforme a Polícia Civil, Lucas também seria coordenador de núcleos de uma associação beneficiada por recursos públicos. Os investigadores citam movimentações financeiras feitas em nome dele que apontariam para irregularidades.
Cleber José Ferreira, contador
- O contador Cleber José Ferreira é citado como um contador que desempenharia “papel de articulador e operador”, sendo uma espécie de braço direito do ex-assessor Renê Raul Justino no desvio de recursos que deveriam ser aplicadas em projetos sociais.
- Segundo os investigadores, Cleber seria o responsável por angariar laranjas para emissão de notas fiscais para prestação de contas de projetos beneficiados por verbas municipais.
Continua depois da publicidade
Veja imagens da primeira fase da Operação Presságio, de janeiro
Contrapontos
O advogado do ex-secretário Ed, Claudio Gastão da Rosa Filho, se manifestou por meio de uma nota oficial. Confira na íntegra:
“Acompanhei meu cliente hoje de manhã no interrogatório na DEIC. Como ainda não tivemos acesso ao inquérito, ele optou por permanecer calado, não para exercer o direito constitucional, mas sim porque pretende prestar todos os esclarecimentos a partir do momento em que ele conhecer o conteúdo de toda a investigação.
Eu terei acesso ao decreto de prisão somente à tarde, de modo que até lá não terei como me manifestar acerca dos fundamentos pelos quais o juiz entendeu agora decretar a prisão de uma pessoa primária, sem antecedentes, que estava colaborando com as investigações e sempre esteve à disposição da Justiça”.
Continua depois da publicidade
Procurada, a defesa de Renê Raul Justino e de Cleber Ferreira, comandada por Francisco Ferreira, diz que “vai se inteirar da fundamentação do decreto de prisão preventiva à tarde e depois vai se manifestar sobre a defesa”. A defesa de Lucas Fagundes não foi encontrada.
Leia também
Segunda fase da Operação Presságio prende ex-secretário de Florianópolis e mais três pessoas
Investigação da Operação Presságio revela desvios em eventos e estacionamento da Fenaostra
OUÇA: Investigados na Operação Presságio negociam supostos desvios de verba para eventos