Foi-se o tempo em que criança gordinha era sinônimo de saúde. Hoje, os quilos a mais preocupam por serem a porta de entrada para uma das principais epidemias do século 21: a obesidade infantil.

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Os mais recentes dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em parceria com o Ministério da Saúde mostram que uma em cada três crianças de cinco a nove anos está acima do peso recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Entre os meninos, 16,6% são obesos, enquanto as meninas somam 11,8%.

– É uma questão de saúde pública que piora a cada ano – afirma César Geremia, endocrinologista pediátrico do Instituto da Criança com Diabetes do Grupo Hospitalar Conceição e coordenador do comitê de endocrinologia da Sociedade de Pediatria do RS.

Desde 1974, o excesso de peso entre as crianças mais do que triplicou – passando de 9,7% para 33,5% atualmente. A obesidade entre os meninos era de apenas 2,9% do total. Nas meninas, o índice também era baixo, de 1,8%.

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– Vivemos em um ambiente mais tecnológico que facilita a saúde em determinados aspectos e dificulta em outros. Todos estão sofrendo as consequências do estilo de vida atual – constata Sueli Rosa Gama, nutricionista do Centro de Saúde Escola Germano Sinval Faria, vinculado à Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca/Fiocruz.

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Especialistas indicam uma união de fatores para a situação ter se agravado. Nas últimas décadas, enquanto os números relativos à desnutrição no Brasil vêm diminuindo, o sobrepeso e a obesidade aparecem como fatores de risco. As famílias melhoram o poder aquisitivo e também o acesso aos alimentos, e essa situação coexiste com a intensa oferta dos produtos processados e industrializados.

– Onde havia privação, agora está ocorrendo um incremento da obesidade. Hoje, arroz e feijão não são mais tão comuns no prato dos brasileiros – diz Geremia.

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Aliado a esse quadro, os pais passam menos tempo em casa em função do trabalho, com poucas oportunidades de preparar refeições. Assim, os alimentos prontos para consumir, e que contam com altas taxas de açúcar, sal e conservantes, ganham espaço. E se as crianças não trazem lanches processados de casa, bolachas recheadas, salgadinhos e frituras são encontrados no cardápio da cantina de muitas escolas. Segundo pesquisa do Centro de Saúde Escola Germano Sinval Faria e da Clínica da Família Victor Valla, desenvolvida desde 2004 no Rio de Janeiro, 30% das crianças bebem refrigerantes e sucos industrializados todos os dias, por exemplo.

Publicidade infantil é outro fator que preocupa

A publicidade infantil também é considerada por especialistas como uma das responsáveis pela epidemia atual. Brinquedos e personagens de desenhos animados estão relacionados a produtos calóricos e açucarados, despertando o desejo dos pequenos. Segundo o presidente da Associação Riograndense de Propaganda (ARP) Fábio Bernardi, o problema não está nos anúncios e, sim, no produto.

– Não é a publicidade que engorda. Se um alimento pode ser vendido, ele pode ser anunciado – argumenta.

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Outro elemento além da alimentação que colabora para aumentar obesidade infantil foi a substituição das brincadeiras na rua e nos pátios por TV, computadores, tablets e smartphones, resultando em menos gasto de energia.

– A explosão da violência urbana ajudou no sedentarismo. Com mais medo de sair de casa e o surgimento de opções tecnológicas, as crianças se mexem pouco – afirma Maria Edna de Melo, endocrinologista do departamento de obesidade infantil da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso).

Entre os condicionantes principais, estão os hábitos familiares. Pais, mães e responsáveis exercem influência direta sobre a alimentação das crianças e podem ajudar ou atrapalhar no ganho de peso do filho. Para Zuleika Halpern, coordenadora do departamento de obesidade da Sociedade Brasileira de Diabetes e membro da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), faltam campanhas informativas do governo, capacitação de professores, palestras nas escolas e restrições mais duras para a publicidade infantil. O engajamento de muitos pais deixa a desejar, mas não existe um só culpado.

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– A família tem uma parcela de culpa, mas está inserida em um contexto – diz.