O engenheiro mecânico José Cláudio, de 52 anos, levantou cedo e foi para o trabalho, como fazia há mais de oito anos em uma metalúrgica de Joinville. Horas depois, recebeu a notícia de que estava sendo demitido.

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– Fiquei muito abalado. Não esperava de forma alguma por aquilo, pois meu resultado era muito bom. Foi uma experiência traumática – afirma.

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Como o profissional ocupava cargo de liderança, já havia passado por várias avaliações – de perfil psicológico e avaliação 360 graus a feedbacks. Mas não havia identificado a raiz de um comportamento que viria a influenciar a demissão: o excesso de transparência. As pessoas ficavam magoadas pela falta de tato de José Cláudio.

O executivo diz que vinha de duas experiências em empresas de disciplina rígida em São Paulo que reforçaram seu comportamento. Ao ingressar em uma organização de cultura diferente, não percebeu que aquele modelo não era bem aceito. Para ele, tudo parecia normal. Faltava autoconhecimento.

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José Cláudio só descobriu o que estava acontecendo quando frequentou as sessões de outplacement – benefício que a metalúrgica na qual trabalhava contratou para dar apoio a ele após o desligamento e suporte na recolocação. Não demorou.

Profissional com bom trânsito no mercado, uma semana depois estava empregado novamente, mas fez questão de continuar as sessões por três meses, com foco no autoconhecimento. Ele conta que passou a dizer as mesmas coisas, só que de um jeito diferente, que não magoava mais as pessoas.

– A visão que os outros têm de você é completamente diferente da que você tem de si mesmo. Então, o jeito mais fácil de saber é perguntar para os interlocutores, ouvir o que as pessoas dizem. É preciso abertura e intimidade, e a informalidade vale mais do que a formalidade nesta hora – constata José Cláudio.

O executivo deu a volta por cima e saiu fortalecido da experiência. É exatamente isto o que as empresas esperam quando contratam o benefício de outplacement para gestores que tiveram uma contribuição relevante e precisam ser desligados.

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A iniciativa parte, geralmente, de grandes empresas, mas a consultora Lise Chaves observa que também médias contratam o serviço. Nos últimos dois anos, ela tem verificado o crescimento da procura por parte dos próprios profissionais, que reconhecem no outplacement um investimento para o futuro da carreira.

As causas

Bons profissionais que participam de programas de outplacement, seja por meio da empresa ou diretamente, costumam ser demitidos após vários anos de casa. Eles perderam o emprego, principalmente, por questões comportamentais e não técnicas, explica a consultora da Apex Executive Search, Nilce Campos. No entanto, outros fatores também comprometem a permanência no emprego.

A consultora Lise Chaves destaca o movimento periódico de oxigenação das empresas: elas desligam profissionais mais antigos na companhia para trazer novos colaboradores com “um outro jeito de fazer”. Em momentos de crise, como o atual, a pressão por reduzir custos também resulta em demissões.

– No Brasil, a carga tributária atrelada ao salário dobra o que a companhia precisa recolher. Não é o salário em si que é alto. O composto salarial sai muito caro. Nesses casos, a empresa busca alguém no mercado ou promove um funcionário com bom desempenho e cuja faixa salarial é mais administrável – explica Lise.

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A demissão pode refletir, ainda, um erro cometido pela própria organização. Nilce diz que é comum promover profissionais sem realizar uma avaliação primeiro. Só que o funcionário talvez não esteja pronto para a nova função. Depois da promoção, quando as coisas não estão indo bem, é que as empresas correm para fazer a avaliação.

Atitudes nocivas

A dor de ser demitido figura entre as mais difíceis de enfrentar, perdendo apenas para a morte de um ente querido. Supera, até, a dor da separação, diz a consultora da Apex Executive Search, Nilce Campos. Em geral, o profissional não percebe o que está acontecendo. A acomodação é um bom exemplo. Deixar de buscar novos conhecimentos, de manter-se atualizado e de ampliar o networking compromete a carreira de forma gradativa e silenciosa.

– Um funcionário pode caminhar 100% para a demissão sem perceber – afirma Nilce.

Outra característica nociva à carreira é a resistência ao feedback. Há pessoas que têm dificuldade de ouvir críticas, de aceitar que outro pontue falhas e de saber o que precisa melhorar.

– Quando bem dado, o feedback contribui para o desenvolvimento profissional. Quem o recebe não deve levar a crítica para o lado pessoal. Naquele momento, pode doer um pouco. Contudo, depois, se analisar a fundo, a pessoa vai perceber que é para o bem – explica.

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Para não cair em armadilhas, Nilce recomenda investir no autoconhecimento durante a carreira. O apoio de coach, por exemplo, pode ajudar a descobrir quais aspectos precisam ser desenvolvidos.

O dia seguinte ao desligamento

O impacto da demissão costuma deixar o profissional desorientado. O apoio da família, nesta hora, é fundamental e a própria pessoa deve se ajudar. É preciso seguir em frente, livrar-se o mais rápido possível das mágoas, focar no que aprendeu durante os anos todos de trabalho e capitalizar o aprendizado na busca de novas oportunidades. Para superar as mágoas, uma medida importante é se desligar emocionalmente da empresa, rompendo o contato por completo.

– Tem gente que fica repassando tudo o que acontece dentro da empresa para quem foi demitido. Eu oriento a não ficar ouvindo os comentários dos que ficaram, a não dar importância para as fofocas. Quanto menos ouvir, melhor – afirma Nilce.

Se a empresa ofereceu o benefício do outplacement, o profissional não deve desperdiçar a chance.

– Na demissão, o profissional sai com mágoa e sem entender o que aconteceu. Sai com uma interrogação. Durante o outplacement, há o momento de autodescoberta. Ele chega à resposta: “Se eu agisse assim antes, talvez não tivesse sido desligado”.

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A consultora lembra que cada ser é único e apresenta competências a desenvolver, competências com bom nível de desenvolvimento e algumas a reforçar – pois, apesar de tê-las, podem estar adormecidas, e tudo isto vai ser trabalhado no outplacement.

No início dos trabalhos, a consultoria solicita ao profissional que visite sites de empresas e consiga perceber nas entrelinhas onde gostaria de trabalhar e se essa empresa tem os valores que possam contribuir para o crescimento dele como profissional. Segundo Nilce, alguns realizam um sonho profissional que, na maioria das vezes, não tinha muito a ver com o que faziam anteriormente.

– A demissão não é fácil, tem um processo de luto que precisa elaborar. O profissional tem que entender que o desligamento é algo natural, faz parte da vida, e aprender a capitalizar a riqueza profissional que traz. Quando a pessoa é desligada de uma empresa grande e vai para uma empresa média, por exemplo, vai contribuir bastante e será reconhecida – complementa Lise Chaves.