Tema das conversas de bar até o início dos anos 90 e motivo de malabarismos das famílias para fazer o orçamento durar até o final do mês, a inflação voltou a tirar o sono dos brasileiros. É o preço do tomate, do feijão e da farinha que não param de subir. A conta dos restaurantes, a tabela da cabeleireira e os parcos minutos que o eletricista gasta para trocar a resistência do chuveiro ficam cada vez mais caros – e a sensação é que o salário não consegue acompanhar.
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Nas últimas duas semanas, dois índices mostraram como viver ficou mais caro em 2013. O Índice de Preços ao Consumidor de Florianópolis, levantado pelo Centro de Ciências da Administração e Socioeconômicas (Esag) da Udesc, indicou um aumento de 6,09% no custo de vida para quem morava no município, ano passado. Quando comparado apenas o item alimentação, o crescimento chegou a 6,68% a mais do que no ano anterior.
O IPCA, calculado pelo IBGE e usado como referência pelo governo para definir políticas econômicas, ficou acima do centro da meta pelo quarto ano seguido.
Aumento de preços faz família encolher orçamento
Na opinião de alguns brasileiros, o ano foi o mais apertado dos últimos anos em termos de orçamento. Tiago Alves de Medeiros, morador de Florianópolis, deixou de cumprir algumas das metas que sempre define com a esposa, Noemi da Silva, quando o ano começa. O porquê é explicado em resposta curta: as coisas ficaram mais caras em 2013. E não foi só ele que achou isso, garante. Seus colegas de trabalho também reclamaram das dificuldades financeiras no ano que passou.
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Com dois filhos em casa, um com nove e outro com um ano e oito meses, as despesas são ainda maiores. Os R$ 2.300 que o casal ganha por mês são gastos, em maior parte, para a alimentação da família. Uma das alternativas adotada por Medeiros para que as contas não ficassem maiores do que o previsto foi programar um dia no mês para o “rancho”, as compras no supermercado.
– A gente comprava os produtos várias vezes ao mês e, quando víamos, estávamos gastando quase R$ 2 mil com alimentação. Agora vamos ao supermercado uma vez a cada mês e os custos reduziram muito.
O primeiro item que Medeiros lembra ter pesado no bolso da família foi o leite – considerado pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócioeconômicos (Dieese) como o quinto produto com maior variação de preço, em Florianópolis. Para driblar o aumento de 21,78% da bebida em 2013, assim como os outros aumentos, o motoboy garante que não deixou de comprar os produtos, mas trabalhar mais para pagá-los.
Mais ricos sofreram mais com alta de preços
Ainda que esteja em nível indesejado, a inflação não é lá o bicho de sete cabeças que a população tem descrito, dizem especialistas. Se alimentos e serviços realmente subiram demais, os gastos com serviços públicos caíram ou tiveram correções mais modestas _ a conta de luz teve uma redução de 8% em Florianópolis no ano passado, principalmente devido à desoneração tarifária da Celesc, maior do que o aumento praticado ao longo do ano.
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– As pessoas não conseguem acompanhar todos seus gastos, então prestam atenção naqueles que mais sobem – explica Rafael Costa Lima, coordenador do índice de inflação IPC, da Universidade de São Paulo (USP).
Essa percepção seletiva pode trazer a impressão de que os indicadores oficiais não conversam com a realidade, mas essa não é uma verdade absoluta, diz o especialista. Lima lembra que os indicadores levam em conta o gasto médio das famílias brasileiras com cada tipo de despesa, mas (como toda a média) não mostram o impacto nos extremos:
– Quem tem mais dinheiro sofreu mais com a inflação neste ano, pois subiu muito o preço de importados, os planos de saúde e o lazer. Já os consumidores de baixa renda, que têm gastos mais básicos, não sofreram tanto: o transporte subiu pouco e a tarifa de energia elétrica até caiu.
O tema inflação é tão complexo que mesmo especialistas não chegam a um consenso quanto as principais vítimas. Professor de finanças da FGV São Paulo, Samy Dana avalia que os pobres são os que mais sofrem, pois quando as despesas básicas com alimentação e moradia sobem muito, não têm de onde cortar.
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O único consenso é que a inflação real não está em IPCA, IGP-M ou qualquer outra combinação de letras que aparece nos jornais: está no hábito de cada família. Por isso, é fundamental organizar um orçamento familiar, saber em que mais se gasta e monitorar.
– As pessoas precisam saber qual a sua inflação pessoal. A partir daí, poderão organizar um orçamento e saber onde podem reduzir gastos – explica Samy.