De cada cem casais que tentam engravidar, entre 10 a 15 não conseguem realizar o sonho de ter filhos de modo natural. Vários são os problemas de infertilidade, mas a boa notícia é que para muitos deles há tratamento. Para os casos mais difíceis, quando só a medicação ou a cirurgia (ou ambos) não bastam, há, ainda, a possibilidade da reprodução assistida. Ou seja: através da ajuda da ciência, os médicos auxiliam na fertilização, colocando óvulos e espermatozóides em contato.

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O resultado deste avanço tecnológico? É cada vez maior o número de mamães e papais realizados, cuidando de seus filhotes. Se eles foram concebidos da maneira tradicional ou se receberam uma ajudinha extra da ciência, para os pais isso pouco importa. O que interessa é que estão aí, crescendo saudáveis e felizes, dando sentido à palavra família.

Nas páginas seguintes, histórias de mulheres que, após a desilusão de não conseguirem engravidar naturalmente, fizeram da ciência uma aliada. E que, orgulhosas, festejam com suas crianças mais um Dia das Mães.

Corrida contra o relógio biológico

As pessoas namoram, casam e têm filhos. É o caminho natural, mas para muitos casais a lógica não funciona, e o tão sonhado bebê pode não chegar, causando muita frustração. De modo geral, considera-se o casal com problema de infertilidade quando não consegue engravidar após um ano de tentativas regulares. Aí, é a hora de procurar ajuda médica para tentar reverter esta situação. Sim, tentar. Porque não há uma garantia de que a fertilização dará certo. Dados da Rede Latinoamericana de Reprodução Assistida mostram que a taxa de gravidez com a fertilização in- vitro é de 35% a 40% dos casos, se a mãe for jovem. Perto dos 40 anos ou mais, a chance uma gravidez baixa para 5% a 10%.

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Quanto mais cedo o problema é identificado e tratado, maior é a chance de sucesso.

– É preciso lembrar, também, que o diagnóstico de infertilidade não significa necessariamente a impossibilidade de ter filhos, e sim um desafio a ser vencido com a ajuda da ciência – explica a médica Kazue Harada Ribeiro, especialista em Reprodução Humana.

É cada vez maior o número de mulheres que adia a maternidade, em função da necessidade de estabilizar-se profissional, financeira e até emocionalmente.

– O problema é que o ovário possui um relógio biológico, sobre o qual não temos domínio, de forma que a partir dos 35 anos há uma redução significativa do número e da qualidade dos óvulos. Depois dos 45 anos, eles praticamente desaparecem.

Kazue é pioneira na introdução das novas técnicas de fertilização assistida e na geração dos primeiros bebês de proveta de Santa Catarina. Na sua clínica – a Clinifert, em Florianópolis, – fotos de centenas de bebês enfeitam as paredes.

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A especialista assegura que nem todos os tratamentos para infertilidade exigem procedimentos de alta tecnologia. Muitos casais conseguem engravidar com medidas mais simples, como medicamentos para estimular a ovulação ou antibióticos, para tratamento de determinadas infecções.

– Para começar, é importante uma investigação detalhada através de diversos exames, para que se possa descobrir as causas da infertilidade e prescrever o tratamento adequado – explica a médica.

Família não tem preço

A professora Claudinara, 36 anos, e o funcionário público Anselmo Malagoli, 42 anos, agora têm a família com que sempre sonharam. São pais de Francisco e Clara. Ambos nasceram após fertilizações in-vitro. É no quartinho de Francisco, todo colorido em tons de verde, com brinquedos para tudo quanto é lado, que eles contam sua história.

Namoraram durante cinco anos e, há 10, estão casados. Em 2007, após receberem o diagnóstico da infertilidade, decidiram tentar a inseminação in-vitro. Claudinara já tinha 34 anos e, quanto mais o tempo passasse, mais difícil seria engravidar. Na primeira tentativa o médico implantou quatro embriões. Ela engravidou de gêmeos. Os meninos nasceram com 31 semanas de gravidez, e o irmãozinho de Francisco, Santiago, viveu apenas 10 horas. Depois de 20 dias na UTI neonatal, o casal pôde levar o outro bebê para casa.

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– Queríamos mais uma criança. Decidimos tentar novamente – explica Claudinara.

De novo acertaram na mosca. Na primeira tentativa ficou grávida de Clarinha. Foi uma gestação normal, de 39 semanas, sem qualquer sobressalto ou anormalidade.

A família mora em Palhoça. Claudinara desistiu de dar aulas, pelo menos por enquanto, para cuidar das crianças.

– Estamos realizados. E em nenhum momento pensamos no quanto gastamos para ter nosso filhos. Até porque filho não tem preço. Eles valem mais do que tudo na vida – diz o faceiro papai.

Alegria multiplicada por três

A especialista em gestão da qualidade Raquel Gominho, 38 anos, e o advogado Eduardo de Carvalho, estavam casados há cinco anos quando decidiram ter um filho. Ela tentou engravidar, sem sucesso. Veio a preocupação: será que não realizarei o sonho de ser mãe?

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Depois de mais de dois anos de tentativas infrutíferas, o casal optou pela reprodução assistida. Buscaram um especialista, cheios de esperança.

– Na primeira vez já deu certo demais. A árvore genealógica da família ganhou três novos frutos de uma única vez: Beatrice, Dante e Sofia – conta Raquel.

A gestação, mesmo considerada de alto risco, foi tranquila. As crianças nasceram com 35 semanas de gestação, no dia 2 de janeiro de 2003, na Maternidade Carmela Dutra, em Florianópolis,. Era a única (na época) a dispor de UTI neonatal com capacidade para abrigar trigêmeos.

Das mudanças ocorridas no corpo com a tripla gravidez Raquel não reclama.

– É claro que a minha barriga ficou detonada pelo excesso de pele, pois engordei 23 quilos durante a gestação. As estrias ficaram, apesar dos cuidados, mas são as cicatrizes de quatro vidas, a minha e a deles, e não me arrependo.

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O apartamento do casal logo sentiu os efeitos da explosão demográfica. Além deles, passou a ser ocupado também pelos três bebês, empregada, babá e, à noite, por uma enfermeira.

– Eu amamentava das 6h até às 20h, de três em três horas. Oferecia o peito, e outra pessoa dava a mamadeira como complemento e os colocava para arrotar – relata.

O quarto do apartamento transformou-se num berçário, a sala virou playground, a geladeira tinha uma prateleira reservada apenas para mamadeiras e o varal parecia uma eterna festa junina, cheio de roupinhas coloridas (verde para Bea, azul para o Dante e rosa para Sofia). Detalhe: as cores das roupas correspondiam às cores das planilhas de cada um para registro das trocas de fraldas, banhos, mamadas. Parecia uma fábrica de crianças.

A colaboração irrestrita de Eduardo nos cuidados e na educação dos filhos foi imprescindível para Raquel.

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-Tenho um marido que é um “pãe”. Ele realmente participa de tudo. E filho é uma opção pessoal. Se escolhemos tê-los, assumimos automaticamente alguns limites para as nossas vidas. Temos de dar conta do recado: otimizar o tempo, não sofrer por antecipação, administrar os conflitos e curtir cada momento.

A recompensa, diz a mãe, é este afeto multiplicado, diariamente, e a realização de vê-los crescer saudáveis e equilibrados.

Duas belas surpresas

Desde adolescente a jornalista Tatiana Wittmann, 34 anos, tinha o sonho de ser mãe, mas queria que a gravidez acontecesse depois de formada na faculdade e de estar firme na profissão. Casou-se em maio de 2003 com o ator Gilson Guzzo Cardoso, 41 anos, e, em setembro, o casal já pensava em aumentar a família. O tempo foi passando e a gravidez não veio. Entre 2005 e 2007, Tatiana e Gil fizeram uma série de exames, tratamentos e até uma cirurgia. Mesmo assim, continuavam inférteis. Então, em abril de 2008, começaram o tratamento para uma possível fertilização in-vitro.

– Decidir por um tratamento como este é uma montanha russa emocional. Por um lado, há a vontade enorme de ter um filho. Por outro, o medo de não dar certo. Tem o dinheiro investido, e a chance de uma gestação gemelar (dois, três e até quatro filhos gêmeos) – lembra Tatiana.

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O casal passou por uma inseminação artificial, mesmo sabendo que, no caso deles, as chances de engravidar seriam de apenas 15%. O procedimento foi feito no dia 22 de abril de 2008, data que eles não esquecem.

– Para a nossa felicidade, no dia 6 de maio confirmamos a gravidez, que trouxe para a nossa vida, no dia 20 de janeiro de 2009, a linda Beatriz – conta a orgulhosa mamãe.

Mas a história não acabou por aí.

– Como esperávamos, amamos a experiência de ser pais e já tínhamos decidido dar um irmãozinho ou irmãzinha para a Beatriz. A ideia era tentar uma inseminação artificial novamente, quando a Beatriz tivesse dois anos. E, caso não desse certo, iríamos adotar uma criança.

O destino foi mais rápido do que Tatiana e Gil. Em fevereiro deste ano, descobriram-se grávidos de novo. Desta vez, sem planejamento, muito menos tratamento.

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– Foi um susto, difícil de acreditar que tínhamos engravidado naturalmente depois de quatro anos e meio tentando e tendo que passar por tratamentos. No mês passado recebemos a notícia de que um meninão vem chegando. O Antônio deve nascer no começo de outubro.

Lei existe, falta colocar em prática

Desde a divulgação, em 1978, da notícia de que o obstetra Patrick Steptoc e o biólogo Robert Edwards haviam trazido ao mundo Louise Brown, o primeiro bebê de proveta, resultante da técnica de fecundação in-vitro, cerca de um milhão e meio de bebês nasceram, em todo o mundo, fruto de casais estéreis.

Como a maioria dos tratamentos para engravidar envolve estimulação ovariana, a probabilidade de nascimentos de múltiplos (dois, três, quatro e até mais bebês) é maior do que no caso de uma gravidez natural. Mesmo assim, segundo as estatísticas, entre 60% e 70% das vezes nasce apenas um filho após o tratamento. Em cerca de 25% dos casos, nascem gêmeos e, em 5% das vezes, a gravidez é de três, quatro ou mais bebês simultâneos.

O médico Ricardo Nascimento, especialista em reprodução assistida, diz que o ideal seria transferir apenas um embrião para o útero em cada tentativa, para evitar gestações múltiplas, que sempre têm mais riscos para a mãe e para os bebês. E isso até acontece em países onde o governo ou os convênios de saúde pagam pela fertilização in-vitro.

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– Aqui no Brasil, quem arca com todas as despesas é o casal, sem sequer ter a garantia de que conseguirão a tão sonhada gravidez. Por isso, muitas vezes opta-se por transferir mais embriões e, assim, aumentar a chance de sucesso do procedimento.

Cada vez que o casal faz uma tentativa de engravidar, investe perto de de R$ 15 mil (entre medicamentos e a reprodução assistida). Muitos conseguem logo. Outros, precisam fazer mais tentativas. E há, também, aqueles que são orientados a mudar de planos, porque nunca vão conseguir aumentar a família por meio das técnicas da medicina reprodutiva.

Ricardo Nascimento atua na área da reprodução humana desde que fez a residência médica, em 1984. Hoje, é diretor da Clínica Ilha Fértil, em Florianópolis, e, ainda, coordena o Ambulatório de Infertilidade Conjugal da Maternidade Carmela Dutra, em Florianópolis, onde são executados apenas os procedimentos de baixa complexidade (tratamento clínico, com medicação ou cirúrgico) para combater a infertilidade.

A fertilização in-vitro, pelo SUS, embora esteja prevista em lei desde 2008, ainda não foi implantada no Brasil. Poucas instituições oferecem este serviço gratuitamente, como o Hospital de Clínicas de São Paulo, mas a fila de espera por atendimento é quilométrica.

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Um susto maravilhoso

O quarto das meninas até parece berçário de jardim de infância. Ao lado das caminhas, quadros pendurados na parede indicam quem dorme nelas. Milena, Marina, Isabela e Maria Eduarda completaram um ano em abril. E, como não poderia deixar de ser, desde que nasceram enchem de alegria (e de bagunça também!) a casa da arquiteta Ana Luiza e do administrador Ado Evangelista, de Florianópolis.

Engravidar de quadrigêmeas foi uma surpresa para o casal. Quando fizeram a inseminação artificial, o médico implantou três embriões no útero de Ana.

– Poderia nascer de uma a três crianças, mas um dos óvulos se dividiu e vieram as quatro. Quando fiquei sabendo, durante um ultrassom na oitava semana de gestação, simplesmente perdi o chão – lembra a mãe.

Nem tudo foi alegria nos primeiros tempos. Uma gravidez de quádruplos envolve muitos riscos. Ana recebeu inclusive a sugestão de fazer uma redução (diminuir o número de embriões fecundados). Mas o casal decidiu seguir em frente. A gravidez foi normal – se é possível ser normal com quatro bebês na barriga – e as meninas nasceram de sete meses. Todas ficaram na UTI neonatal por alguns dias. Assim, Ana teve tempo para se recuperar do parto e dormir um pouco mais, até que as crianças recebessem alta.

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– Todos os dias tirava leite do peito para amamentá-las, e passava as tardes na maternidade.

Quando a família toda foi para casa, Ana e Ado montaram um pequeno time para ajudar: as duas avós se revezavam, dia e noite, além da empregada Magali. Foi assim o primeiro ano inteiro. Agora, diz a mãe, a situação está mais “controlada”.

Cada vez que os pais saem com as crianças na rua, são parados por pessoas que querem conhecer as quadrigêmeas e fazer fotos com elas. A família virou celebridade na Capital.