Há um ditado empresarial que ganha força em tempos de receitas enxutas e margens apertadas: os custos são como as unhas. É preciso cortá-los sempre. Com o mercado consumidor arredio e endividamento crescente, manter as despesas em dia é fundamental para a saúde financeira dos negócios.

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Um levantamento recente do SPC Brasil mostra que o número de empresas inadimplentes aumentou 5,15% em março deste ano, em comparação com o mesmo período de 2016. Houve também aumento de 3,07% na quantidade de dívidas em atraso em nome de pessoas jurídicas em relação com março de 2016. O número de empresas devedoras por setor indica que o segmento de serviços (que engloba bancos e instituições financeiras) teve a maior alta de empresas negativadas em janeiro de 2017 ante 2016 (8,00%), seguido pela indústria (4,72%) e comércio (4,11%).

O segundo ponto observado pelo economista é o custo. Investir na utilização de menos água e energia, em matéria-prima reutilizada, e na redução da distância do transporte de mercadorias significa uma redução significativa nos gastos da empresa. E a razão mais importante para que os empreendedores se sintam impulsionados a abrir um negócio sustentável, sem dúvida, é o investimento a curto e longo prazo no bem-estar global.

A boa notícia é que o crescimento do número de pessoas jurídicas negativadas no país perdeu força durante 2016 e segue estabilizado em 2017 – em março do ano passado, a variação anual havia sido de 11,08%. Com esse cenário, muitas empresas têm recorrido a estratégias de redução de despesas.

É consenso entre os especialistas que a política de redução de custos deve ser uma constante na vida das empresas, não apenas em momentos de estagnação econômica. A gestão rigorosa dos gastos contribui para eficiência, competitividade e sustentabilidade, principalmente, no caso dos pequenos negócios.

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O primeiro foco de atenção é eliminar gastos não-essenciais, como contas de água, energia, papel, e telefonia. Uma avaliação rigorosa do orçamento da companhia também faz diferença no fechamento das contas.

A professora da ESPM-Sul Frederike Mette destaca que tempos de crise e estagnação são um teste para os negócios. Para a especialista, quem tem um produto ou uma marca bem posicionados no mercado tem mais chances de sobreviver. A estratégia de enxugamento dos gastos é importante não só para garantir o saldo positivo em caixa, mas também a perpetuidade da empresa.

É comum que muitos empresários atrelem crescimento a aumento de despesas. Para a coordenadora da Endeavor em Santa Catarina, Mariana Foresti, esse entendimento é equivocado. A tendência é que as marcas sejam capazes de prosperar por meio de soluções inovadoras sem elevar os custos.

– As empresas que seguem esse formato sempre existiram e são chamadas scaleups. Elas buscam mais eficiência das operações, seja por meio do tipo de produto oferecido, processos bem definidos ou uso de tecnologias que permitam automação, ganho de produtividade e redução de custos. As companhias que não se adaptarem ficarão para trás, com uma estrutura muito pesada para competir com as inovadoras – avalia a coordenadora.

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Novas tecnologias para aumentar produtividade

O investimento em novas tecnologias para aumentar a produtividade também é um caminho apontado pela coordenadora regional do Sebrae/SC, Soraya Tonelli. Ela defende ainda a aplicação de medidas para o uso racional dos recursos, principalmente água e energia elétrica. Para isso, já existem softwares capazes de controlar despesas e apontar em que pontos estão as principais ineficiências.

Entre as ações mais simples e baratas, estão a substituição de gastos com viagens por reuniões por videoconferência, além da conscientização dos funcionários para redução no desperdício de materiais de escritório.

Outra forma de alocar recursos de forma mais eficiente é medir o retorno sobre investimento (ROI) de determinados esforços, que envolve o acompanhamento de métricas que irão medir os resultados e ganhos sobre o valor dos recursos. Como exemplo, Mariana, da Endeavor, cita que uma empresa de vendas online pode usar uma plataforma para fazer testes com duas diferentes campanhas e medir qual das iniciativas gera maior retorno.

Aposta na gestão orçamentária garante exugamento de gastos

O administrador Rafael Biasotto começou um negócio com R$ 18 mil em um espaço de 30 metros quadrados. Fabricava luminárias e porta-retratos com polipropileno, um tipo de plástico, e logo depois começou a mexer com tecido, papel e metal. Assim surgiam os primeiros objetos fabricados pela Uatt?.

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A proposta da marca é fugir do rótulo de uma loja tradicional de presentes. O diferencial da empresa também está no fato de que as artes nos produtos são desenvolvidas pela própria equipe, que já engloba cerca de 150 funcionários.

A sede da Uatt? fica em São José, mas as bolsas, canecas, fones de ouvido, squeezes, almofadas e outros acessórios coloridos já estão disponíveis em mais de 3,5 mil multimarcas e em uma loja virtual.

Para garantir um crescimento estimado em 15% para esse ano, uma das apostas foi a adoção de medidas para reduzir os custos e, dessa forma, aumentar o EBITDA, sigla para os lucros antes de juros, impostos, depreciação e amortização. Em linhas gerais, ele corresponde à geração operacional de caixa da empresa, ou seja, o quanto ela gera de recursos apenas em suas atividades operacionais, sem levar em consideração os efeitos financeiros e de impostos.

Como estratégia de redução de despesas, a Uatt? usou um método de gestão orçamentária de controle matricial, implantado pelos próprios funcionários que já possuem expertise no assunto. Com a ferramenta, a empresa garante ter reduzido as despesas fixas de forma sustentável, eliminando os vícios dos processos tradicionais.

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– A redução dos custos com certeza é uma medida importante e também algo que deve ser implantado como um elemento da cultura nas organizações. O método da gestão orçamentária deve estar presente não como mais uma atividade a ser feita e sim como algo que permeia o dia a dia da organização – afirma Tânia Nogueira, diretora de finanças e gestão da Uatt?.

A empresa não revela o quanto conseguiu economizar ao apostar no método de gestão orçamentária. Porém, afirma que as maiores despesas fixas reduzidas estão relacionadas a transportes e fornecedores. De acordo com a diretora financeira, a busca pelo enxugamento dos custos não tem como objetivo apenas tornar a empresa mais produtiva e rentável. A sustentabilidade também é uma das preocupações da marca e está entre principais metas da Uatt? para os próximos anos.

Redução de 300% nos custoscom a importação direta

A química Betina Giehl Zanetti Ramos e o marido, o administrador Ricardo Henrique Ramos, também apostam na eficiência das despesas para não perder o ritmo de crescimento. Sócios da Nanovetores, a segunda empresa que mais cresceu no Brasil em 2015 na categoria pequenas e médias empresas de acordo com o levantamento da revista Exame, o casal também conta com a vantagem de vender um produto muito específico e com pouca concorrência no mercado: cápsulas de princípios ativos, usadas principalmente nas indústrias cosmética e têxtil.

A maneira encontrada pela Nanovetores para não perder de vista a estimativa de 40% de crescimento neste ano foi rever os fornecedores, materiais e metodologias. Ricardo explica que essa avaliação do modelo produtivo permitiu uma série de economias importantes, que se traduziram em mais viabilidade para o negócio.

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Uma das estratégias aplicadas pelo casal foi dar preferência aos fornecedores que não aumentaram o preço dos insumos. Apenas com essa iniciativa foi possível reduzir em 300% o custo com produtos de importação direta. No total, o empresário afirma que a Nanovetores reduziu seus custos em 10%, número significativo para uma conjuntura de retração econômica.

O que é o Orçamento Base Zero

O Orçamento Base Zero (ou OBZ) é muito usado em grandes empresas, mas a lógica da metodologia também pode ser aplicada à realidade de pequenos e médios negócios. Ele propõe uma análise minuciosa das prioridades estratégicas da companhia. Além disso, a premissa é que essa análise seja feita de baixo para cima, ou seja, inicia-se pela missão e valores da empresa a partir da definição de um limiar, custo mínimo que uma empresa precisa para operar, e também de uma votação participativa.A metodologia foi desenvolvida em meados dos anos 70 e apresentada pelo professor americano Peter Pyhrr em seu livro Zero-Base Budgeting: a Practical Management Tool for Evaluating Expenses. A ferramenta já foi usada inclusive pelo governo dos EUA, em 1975, em um projeto de redução de custos do Pentágono.