O mercado de trabalho em Santa Catarina passa por um momento de mudança, busca se tornar mais inclusivo, diverso e experiente, conforme especialistas. Pessoas com mais de 50 anos e idosos compõem um grupo que perdeu oportunidades por conta do preconceito com a idade. No entanto, empresas estão voltando a reconhecer o valor desses profissionais com projetos para incentivar a contratação deles, que muitas vezes buscam uma forma de se recolocar no mercado. Quem deixa a aposentadoria de lado diz que entre as motivações para seguir atuando estão o complemento na renda e a chance de manter a mente e o corpo ativos. 

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O Estado contava com mais de 2 milhões de pessoas a partir de 50 anos em 2022, cerca de 27% da população, conforme as estatísticas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e a população estimada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Já o grupo de pessoas com 60 anos ou mais representa 15% dos catarinenses. Do total, cerca de 19,5% da faixa etária da “terceira idade” estava na força de trabalho do Estado, conforme o IBGE em 2022. O percentual inclui quem está procurando uma oportunidade e quem já está empregado. 

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Lúcia Telles, 73 anos, faz parte do grupo que se aposentou e continua na ativa. Antes de se tornar operadora de caixa de uma rede de supermercados em Florianópolis, ela trabalhava como vendedora de prêmios de aposta na frente da unidade varejista. Quando a empresa iniciou uma nova edição do programa para contratar pessoas com mais de 50 anos, ela foi convidada a participar. 

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– Perguntei para o gerente: “Você acha que eu dou conta de ser operadora de caixa?”. E ele disse: “Sim!”. Fiquei pensando, falei com a família e eles disseram que seria bom. E estou aqui, trabalhando feliz. Pode passar no meu caixa que estou assoviando! Tenho saúde, não tem por que ficar só dentro de casa. Não, vamos trabalhar – conta Lúcia. 

Antes de se tornar operadora de caixa, ela trabalhava como vendedora de prêmios de aposta na frente do supermercado que atua hoje em dia

Pela mesma iniciativa, Altemiro Guevedo, 70 anos, também conquistou uma vaga como operador de caixa. Natural do Sul do Estado, ele começou a procurar empregos quando chegou a Florianópolis, mas afirma que faltavam oportunidades: 

– Procurei em umas quantas áreas, só que não aparecia. Até que pintou aqui! – relata. 

A valorização dos profissionais mais velhos está relacionada à experiência e maturidade de trabalho desse público, diz Rafaella Bargellini, do Grupo Suporte de Recursos Humanos. A especialista avalia que candidatos com mais de 50 anos oferecem o que as empresas buscam em termos de engajamento no ambiente de atuação e dedicação. 

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– Vejo essa tendência no mercado, principalmente em empresas que não estão tão engessadas nos padrões antigos e focam nas relações humanizadas. Hoje valorizamos mais os pontos subjetivos do que os padrões impostos, como é o caso da idade. Vemos muito mais valor no senso de responsabilidade daquela pessoa, vontade de vestir a camisa da empresa, disposição para o trabalho, gentileza e educação – pondera a especialista. 

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Rafaella ainda observa que a evolução na percepção sobre a contração de colaboradores pode acontecer de mais de uma forma nas empresas. Uma opção é adotar um sistema semelhante ao de cotas de universidade, com um percentual reservado para um público específico, ou por projetos de seleção focados em um público-alvo. 

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– Temos um grande cliente da indústria farmacêutica que possui um programa de contratação voltado para pessoas com mais de 50 anos, onde uma porcentagem das vagas é fechada exclusivamente com essas pessoas. Isso é um diferencial positivo, mas com todos os clientes contratamos pessoas dessa faixa etária, porque costumam ter bastante sucesso – pontua.

Aos 70 anos, Altemiro Guevedo atua como operador de caixa em um supermercado de Florianópolis 

Valorização da experiência e resposta ao preconceito

Valorizar a experiência e a maturidade desse grupo é a ideia do Grupo Pereira, dono do Fort Atacadista, que criou um programa em que oferece 2,5 mil vagas em cargos diversos para pessoas que têm mais de 50 anos. Assim, empregou Lúcia e Altemiro. Além de ser uma oportunidade estratégica, a iniciativa fortalece a cultura de garantir uma empresa mais inclusiva, segundo Paulo Silva, diretor de Gente e Gestão da empresa. 

– Esse processo de inclusão torna a empresa mais diversa e consciente de seu papel. Para nós, é uma mão de obra que entrega, é produtiva e engajada, capaz de contribuir para a inovação nos negócios – observa o diretor. 

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Em iniciativas mais moderadas, empresas têm estendido a referência de idade máxima na hora de contratar profissionais para novas vagas, de acordo com Beatriz Maciel, consultora de Recursos Humanos. 

– Notamos uma mudança nas contratações. As empresas têm encaminhado perfil de abertura de vaga mais elástica, incluindo profissionais com até 55 anos. Entendemos que ainda não é perfeita, mas está mais inclusiva – diz a consultora. 

Esse movimento acontece em resposta ao preconceito que fechou as portas de empresas para pessoas mais velhas por anos. O etarismo, discriminação por conta da idade, é uma realidade que ainda influencia parte do mercado de trabalho e desvaloriza os mais experientes. 

Segundo Beatriz, a maioria das oportunidades abertas por empresas em Santa Catarina até pouco tempo atrás eram para profissionais com até 40 anos. A escassez de vagas para pessoas mais velhas estava e ainda é ligada a padrões antigos de uma sociedade que já mudou, conforme Rafaella. 

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Por isso, pessoas com mais de 50 anos encontram dificuldade para se recolocar no mercado por qualquer motivação que tenham. E isso é um problema que ultrapassa o Estado, e é visto como uma questão de âmbito nacional que precisa de mudança. 

– Sabemos que as pessoas com mais de 50 anos possuem dificuldade para entrar no mercado de trabalho em todo Brasil. Em Santa Catarina essa realidade não é diferente, mas estamos empenhados para a empregabilidade desse público – avalia Alexandre Souza, gerente de políticas de emprego e ocupação da Secretaria de Estado da Indústria, do Comércio e do Serviço. 

Necessidade econômica e ânimo para viver

Apesar das histórias diferentes que os levaram para o mesmo cargo, Lúcia e Altemiro reforçam as mesmas questões: trabalhar é complementar a renda e garantia de ânimo para viver. 

– Trabalhar faz bem para cabeça. E faz bem para o bolso. Eu sou aposentada, mas precisava complementar minha renda. É tudo de bom – diz dona Lúcia. 

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Seguir no mercado de trabalho ou buscar por uma vaga diz respeito à realidade econômica da população. Para o professor Lauro Mattei, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), o empobrecimento das pessoas como fator geral exige que muitos continuem executando serviços para recompor a renda familiar. 

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– Entre 2016 e 2022 houve uma perda de 31% do valor aquisitivo dos salários. Isso significa que aquilo que você comprava em 2016, com o mesmo valor você compra apenas dois terços. Por isso, muitas dessas pessoas idosas são obrigadas a retornar ao mercado de trabalho para recompor a sua renda básica que garanta uma sobrevivência mínima – analisa o professor em entrevista ao repórter André Lux, da NSC TV. 

Além disso, voltar a trabalhar é visto como uma oportunidade de ter uma atividade fora de casa e conviver com outras pessoas. Assim, a terceira idade mantém o corpo e a mente funcionando, permanecendo ativos. Para Altemiro, o trabalho ainda soma outra motivação: 

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– O atendimento ao público me motiva, estar sempre envolvido com o público dá um ânimo de vida. Sou um guri novo, não resta dúvida. Tudo é entusiasmo para estar trabalhando – afirma o aposentado. 

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– A gente vem trabalhar porque a gente gosta de trabalhar, porque o salário é bom. A gente vê gente, fala com um monte de gente. Isso que é importante. E o nosso comprometimento como pessoas de terceira idade traz esse benefício para a empresa também – reforça Lúcia. 

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