No mês de maio, observatórios internacionais chamaram a atenção para um dado alarmante: o recorde de emissões de gases do efeito estufa. A concentração atmosférica de CO2 excedeu 400 partes por milhão (ppm) em sete das 13 estações de observação do Ártico, patamar considerado de risco.

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Contudo, este e outros dados que mostram o avanço do aquecimento global acabam muito distantes da realidade diária das empresas, uma vez que a maioria sequer conhece a sua própria contribuição para o efeito estufa. Mas este cenário tende a mudar.

No segundo semestre do ano passado, os Estados de São Paulo e Rio de Janeiro instituíram legislações que obrigam diversos setores industriais a contabilizar as emissões. A apresentação do inventário é necessária para fins de licenciamento ambiental.

Se as empresas catarinenses ainda não possuem a mesma obrigatoriedade, uma iniciativa pioneira do poder público dá a pista de sua sensibilidade para a questão. De forma voluntária, o governo do Estado de Santa Catarina é o primeiro do Brasil a realizar o cálculo de suas emissões.

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Antes de cobrar do setor privado, o poder público quer fazer o seu dever de casa, explicou a Secretaria de Estado do Desenvolvimento Sustentável.

Mas o governo não está sozinho. Seis empresas com sede em Santa Catarina também contabilizam suas emissões pelo programa brasileiro GHG Protocol e duas delas ficam na região Norte: a Embraco e a Malwee, estreante no programa que utiliza a metodologia mais aplicada no mundo.

– O aquecimento global tornou-se um tema presente nas escolas, em casa, em nosso dia a dia. Fazer o inventário será uma obrigação de todos no futuro – estima o coordenador ambiental e responsável pelo programa na Malwee, Cassiano Ricardo Minatti.

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Estimar quanto uma empresa contribui para o aquecimento global parece complicado. Mudar a situação, mais ainda. No entanto, ambos são possíveis para empresas de qualquer porte e área de atuação, explica a coordenadora do Programa Brasileiro GHG Protocol, Beatriz Kiss.

Atualmente, 106 instituições participam do programa no Brasil, e a adesão vai além do mundo empresarial. Em agosto, o governo catarinense concluiu, de forma pioneira, um extenso levantamento, que durou mais de um ano, para conhecer a sua contribuição para o efeito estufa.

Foi o primeiro governo estadual no Brasil a tomar a iniciativa. Participaram do levantamento 113 servidores públicos estaduais de 27 instituições da administração pública direta e 29 da administração indireta, além de 36 secretarias de Desenvolvimento Regional. Até o fechamento desta edição, a equipe técnica estava finalizando o relatório que vai apontar as ações necessárias para reduzir o nível de emissões. Outro exemplo fora do meio empresarial vem da Polícia Federal, que realiza o inventário desde 2008.

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O inventário, documento que identifica oportunidades para se reduzir os impactos ambientais das operações, traz um diagnóstico bem detalhado das fontes de emissão e representa um passo fundamental antes de promover qualquer mudança interna.

– Sempre há opção de trocar um combustível fóssil por outro renovável, substituir equipamentos para melhorar a eficiência energética e reduzir as perdas, mas tudo depende do que é necessário a cada processo – diz Beatriz.

Quem adere ao programa normalmente começa com a capacitação para se familiarizar com o processo. Em seguida, ocorre a coleta de dados. Esta é a etapa mais demorada, podendo levar em torno de três meses em uma grande empresa.

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O passo seguinte é o registro dos dados, com o auxílio de ferramentas de cálculo disponibilizadas em planilhas de Excel. No caso de uma empresa estreante, o processo deve durar menos de um ano.

Adesão crescente

Lançado em 2008, o Programa Brasileiro GHG Protocol não é o único caminho para realização do inventário. Qualquer organização pode buscar ajuda de consultorias especializadas no mercado. A Malwee teve duas experiências anteriores, em 2007 e 2008, com auxílio de consultorias que serviram como aprendizado.

O diferencial do programa brasileiro, para a empresa têxtil de Jaraguá do Sul, foi fornecer a metodologia GHG Protocol (a mais utilizada no mundo) pronta, só para inserir os dados para o cálculo, e tornar público o relatório de todos os membros. A divulgação é um passo importante para que as empresas consigam comparar dados e trocar experiências.

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O programa surgiu a partir de uma parceria entre o Centro de Estudos em Sustentabilidade da Fundação Getúlio Vargas e o World Resources Institute, com apoio do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), Ministério do Meio Ambiente e do Conselho Empresarial Mundial para o Desenvolvimento Sustentável. A adesão vem aumentando. O número de membros saltou de 23, em 2009, para 106 em 2013.

De acordo com a coordenadora do programa, Beatriz Kiss, o principal objetivo das empresas é melhorar o desempenho ambiental. O inventário servirá para implementar a gestão, que levará a ganhos de custo operacional.

Segundo ela, outra preocupação crescente é o atendimento aos marcos regulatórios, como as recentes legislações do Rio de Janeiro e de São Paulo, que obrigam diversas indústrias a fazer o inventário. Para Beatriz, a tendência é de se expandir a obrigatoriedade para outros Estados, podendo até se tornar uma lei nacional.

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Malwee aposta na biomassa

A Malwee, empresa do ramo têxtil de Jaraguá do Sul, fez sua estreia neste ano no Programa Brasileiro GHG Protocol e já identificou oportunidades de melhorias. O levantamento mostrou que as principais fontes de emissão de gases do efeito estufa têm como combustível o gás natural. Para reduzir as emissões, portanto, deveria substituir o combustível.

A previsão é de que em 2014 ocorra a troca dos geradores de vapor atuais por um novo equipamento cuja matriz energética é a biomassa. De acordo com o coordenador ambiental e responsável pelo programa na Malwee, Cassiano Ricardo Minatti, a substituição está em estudo, mas é provável que a empresa utilize cavaco. O desafio, segundo ele, é buscar empresas certificadas para garantir o abastecimento de forma sustentável.

O inventário da Malwee começou a ser organizado no comitê ambiental. Em fevereiro deste ano, o grupo tomou a decisão e acionou outras áreas. O departamento fiscal foi decisivo. Papéis e planilhas foram as principais armas para realizar o trabalho, que envolveu mais de 20 pessoas, direta ou indiretamente. A equipe dedicou dois dias para a capacitação, já que teve experiências anteriores com o tema. Em julho, estava com o documento pronto.

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Nesta primeira edição, a empresa não incluiu as emissões indiretas que utilizam, por exemplo, dados sobre controle de viagens. Cassiano explica que está sendo criando um sistema de controle interno mais apurado para facilitar a busca de dados como esses.

É preciso cuidado ao comparar os números da emissões entre uma empresa e outra, dada a gama de fatores que variam mesmo dentro de um mesmo setor. Observar a curva ascendente ou decrescente, isoladamente, também não revela os avanços ou retrocessos, porque é natural que o crescimento da organização acarrete elevação dos níveis de emissão de gases de efeito estufa.

Para acompanhar o avanço, a Malwee criou um indicador próprio, focado em seu negócio, que vincula a emissão de CO2 ao quilo de malha produzida. Este é o caminho adotado também por outras empresas que participam do programa, a associação de toneladas de emissão por produção ou por faturamento.

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