O mantra que embalou a trajetória de um leão, um javali e um suricate nas telas do desenho animado O Rei Leão (1994) tornou-se o nome e o lema de uma viagem que só tem data de partida. As argentinas Camila Saint Jean, 26, e Vanina Tortosa, 28, embarcaram há dois meses em uma viagem que explora o litoral brasileiro e tem como meta chegar à Amazônia. Tudo a bordo de um Ford Falcon 1985 e na companhia de Enero, o fiel cão. Andar Hakuna Matata é o nome da expedição, que não tem dia para acabar. Desde a semana passada, o trio conhece as cidades do Norte catarinense, passando por Jaraguá do Sul.

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As jovens desembarcaram na cidade e, agora, conhecem algumas praias próximas, enquanto aguardam uma encomenda que chegará em Corupá – uma barraca que é acoplada no teto e servirá de cama pelo restante da viagem. O automóvel que leva as viajantes não passa despercebido. O modelo antigo por si só chamaria atenção, mas o acréscimo de uma colorida logomarca nas portas e volumosas malas sobre o teto completam o visual que atrai olhares, elogios e até pedidos de fotografias.

É o carro, por sinal, a nova moradia das viajantes. Sem endereço fixo, o automóvel tornou-se a referência para ambas. É lá que estão todos os objetos necessários à sobrevivência delas: de instrumentos para camping, comida, roupas, até mapas e o diário de bordo. Porém, não é apenas de camping que as meninas passam suas noites. A dupla conta com amigos, conhecidos e até estranhos que as abrigam. Sites como o Couch Surfing, de hospedagem solidária, já foram utilizados para encontrar abrigo pela noite – e com isso conhecer a vida dos moradores. Até agora, 14 pessoas já hospedaram as peregrinas.

– Conhecemos muitas casas e cada uma é um universo diferente, ao qual nos adaptamos e flexibilizamos. É incrível conhecer as pessoas. E estamos aprendendo a nos deixar ajudar. Muitos querem contribuir e estamos nos abrindo para isso – conta Camila, em um português recém aprendido que ainda é carregado de espanhol.

No percurso, as jovens registram em um diário suas experiências. O objetivo é transformar o relato em livro. Primeiro, capítulos breves devem ser escritos, impressos e oferecidos ao longo da viagem. Depois, tudo será reunido em um único volume. Por enquanto, porém, Camila e Vanina não pensam no fim. Pensam, isso sim, no trajeto, vivendo cada dia sem planos.

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– Não planejamos muito, pois podemos não cumprir e, então, nos decepcionamos. Deixamos a viagem nos levar e aproveitamos. Ainda temos muito o que viver – sorri Vanina.

Amizade e liberdade

Camila e Vani conheceram-se há um ano e meio em Buenos Aires, onde moravam. Compartilharam, desde o começo, o desejo por algumas mudanças na rotina e uma vida mais livre. Cada uma tinha viagens independentes marcadas com outros amigos. Porém, quando os preparativos tornaram-se sérios, o restante do grupo acabou abandonando o sonho. As duas resolveram unir seus caminhos e compartilhar a estrada.

A viagem começou no dia 3 de janeiro. Para elas, o mais difícil não foi o desapego material, em relação às casas, empregos, móveis e objetos deixados para trás. Mesmo os arranjos para a partida foram breves, feitos em cerca de cinco meses. O preparo fundamental foi o do pensamento e das emoções para enfrentar uma vida nova e livre do que sempre foi pregado como ideal.

– Não temos tempo definido para voltar e isso é o mais lindo de nossa viagem, pois tudo é pensado de outra maneira. Na cidade, há tempo certo para tudo. Conosco, não – resume Vanina.

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– E aprendemos a respeitar nossas vontades. Fazemos aquilo que estamos sentindo. Há um equilíbrio em relação ao que é necessário e nossos desejos – completa Camila.

É com isso em mente que as meninas permitem a flexibilização do caminho. Se o litoral é o objetivo principal, os convites para conhecer outras cidades costumam ser aceitos. Afinal, há tempo. Depois de passar pela Amazônia, as viajantes querem ir para a Venezuela. De lá, farão a decisão: seguir viagem rumo ao Norte, subindo pela América Central, ou retornar pela América do Sul ao seu país natal.

Curiosidades

– As meninas saíram da Argentina com uma pequena reserva de dinheiro para casos de emergência e outra para o dia a dia. Em média, o gasto varia entre R$ 10 e R$ 30 por dia;

– Para completar a renda, elas vendem artesanatos e procuram empregos temporários em algumas das cidades visitadas;

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– O Ford Falcon já teve um problema mecânico e foi necessária a troca de uma peça. Porém, elas nunca ficaram paradas na estrada;

– Viajando a 80 ou 85 km/h, a dupla sente o estresse imposto pelos motoristas e pela alta velocidade das estradas;

– Enero, o cão que as acompanha, foi adotado pela família de Camila. Ele tem cerca de dez anos;

– A inspiração para a viagem veio, em parte, do livro “Atrapa tu sueño” (Agarre seu sonho), do casal argentino Herman e Candelaris Zapp, que viaja há mais de uma década com a família.

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