Quando terminou de ler “Caminhos“, o fotógrafo do interior de São Paulo, André Cerri, passou um mês ensaiando em como iria propor à companheira, a nutricionista Karla Silva, uma viagem aos moldes daquela feita pelo autor do livro, Argus Caruso. De lua de mel, o casal fez um mochilão pela América Latina. Após quase 10 anos de relacionamento, era chegada a hora de uma viagem maior pelo mundo e com uma proposta diferente daquela de conhecer o máximo de lugares em determinado tempo.
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Karla aceitou a ideia, sonhou e planejou junto de André uma volta ao mundo de bicicleta – um dos meios de transporte mais lentos que existem. Eles quiseram conhecer o planeta bem devagar, com tempo para ver, cumprimentar e conversar com o maior número de pessoas possível. Nesta semana, chegaram a Santa Catarina após mais de 30 mil quilômetros rodados em três anos e quatro meses de viagem. Ficaram três dias em Florianópolis, de onde seguiram para Ribeirão Preto, onde devem encerrar a jornada.

Pelas lentes do companheiro, Karla pedala no Norte da Argentina, último país que passaram antes de chegar ao Brasil. Foto: André Cerri/Arquivo Pessoal
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Eles nem tinham bicicleta
O casal iniciou a viagem na Holanda – país da Europa com 17 milhões de habitantes, 18 milhões de bicicletas e 35 mil quilômetros de ciclovias -, onde comprou as bicicletas de longa distância e fez uma espécie de treino para ganhar resistência ao percorrer todo o território. Eles sequer tinham bicicleta antes da viagem.
– Nós somos a prova de que é possível. Apesar de difícil, pela falta de estrutura, insegurança e temperaturas extremas em alguns lugares, fazer uma viagem dessas de bicicleta é incrível. A bike abre portas, em todos os sentidos, e nos aproxima de pessoas que chegam por curiosidade ou para ajudar. Também nos deixa mais humanos – conta Karla.
Bikes And Spices from Andre Cerri on Vimeo.
40 países pelo caminho
Os “pedarilhos” passaram por 40 países da Europa, Oceania, Ásia e Américas do Norte, Central e Sul – nessa ordem. O Marrocos foi um dos que mais gostaram, principalmente pelas estradas tranquilas para pedalar, mas também pela diversidade cultural, baixo custo e presença predominante do sol. China, Laos, México e Estados Unidos completam o top cinco. Em compensação, o Peru foi um dos mais difíceis devido às chuvas, ao frio do El Niño e, claro, às subidas.
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– Chegamos no limite. Tentamos por duas vezes atravessar a Cordilheira [dos Andes], mas não conseguimos. Não quisemos ser super-heróis e pegamos um ônibus – define Karla.
Eles tentam percorrer uma média de 50 quilômetros por dia entre as paradas em hospedeiros ou campings. Contando o peso da bicicleta (em média 18 quilos), André carregava 60 quilos, enquanto que Karla se encarregava de 35. Sem um roteiro muito rígido, tiveram tempo para captar lugares, momentos, peculiaridades, sorrisos e almas.
– Teve uma senhorinha de 97 anos chamada Jeanette, no Sul da França, que abriu a casa para a gente e nos ofereceu biscoitos. Passamos um tempo com ela, que se interessou muito pela nossa viagem. Nos disse que quando morresse, iria junto com a gente. Depois de dois meses, ficamos sabendo que já tínhamos a Jeanette como companhia. Esse é o motivo da viagem – lembra André.
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O casal tinha planos de parar em Blumenau antes seguir para São Paulo, mas a perspectiva de emprego fez com que os dois acelerassem o ritmo nessa reta final. A expectativa é chegar ao interior paulista em meados de setembro.

Para o casal, o Peru foi o país mais difícil de todos para pedalar. Foto: André Cerri/Arquivo Pessoal
Como planejar uma grande viagem?
André e Karla passaram dois anos e meio planejando a volta ao mundo de bicicleta. Pensaram quais países gostariam de passar, como ficariam hospedados em cada cidade, e quanto gastariam por dia. Escolheram a lista das nações, olharam campings e conheceram sites que promovem hospedagem para cicloviajantes como o Warmshower.org, e definiram 15 dólares (cerca de R$ 53) por dia para poder gastar – sites de viagem recomendam 50 dólares ou 50 euros por dia, mas eles dizem que é possível gastar menos.
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– Passamos esse tempo economizando e comprando as parafernalhas, que incluiu um fogareiro, por exemplo, para podermos cozinhar. Vendemos o carro e alugamos o apartamento enquanto tivemos fora. Mas é uma viagem simples. Nosso gasto mensal na estrada foi menor do que morando em São Paulo – garante André.
Eles enfatizam a quantidade de informação disponível na internet atualmente, principalmente com a cultura da bicicleta em ascensão. O Pedarilhos e o Travelling Two são bons exemplos, conforme o casal viajante.

Cicloviajantes também quiseram conhecer a cultura cubana. Foto: André Cerri/Arquivo Pessoal
Livros para se inspirar
Caminhos – Argus Caruso
Homem Livre: Ao redor do mundo sobre uma bicicleta – Danilo Perrotti Machado
Travessia: 747 Dias de Bicicleta pelo Mundo – Charles Zimmermann