Uma nova gravação feita pelo ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado, delator da Operação Lava-Jato, mostra o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), em conversa datada de 24 de fevereiro. No diálogo, ele faz orientações a uma pessoa identificada como Wandemberg, que seria representante de Delcídio Amaral (sem partido-MS). O tema da conversa era a defesa do então senador, que na época ainda enfrentava processo no Conselho de Ética da Casa e já havia se tornado delator da Lava-Jato — sem que Renan soubesse. A gravação foi divulgada nesta quinta-feira pelo Jornal Hoje, da Rede Globo.

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Em um dos trechos, o presidente do Senado diz ser necessário que o presidente do conselho, senador João Alberto Souza (PMDB-MA), peça diligências para não parecer que a investigação está parada. Ele sugere que Delcídio deveria fazer uma carta mostrando humildade e dizendo que já pagou o preço pelo que fez:

Renan — O que que ele (Delcídio) tem que fazer… Fazer uma carta, submeter a várias pessoas, fazer uma coisa humilde… Que já pagou um preço pelo que fez, foi preso tantos dias… Família pagou… A mulher pagou…

Wandemberg — Ele (Delcídio) só vai entregar à comissão, fazer essa carta e vai embora.

Renan — Conselho de Ética. Falei agora com o João (João Alberto, presidente do Conselho de Ética). O João, ele fica lá ouvindo os caras… O Conselho de Ética não tem elementos para levar processo adiante. Também é ruim dizer que não vai levar o processo adiante. Então, o Conselho de Ética tem que requerer diligências, requisição de peças e, enquanto isso não chegar, fica lá parado…

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Wandemberg — (João Alberto) vai colocar em votação e vai ter uma derrota antecipada…

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Por meio de nota, a assessoria de Renan afirmou que o presidente do Senado acelerou o processo de cassação de Delcídio e que o processo do ex-petista não ficou parado no Conselho de Ética.

“O senador (Renan Calheiros) lembra que acelerou o processo de cassação no plenário às vésperas da votação do impeachment. O desfecho do processo de cassação é conhecido, foi público e a agilização do processo foi destaque em vários jornais. Na fase do Conselho de Ética opinou com um amigo do ex-senador, mas disse que o processo não podia ficar parado, como não ficou”, diz o texto da nota.

Procurador-geral e outros políticos são citados

Em outra gravação de Machado, de 11 de março, também divulgada pelo Jornal Hoje, o ex-presidente da Transpetro conversa com Renan. Eles falam sobre o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, citando uma “fórmula de dar um chega pra lá nessa negociação ampla, para poder segurar esse pessoal”. O diálogo inclui críticas a vários políticos: senador Aécio Neves, presidente do PSDB; deputado Pauderney Avelino (AM), líder do DEM; “Mendoncinha”, como é chamado o agora ministro da Educação, deputado Mendonça Filho (DEM-PE); senador José Agripino (RN), presidente do DEM; senador Fernando Bezerra (PSB-PE); senador José Serra (PSDB-SP), atual ministro das Relações Exteriores; e a presidente afastada Dilma Rousseff (PT).

Sérgio Machado — Agora esse Janot, Renan, é o maior mau-caráter da face da terra.

Renan — Mau-caráter! Mau-caráter! E faz tudo que essa força-tarefa (Lava-Jato) quer.

Sérgio Machado — É, ele não manda. E ele é mau-caráter. E ele quer sair como herói. E tem que se encontrar uma fórmula de dar um chega pra lá nessa negociação ampla pra poder segurar esse pessoal (Lava-Jato). Eles estão se achando o dono do mundo.

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Renan — Dono do mundo.

Sérgio Machado — E o PSDB pensava que não, mas o Aécio agora sabe. O Aécio, Renan, é o cara mais vulnerável do mundo.

Renan — É…

Sérgio Machado — O Aécio é vulnerabilíssimo. Vulnerabilíssimo! Há muito tempo.

Sérgio Machado — Como que você tem cara de pau, Renan, aquele cara Pauderney que agora virou herói. Um cara mais corrupto que aquele não existe, Pauderney Avelino.

Renan — Pauderney Avelino.

Renan — Mendocinha.

Sérgio Machado — Mendocinha, todo mundo pô? Que *** é essa querer ser agora o dono da verdade?

Sérgio Machado — O Zé (Zé Agripino) é outro que pode ser parceiro, não é possível que ele vá fazer maluquice.

Renan — O Zé, nós combinamos de botá-lo na roda. Eu disse ao Aécio e ao Serra. Que no próximo encontro que a gente tiver tem que botar o Zé Agripino e o Fernando Bezerra. Eu acho.

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Sérgio Machado — O PSB virou uma oposição radical. O Zé não tem como não entrar na roda.

Renan — O PSB quer o impeachment, mas o Fernando (Bezerra) é um cara bom.

Sérgio Machado — Porque também entende disso que a gente está falando.

Renan — É.

Sérgio Machado — Porque tem que tomar cuidado porque esse *** desse Noblat (referindo-se ao colunista Ricardo Noblat, do jornal O Globo) botou que essa coisa de tirar a Dilma é maneira de salvar os corruptos.

Renan — Tirar a Dilma? Manter a Dilma?

Sérgio Machado — Tirar a Dilma. Que é um processo de salvação, de salvação.

Renan — Que é a lógica que ela fez o tempo todo.

Sérgio Machado — É porque esse processo. Porque, Renan, vou dizer o seguinte: dos políticos do Congresso, se “sobrar” cinco que não fez é muito. Governador, nenhum. Não tem como, Renan.

Renan — Não tem como sobreviver.

Sérgio Machado — Não tinha como sobreviver.

Renan — Tem não.

Sérgio Machado — Não tem como sobreviver. Porque não é só, é a eleição e a manutenção toda do processo.

Renan — É.

Em uma outra gravação, Machado ainda acusa Janot de trabalhar para que ele seja julgado pelo juiz Sergio Moro:

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Sérgio Machado — O que eu quero conversar contigo… Ele não tem nada de você, nem de mim… O Janot é um **** da maior, da maior.

Renan — Eu sei. Janot e aquele cara da… Força-tarefa…

Sérgio Machado — Mas o Janot tem certeza que eu sou o caixa de vocês. Então o que ele quer fazer. Não encontrou nada e nem vai encontrar nada. Então quer me desvincular de você. (…) Ele acha que, no Moro, o Moro vai me prender, e aí quebra a resistência e aí… Então a gente precisa ver, andei conversando com o presidente Sarney, como a gente encontra uma… Porque se me jogar lá embaixo eu estou ***.

Renan — Isso não pode acontecer.

Outro lado

À reportagem, a defesa de Sérgio Machado disse que os autos são sigilosos e que, por isso, não pode se manifestar. A defesa de Dilma afirmou que ela jamais pediu qualquer tipo de favor que afrontasse o princípio da moralidade pública.

O líder do DEM na câmara, deputado Pauderney Avelino, disse que nunca conversou com Machado e nem indicou qualquer diretor para a Petrobras ou qualquer estatal. Para ele, o caso foi uma citação lamentável, de uma pessoa desesperada.

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O ministro da Educação, Mendonça Filho, afirmou que as gravações comprovam que ele não está incluído nas irregularidades investigadas e que sua atuação como líder oposicionista ao governo do PT incomodou.

O senador João Alberto disse estar surpreso com as citações e que cumpriu com todas as obrigações dentro do Conselho de Ética. O senador Fernando Bezerra, que é investigado na Lava-Jato, afirmou que não vai comentar uma eventual conversa de terceiros cujo conteúdo desconhece. Já o senador José Agripino disse que nunca teve nenhuma conversa com Renan, nem com Sérgio Machado, em que o assunto Lava-Jato fosse sequer mencionado.

A reportagem do Jornal Hoje não obteve retorno do ministro José Serra nem do procurador-geral da República, Rodrigo Janot. O jornalista Ricardo Noblat não vai se manifestar. O PSDB disse que não existe nas gravações qualquer acusação ao partido ou ao senador Aécio Neves.

Por sua vez, o PMDB alegou que sempre arrecadou recursos seguindo os parâmetros legais em vigência no país e que doações de empresas eram permitidas e perfeitamente de acordo com as normas da Justiça Eleitoral nas eleições citadas.

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