A entrada em vigor de uma nova lei do aborto pretendia acabar, segundo seus defensores, com 25 anos de medos e lacunas jurídicas para as mulheres e os médicos na Espanha. A interrupção da gravidez deixou ontem de ser um delito sem pena – salvo em três casos – e passou a ser um direito. Qualquer gestante poderá interromper a gestação dentro das primeiras 14 semanas, sem ter de dar quaisquer explicações nem justificativas.
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Sob a alegação de abalo emocional, já era realizada grande parte dos mais de 100 mil abortos anuais desse país. Mesmo assim, a nova medida tem suscitado forte oposição entre a população, de maioria católica. Entre os pontos mais polêmicos, está a permissão para que jovens a partir de 16 anos interrompam a gravidez sem informar aos pais. As adolescentes não precisarão contar à família sobre a intervenção caso aleguem que podem ser coagidas ou sofrer violência em casa. Conhecida essa situação, será o médico de uma clínica privada – só 3% dos abortos na Espanha são praticados nos hospitais públicos – que decidirá atuar sem informar aos pais, apoiado, se quiser, por um psicólogo ou um assistente social. Se as menores considerarem possível contar, terão que ir acompanhadas ao centro por um dos pais – ainda assim, não será exigida uma autorização.
Em caso de risco de saúde para a mãe, ou de malformação fetal, o aborto será permitido até a 22ª semana. Também será possível interromper a gravidez depois desse período, se forem reveladas anomalias fetais extremamente graves e incuráveis.
Oposição diz que lei é inconstitucional
A norma foi aprovada há cinco meses pelo parlamento e substitui outra lei que, há 25 anos, em 5 de julho de 1985, passou a permitir que mulheres abortassem em determinados casos. O conservador Partido Popular (PP, principal força da oposição) e o governo da região de Navarra (norte espanhol), porém, pediram que o Tribunal Constitucional (TC) suspenda oito de seus artigos por entender que o “aborto livre” é contrário ao direito à vida, garantido pelo artigo 15 da Constituição espanhola. A ministra da Igualdade, Bibiana Aído, por sua vez, afirmou que o governo está convencido sobre a constitucionalidade da nova norma.
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Associações de médicos também apresentaram ontem um recurso ao TC, com o argumento de que a legislação aprovada estabelece uma diferença “juridicamente insustentável” sobre o que é um feto saudável e outro doente, cuja vida pode ser encerrada no seio materno. Já a Conferência Episcopal espanhola publicou ontem uma nota, declarando que a medida é “incompatível com a justa consciência moral”, pois, “do ponto de vista ético, piora a legislação vigente”. Segundo a nota, a lei deixa a vida humana sem defesa alguma.