*Por Jon Hurdle
WILMINGTON, Delaware – Quando os peixes migratórios seguirem seu instinto ancestral de subir o Riacho Brandywine, em Delaware, durante a estação de desova desta primavera, eles verão que, pela primeira vez em mais de duzentos anos, sua rota não estará bloqueada por uma barragem.
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O robalo riscado e duas espécies de sável não têm conseguido retornar aos seus locais de desova tradicionais na parte do riacho localizado no estado da Pensilvânia, cerca de 40 quilômetros ao norte, desde que uma série de barragens foi construída pelos primeiros colonos americanos, em meados do século XVIII.
Este ano, os peixes poderão nadar além do local onde ficava uma barragem que foi demolida pela cidade de Wilmington, no outono passado. Eles conseguirão chegar até a próxima barragem, a Barragem 2, localizada a pouco mais de um quilômetro, riacho acima. A grande quantidade de peixes deverá criar uma bonança repentina para os pescadores.
A partir do próximo mês, "haverá milhares de sáveis aqui. Esta região ficará cheia de pescadores que serão atraídos por eles. Vai ser um Natal fora de época", disse Jerry Kauffman, professor da Universidade de Delaware.
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Kauffman, que lidera o Centro de Recursos Hídricos da universidade, faz parte do Brandywine Shad 2020, um grupo sem fins lucrativos que espera, nos próximos três anos, remover ou modificar todas as dez barragens remanescentes na extensão de 34 quilômetros do riacho que passa por Delaware.
A Barragem 2 não será removida agora porque esse projeto será maior e mais caro. Kauffman e seus associados querem remover ou modificar quatro outras barragens ainda este ano, e assim iniciar um dos maiores programas de remoção de barragens do país em uma única bacia hidrográfica.
"Esse é provavelmente o maior número de barragens já analisadas em um único rio. A principal diferença em relação a outros projetos é a abordagem da bacia hidrográfica, já que estamos analisando uma série de barragens a serem removidas ao mesmo tempo. Esse projeto será um exemplo a ser seguido", afirmou Laura Craig, diretora de restauração de rios da American Rivers, um grupo conservacionista.

A remoção de barragens reconecta habitats de peixes, diminui a temperatura da água, acelera o fluxo do rio, aumenta o oxigênio dissolvido – um importante indicador da capacidade de um rio de sustentar populações de peixes – e melhora a qualidade da água para cidades como Wilmington, disse Craig.
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O retorno dos sáveis e de outros peixes migratórios ao riacho não apenas restaurará o antigo ritmo natural, mas também fornecerá sustento para outros animais selvagens, como as águias-de-cabeça-branca que se alimentam dos peixes, enquanto seus corpos em decomposição, após a desova, adicionam nutrientes à hidrovia.
Os apoiadores do projeto também argumentam que a remoção de barragens pode reduzir as enchentes rio acima, já que a água fluirá livremente e não ficará acumulada atrás de uma barreira. Segundo eles, a necessidade de controle de enchentes está se tornando mais urgente à medida que as tempestades estão ficando maiores e mais frequentes por conta das mudanças climáticas.
"Gostaríamos de remover essa barragem antes da próxima grande tempestade", comentou Kauffman sobre a Barragem 3, uma estrutura de 40 metros que já está danificada.
As barragens, originalmente construídas para fornecer energia aos moinhos localizados ao longo do riacho nos últimos dois séculos, estão obsoletas há muito tempo. Três barragens são marcos históricos nacionais e permanecerão no local, juntamente com outras duas barragens históricas, depois que as demais forem parcial ou totalmente removidas.
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As estruturas tombadas serão modificadas com diferentes tecnologias para permitir que os peixes migratórios nadem por cima ou ao redor delas e continuem sua jornada rio acima.
As técnicas incluem: um desvio, uma rampa inclinada que permite que os peixes nadem em torno de uma extremidade da barragem; uma "rampa de rocha", que reproduz a exata largura do leito do riacho no lado de baixo da barragem, para que os peixes possam nadar sobre ela; e uma "escada" para peixes, um canal de concreto projetado para que os peixes evitem a barragem e alcancem o lado superior da barragem.
As modificações podem permitir que 50 a 80 por cento dos peixes passem pelas barragens, disse Kauffman. Outros projetos de remoção de barragens registraram um rápido retorno dos peixes aos seus locais de desova. Em outra região do norte de Delaware, no Riacho White Clay, os peixes estão nadando além do local onde havia uma barragem do século XVIII, que foi removida em 2014.
O padrão está sendo repetido nos Estados Unidos à medida que organizações sem fins lucrativos e alguns governos estaduais estão percebendo que a remoção de barragens antigas ajuda o meio ambiente. Os peixes retornaram ao Rio Penobscot, no Maine, após a demolição de duas barragens, em 2013 e 2014. No Oregon e na Califórnia, quatro barragens do Rio Klamath devem ser removidas até 2022.
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Embora as modificações nas barragens possam ajudar os peixes a nadar até sua área de desova, as técnicas são muito menos eficazes do que a remoção definitiva da estrutura e, portanto, podem ser vistas como uma solução imperfeita para o desafio da restauração holística dos rios, explicou Craig, da American Rivers.
"Desvios e rampas são menos eficazes que a remoção completa da barreira. Há lugares em que tais abordagens foram bem-sucedidas em ajudar a reconectar o habitat, mas você deixa de ganhar todos os outros benefícios para a ecologia do rio", reforçou a diretora.
"É adequado para os peixes se seu único interesse forem os peixes, mas a American Rivers tenta analisar de maneira mais profunda a viabilidade de remover a barreira, mesmo que isso seja mais desafiador e mais caro, visando ao benefício do sistema como um todo", continuou ela.
Segundo Kauffman, o Brandywine está pronto para receber de volta os peixes migratórios, uma vez que a qualidade de sua água melhorou nitidamente desde a Lei Federal da Água Limpa, de 1972, que regulamentou a descarga de poluentes nas vias navegáveis. O nível de oxigênio dissolvido aumentou com a queda do efluente industrial, ao passo que o fósforo, as bactérias e os sedimentos diminuíram.
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Os peixes migratórios não retornarão às águas poluídas, mesmo que não haja barragens bloqueando seu caminho, disse Craig. Para ela, o Rio Delaware é um exemplo de que os dejetos industriais poluíram tanto a água nas décadas de 50 e 60 que o sável e outras espécies não migravam para o norte da Filadélfia. Atualmente, com a melhora na qualidade da água, os peixes estão subindo muito mais o rio, até o norte de Nova Jersey.
Os apoiadores, no entanto, temem que as melhorias possam sofrer um revés, já que o governo Trump aprovou recentemente o retorno da regra das águas nos EUA, que removerá as proteções federais para córregos intermitentes e algumas regiões pantanosas de água doce, facilitando a construção nessas áreas por proprietários de terras.
Ainda assim, o projeto das barragens do Rio Brandywine está avançando, com o objetivo de remover ou modificar as barragens 3, 4, 6 e 11 ainda este ano, dependendo da disponibilidade de recursos federais, estaduais e privados. Os projetos deste ano exigirão cerca de US$ 680 mil, dos quais US$ 410 mil seriam destinados à remoção da Barragem 4, uma estrutura de 50 metros que atravessa o riacho entre um parque estadual e o local no qual funcionava uma fábrica têxtil do século XVIII, onde hoje condomínios estão sendo construídos.
A seguir, a construção de um canal de desvio para a Barragem 2 – que deve ser preservada porque contém um sistema de fornecimento de água para Wilmington – deve custar US$ 1,4 milhão.
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Até agora, o financiamento incluiu US$ 241 mil do governo federal como resultado da Lei de Conservação da Bacia do Rio Delaware, de 2016, que ajuda projetos locais de conservação, e um subsídio do mesmo valor proveniente do Estado de Delaware, onde três barragens estão localizadas. Kauffman espera que uma quantia semelhante venha da mesma fonte federal após a nova rodada de financiamento que se realizará no início deste ano.
No entanto, mesmo antes de qualquer barragem ser removida, ele está confiante em que os peixes conseguirão subir o rio este ano, graças à remoção da Barragem 1 no ano passado. Isso mostrará que os peixes estão prontos para retornar.
"Eles literalmente baterão com a cabeça na Barragem 2 e continuarão nadando até não conseguirem mais", concluiu o professor.
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