Amanhã, Dia de Finados, fará sete dias que meu filho Gabriel foi morto em circunstâncias estranhas. Quero que todos saibam que o amei com toda a intensidade que o amor de mãe pode amar. Desde o seu nascimento e com todas as dificuldades que o mundo nos impôs, nunca deixei de amá-lo.
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Gabriel foi o anjo que fez com que eu conseguisse evoluir como ser humano e por isso sou eternamente grata a ele. Meu filho foi estigmatizado, sofreu preconceito por morar numa comunidade carente e desprovida de todos os recursos do Estado, mas foi criado na honestidade e conduzido ao caminho do bem e do respeito às pessoas. Perdi a batalha para a burocracia do Estado e hoje choro lágrimas de dor pela perda, mas mesmo assim quero homenageá-lo e dizer o quanto foi amado.
Nascido em 1° de agosto de 1997 em Florianópolis, Gabriel morava comigo e com o padrasto, Edson Fortuna, no Jardim Zanellato, em São José, e tinha 16 anos.
Gabriel foi morto no dia 19 de outubro em São José por um policial a paisana que, de acordo com a polícia, reagiu a uma tentativa de assalto. O policial teria sido abordado por três jovens em um Fiat Uno quando ia buscar seu carro no estacionamento de uma festa de aniversário, no Loteamento Recanto da Natureza, no Bairro Potecas, em São José.
Padrasto comenta carta emocionada da mãe de adolescente morto por policial
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Edson Fortuna, padrasto
São José
Gostaria de comentar a carta, pois um complemento se faz necessário:
Amar o filho correto, bonito, agradável, isso é fácil e todos conseguem. O difícil é amar o filho problemático e isso Denise fez muito bem, foi mestre no assunto.
O amor verdadeiro que Denise, minha companheira, demonstrou ao Gabriel merece ter todo o destaque e louvor pois, durante toda a jornada do Gabriel ela soube amar sem deixar de corrigir quando se fez necessário. Nenhuma das oportunidades em que Gabriel protagonizou atitudes erradas ele encontrou amparo na família, foi repreendido e respondeu pelo que havia feito em cada uma das oportunidades.
Sobre o número de passagens do Gabriel, embora mentiroso, pois ali constam inclusive os registros onde ele foi vítima e foi sua mãe quem fez os respectivos boletins de ocorrência, esses números desnudam a incapacidade do Estado em dar a devida resposta ao caso, tão somente.
Já a sociedade, hipócrita como sempre, deu as costas. Na escola foi mais fácil recriminar que buscar ajudar. Nos projetos de que participou, pouco foi aproveitado em seu potencial pois como diziam os professores do “segundo-tempo da vida”: ele é muito rebelde! O Conselho Tubelar de São José quando procurado por nós (pais) disse em final de conversa: “dá uma boa surra que ele aprende!” A polícia como um todo fez o que a sociedade deseja: justiça! Já a Justiça, bom, essa nada podia fazer pois não tem sequer onde apreender (ou depositar), quem dirá conduzir a um projeto de recuperação.
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Por fim, creio que a sedução do consumo somou-se aos argumentos acima para conduzir Gabriel ao fatídico momento onde foi morto, e como dito por sua mãe, “em circunstâncias estranhas!”(quem sabe tudo possa ser esclarecido, quiçá, e a dúvida deixe de atormentar a mãe e a família).
Acompanhei a trajetória do menino meigo da foto ao “meliante” desenhado na matéria doDC do dia (19/10), e na condição de padrasto do Gabriel posso dizer que o rótulo dado a ele não condiz com os ensinamentos que sua família buscou transmitir, e não podem servir de estopim para “soluções milagrosas” dos que são agentes da lei.
Que a carta de Denise sirva de alerta, pois muitos jovens são vítimas invisíveis, e para as famílias o que tem restado é a dor e o sofrimento pela perda de seus entes queridos. Força minha amada Denise e que possa superar tamanha dor brevemente.