Na madrugada de sexta-feira (11), durante o desaparecimento da embarcação pesqueira Dom Manoel XVI, o barco que o acompanhava na navegação, o Dom Manoel XV, conseguiu chegar na costa de Rio Grande em segurança. O mestre desse segundo pesqueiro, Jaci Manoel dos Santos, 62 anos, é irmão do comandante do barco que segue desaparecido, Alcioni Manoel dos Santos, 53 anos. Outras seis pessoas estavam a bordo do Dom Manoel XVI. Neste sábado, Zero Hora conversou com Jaci, que afirma estar sofrendo com a incerteza em relação ao paradeiro não só do seu irmão de sangue, mas dos outros seis irmãos que a pesca lhe deu. Jaci recebeu a reportagem de ZH na embarcação que guiava na madrugada em que viu o seu irmão pela última vez.
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Dentro do barco, com espaço apertado, cheiro de peixe e iluminado pelas diversas telas de radares, rádios comunicadores e equipamentos de navegação, Jaci embargou a voz diversas vezes ao lado do leme do Dom Manoel XV, que conseguiu escapar ileso do mar agitado naquela madrugada. O irmão e sua tripulação não tiveram a mesma sorte de chegar em terra firme. Pelo menos é o que se sabe até o momento após quase dois dias de buscas no mar de Rio Grande.
Irmão de tripulante de barco desaparecido fala sobre as buscas em Rio Grande
Veja os principais trechos da entrevista:
Como foi o incidente que acabou com o desaparecimento da embarcação Dom Manoel XVI?
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O mar era muito agitado. Era impressionante. Em quarenta anos que trabalho (no mar) nunca vi uma situação dessas. Estávamos na região do Farol da Solidão, em Mostardas, e decidimos voltar para Rio Grande na quinta-feira por causa das condições do mar. Saímos de lá (Farol da Solidão) perto das 14h30min de quinta. Faltando 13 milhas para chegarmos à barra de Rio Grande, por volta das 4h da madrugada de sexta, me deram o alerta de que ele (Dom Manoel XVI) havia sumido. Perdemos contato com o Dom Manoel XVI. Foi questão de segundos. E daí perdemos ele de vista.
O que o senhor acha que aconteceu com o barco?
A gente imagina que ele pegou uma vaga de mar muito grande e emborcou na onda. Quando a gente faz uma navegação, mantemos distância para que eu possa capitanear ele (Dom Manuel XVI) pelo radar para que a gente não se perca de vista. E foi uma coisa momentânea. Ele sumiu em questão de segundos.
O que o senhor fez após perder o contato visual com a embarcação?
Puxei pela posição (a localização do barco), pedi o auxílio da firma, eles me passaram a posição exata do naufrágio. Eu voltei, das 4h30min da madrugada até o amanhecer, tentando localizar alguma coisa, com a ajuda de mais duas embarcações, mas não achamos nada. Como a visibilidade era ruim e o tempo não me permitia permanecer no local para fazer uma varredura, uma busca, fui obrigado a voltar para a costa, pois não tinha condições (de navegabilidade). Eu poderia colocar em risco outra embarcação e mais sete vidas.
Como estava o mar no momento em que o senhor perdeu contato com a embarcação comandada pelo seu irmão?
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A marola (onda) era de seis metros de altura. Por incrível que pareça, ela quebrava em alto-mar. E uma embarcação dessa não suporta, mesmo sendo de ferro. O mar tem muita força.
Por que o senhor resolveu seguir viagem mesmo com os aviso da marinha em relação ao mar agitado na região?
Quando a gente navega e pega uma de proa, conseguimos suportar um pouco mais. Mas de lado não tem como. A gente não esperava que essa altura de marola fosse nos pegar de lado. Isso complicou nossa navegação. Durante o dia estava tranquilo, tínhamos previsão de chegada à barra às 6h de sexta-feira.
Como o senhor está lidando com a incerteza em relação à localização do navio?
Quando há uma fatalidade, há um acidente e tu viu a pessoa, ela está aqui. O procedimento é fazer o enterro. Pronto, a dor passou. A pior coisa é um sequestro, um sumiço de uma pessoa, porque tu não tem noção do que está acontecendo, se essa pessoa vai aparecer. Então, a gente fica numa apreensão muito grande. Eu não queria nem vir aqui hoje (no porto). A emoção de chegar aqui e não ver (o barco do irmão ancorado). A gente anda sempre junto. Não só porque é meu irmão. Se fosse outro companheiro de trabalho, ele também teria que estar aqui do meu lado, atracado junto, fazendo todos os procedimentos juntos.
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Como é o contato visual de vocês à noite?
Funciona pelo radar e pelas luzes de navegação. Andamos sempre em linha, porque eu faço o comando e ele (Dom Manoel XVI) me acompanha.
O senhor mantém a esperança de encontrar o seu irmão e os tripulantes da embarcação com vida?
Sinceramente, não. A gente tem que ser realista. Milagres acontecem. Só deus, mas é complicado (localizá-los com vida). A gente torce para que isso aconteça. Todos eles para mim são irmãos.