Ele nasceu em Piraju, no interior de São Paulo. Ela em Gaspar, no Vale do Itajaí, em Santa Catarina. Ele é negro. Ela é branca, de uma família de alemães e italianos. O que pode parecer distante, pela geografia e pelo preconceito, foi superado por Raymundo Aparecido Quirino da Silva e Osnilda Benvenutti e se transformou em uma grande – e longa – história de amor.

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Em 1971, a irmã de Osnilda e o marido se mudaram para Piraju. Eles conheceram Raymundo e criaram um laço de amizade que se fortaleceu ao ponto de, em 1975, ele viajar para a Gaspar, a trabalho, e levar notícias à família dos amigos. Assim, viu Osnilda pela primeira vez.

Três anos depois, ela recebeu um convite para se mudar a Piraju, onde estava a irmã. A oportunidade de um trabalho foi o que motivou a ida da jovem ao Sudoeste de São Paulo. Raymundo, ao conhecê-la melhor, demonstrou interesse. A garota gasparense acabou cedendo aos encantos – não antes de perguntar aos pais se poderia namorá-lo.

– Fui mais difícil, né? Uma vez ele veio, botou a mão no meu ombro, e eu tirei. Mas ele sempre foi tão gentil comigo, carinhoso, chegava com um presentinho, aí foi indo e acabei cedendo. Pensei “não vou deixar ele escapar, não” – recorda Osnilda.

O casal namorou por um ano, até que a mulher teve de voltar a Gaspar, distante 651 quilômetros da cidade onde Raymundo ficaria. Como manter o relacionamento vivo em 1979, tempos sem WhatsApp, Facebook, Instagram? Com cartas, eles decidiram.

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Osnilda e Raymundo trocaram ao menos 30 correspondências em um período de 11 meses. Nelas, falavam sobre saudade, novidades e começaram a planejar o casamento que estava por vir. Os preparativos para o matrimônio foram feitos nas letras escritas em papel.

– Aí quando a gente achava que estava tudo pronto para casar, faltaram alguns documentos. Quando achei a papelada, faltavam três dias para o casamento e não daria mais tempo de enviar pelos Correios. Coloquei meus pais em um Fusquinha 68 que chovia dentro e vim de Piraju pra cá (Gaspar). Saí às três da manhã, chegamos cinco da tarde, mas deu tudo certo – narra Raymundo.

A distância estava superada, o casamento celebrado, mas Osnilda e Raymundo tiveram de passar por cima de outro obstáculo: o preconceito. Ainda hoje, ele aponta para a cor da pele para dizer que era preciso enfrentar algumas "resistências" no Vale do Itajaí.

– Nunca ninguém me falou nada, ninguém me barrou em lugar nenhum, mas eu via nos olhos. Quando saíamos nós dois como um casal multirracial, digamos assim, as pessoas ficavam olhando, cochichando – explica Raymundo.

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Osnilda completa:

– Mas nunca nos incomodamos. A gente sabia que ia ser assim. Uma hora todos teriam que entender que não é a cor, e sim a pessoa.

O respeito é um dos pilares que sustenta o casal, que teve duas filhas e hoje tem três netos. Ao lado dele, estão companheirismo, comprometimento e paciência. Foi assim que atravessaram quatro décadas.