Em um dia de indicadores econômicos mais negativos do que positivos, uma pesquisa que mostrou queda na popularidade do governo Dilma Rousseff levou investidores a fazer apostas no mercado financeiro. Puxada pelas estatais, a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) subiu 3,5%, enquanto o dólar recuou para o menor nível desde 18 de novembro, sinal de que o mercado entrou em período de especulação eleitoral.
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A maior alta diária desde setembro do ano passado ocorreu no dia em que o Banco Central divulgou expectativas de crescimento mais baixo – de 2,3% para 2% – e inflação maior – de 5,6% para 6,1% – assim como menor economia para pagar as contas do governo. Além disso, a divulgação de pesquisa CNI/Ibope mostrou que a avaliação positiva do governo Dilma caiu de 43% para 36%. Conforme William Castro Alves, analista da XP Investimentos, investidores interpretaram o resultado como sinal de fragilidade do governo para as eleições:
– Aumenta a possibilidade da situação não sair vitoriosa em outubro. Investidores avaliam que pode ser sinal de mudança no cenário econômico do país, que é esperada pelo mercado.
A atuação do governo é criticada por investidores e empresários em razão de interferência em setores como elétrico e financeiro, avalia Pedro Galdi, analista da SLW. Esse descontentamento se estende à gestão de estatais: para segurar a inflação, o governo tem limitado reajustes no preço da gasolina, o que reduz o lucro da Petrobras, empresa mais negociada na bolsa brasileira, e o ganho do acionista.
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O Ibovespa, principal indicador da bolsa, subiu 10% desde o último dia 17 – três dias depois de ter caído ao menor nível em cinco anos. A alta coincidiu com novidades pouco favoráveis à economia brasileira – insegurança no abastecimento de energia, rebaixamento na avaliação de risco pela Standard & Poor’s e escândalos envolvendo a Petrobras. Na semana passada, diante de um boato não confirmado de queda de Dilma em pesquisas eleitorais, a bolsa também havia reagido com movimento de alta.
– Muitas das más notícias já eram aguardadas pelo mercado. O que investidores esperam é que a exposição da Petrobras e a perda de popularidade do governo levem a mudanças na política econômica e na gestão de estatais – analisa Gustav Gorski, economista-chefe da Quantitas.
O que fez a bolsa subir
Cenário eleitoral – A reclamação comum é com relação à política econômica do governo, especialmente a interferência na Petrobras e em setores como bancário e elétrico, que se reflete em desvalorização das estatais na bolsa. A pesquisa que apontou queda na popularidade de Dilma foi recebida com otimismo por sinalizar possível mudança na gestão.
Crise na Rússia – A instabilidade causada pela anexação da Crimeia à Rússia leva investidores a tirar dinheiro de papéis mais arriscados da Europa e procurar opções no Brasil.
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Denúncias na Petrobras – Com a exposição de possíveis irregularidades na estatal e a possibilidade de criação de uma CPI, investidores esperam mudança na condução dos negócios da empresa e na política de preços de combustíveis.
Mercado “anestesiado” – Notícias sobre inflação acima do centro da meta, ano com perspectiva de baixo crescimento e crise na Petrobras já estariam “precificadas” pelo mercado – ou seja, o valor da ações já caiu o que deveria em razão desses indicadores.
Quem está movendo o mercado
Investidores estrangeiros – Afastados de outros mercados emergentes, têm oportunidade de fazer apostas de curto prazo.
Grandes fundos – Aproveitam a queda da bolsa no início do ano para comprar papéis mais baratos.
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Especuladores – Têm interesse em lucrar no curto prazo e, por isso, enxergam a investigação na Petrobras e a queda da popularidade do governo Dilma Rousseff como sinais de que a gestão das estatais e a política econômica possa mudar, o que pode levar o preço das ações a subir.
Estrangeiros retomam negócios na Bovespa
A disparada na Bovespa nos últimos dias é fruto da entrada de mais dinheiro do Exterior no país e da atuação de investidores que buscam oportunidades diárias de ganho, chamados de especuladores no jargão do mercado.
Em março, a participação dos estrangeiros em negócios da bolsa chegou a 51,6%, maior índice nos últimos quatro anos. No mês anterior, estava em 50,4%. Segundo o analista da SLW Pedro Galdi, essa entrada se deve à projeção de mudança no governo e à fuga de mercados mais instáveis atualmente, como a Rússia.
– A economia mundial começou a melhorar, e existe essa expectativa de uma virada na economia brasileira. Isso estimula investidores a buscarem opções mais rentáveis – detalha Galdi.
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São de estatais as ações que têm puxado o Ibovespa – parte dos investidores espera que a administração atual ou a futura deixe de usar essas empresas como instrumento para segurar a inflação ou reforçar políticas de governo, como ocorre com Petrobras, Eletrobras e Banco do Brasil, explica Galdi.
O atual movimento de alta nas ações de empresas estatais não indica percepção de melhora nos fundamentos econômicos do país – como controle fiscal e cumprimento das metas de inflação – ou indícios de melhor gestão nas companhias como Petrobras, reitera Marco Antonio dos Santos Martins, presidente da Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais na Região Sul (Apimec-Sul).
– Os especuladores são os primeiros a assumir o risco. Depois é que ocorre uma análise mais criteriosa dos fundamentos econômicos. E nesse aspecto, o país e as estatais continuam muito deteriorados – avalia Martins.