Redução de isenções fiscais, crescimento do desemprego, embargos à carne catarinense e aumento das despesas do poder público sem a arrecadação acompanhar o mesmo ritmo estão entre os principais desafios para o próximo governador de Santa Catarina. Embora menos intensa do que no país, a crise econômica também atingiu os indicadores catarinenses nos últimos cinco anos e, segundo especialistas, será preciso controlar melhor os gastos e aprovar reformas para voltar a patamares pré-recessão.
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Para se ter uma ideia da situação que o vencedor das eleições enfrentará a partir de 2019, a taxa de desocupação disparou de 2,7%, no segundo trimestre de 2014, para 6,5% neste ano, alta que representa 150 mil pessoas a mais sem trabalho (veja no gráfico abaixo). O Produto Interno Bruto (PIB), que mede a riqueza gerada no país, teve a primeira queda em Santa Catarina na última década: recuou 4,2% em 2015, último dado disponível pelo IBGE.
A previsão é de mais números negativos.
O Índice de Atividade Econômica (IBCR-SC), calculado pelo Banco Central e considerado uma prévia do PIB, registrou retração de 3,2% em 2016.
Somadas a essas estatísticas, um dos setores mais importantes do Estado, o agronegócio, foi atingido por uma turbulência nos últimos dois anos ao ser alvo da Operação Carne Fraca e de embargos de países importadores. A ação da Polícia Federal deflagrada em março de 2017 apurou irregularidades no setor de frigoríficos e colocou em xeque a qualidade da carne do país e de Santa Catarina, que responde pela metade dos embarques de proteína suína ao exterior.
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Fatores que impactaram grandes empresas do estado
Em seu último balanço, a BRF registrou prejuízo líquido de R$ 1,57 bilhão no trimestre, seguida pela JBS, que terminou o período com rombo de R$ 911 milhões.
O resultado também é reflexo da paralisação dos caminhoneiros em maio. Considerando os dados de 2015 (últimos estaduais), SC alcançou PIB de R$ 249 bilhões, sendo R$ 72 bilhões somente do agronegócio.
Para o diretor-executivo do Sindicato de Carne e Derivados de Santa Catarina (Sindicarnes), Ricardo Gouvêa, é necessário que o próximo governador trabalhe em dois pontos: amplie a competitividade catarinense ao reduzir os custos de insumos e melhore a infraestrutura para escoar a produção. Sem isso, aponta, o cenário continuará penoso.
– A agroindústria vai muito além da geração de emprego. Ela envolve outros setores como o comércio e o transporte – acrescenta.
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O professor da Fundação Getulio Vargas (FGV) Sérgio Luiz de Moraes Pinto, especialista em administração pública, explica que mesmo Estados razoavelmente equilibrados como Santa Catarina tiveram aumento de despesas nos últimos anos.
O problema é que a arrecadação não acompanhou o ritmo desse crescimento.
– Se o governador que entrar disser “não vou mais contratar ninguém” e zerar os aumentos, as despesas com pessoal continuarão subindo, porque há um plano de carreira. Conforme passam os anos, a pessoa tem direito a reajuste. No outro prato da balança, estamos com a economia ainda recessiva. Se o PIB não cresce, a arrecadação também não – explica.
Além disso, acrescenta, as demandas da sociedade em outras áreas, como segurança e saúde, também pressionam as contas. De acordo com Moraes Pinto, o principal desafio do próximo governo é o equilíbrio fiscal:
– É preciso fazer uma série de planos, privatizar algumas empresas públicas, tentar tornar a arrecadação mais eficiente, diminuindo uma eventual sonegação que possa existir em alguns pontos, e tentar economizar com as despesas obrigatórias. É inegável que existe ineficiência dentro do setor público. Então, é preciso reduzir a folha de pagamento, os gastos com prédios alugados e que não são utilizados, por exemplo.
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OBSTÁCULOS PELA FRENTE
QUALIFICAÇÃO E INCENTIVO PARA REDUZIR O DESEMPREGO
Embora tenha a menor taxa de desemprego do país, Santa Catarina registrou aumento de 132% no número de desocupados no comparativo entre o segundo trimestre de 2014 e o mesmo período deste ano. Ou seja, 150 mil pessoas deixaram o mercado de trabalho.
A redução da renda das famílias reflete no aumento das despesas do governo, segundo o professor da Fundação Getulio Vargas Sérgio Luiz de Moraes Pinto. Por exemplo, muitas pessoas que tinham plano de saúde tiveram que voltar ao SUS, o que elevou os gastos na área.
Para o economista e professor da Univali Eduardo Guerini, é preciso políticas de estímulo à industrialização e investimentos em infraestrutura para Santa Catarina voltar a patamares mais positivos. Porém, aponta, o crescimento da economia do país está bastante lento e afeta o desempenho catarinense.
– O Estado não tem capacidade de investimento, não tem feito obras públicas, empreendimentos que vão ser geradores de emprego. Falta prospecção com relação ao cenário futuro – diz.
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O economista acrescenta que incentivos fiscais são necessários às empresas, mas pondera que a administração pública inverteu o sentido dos subsídios: isentou grandes indústrias, enquanto muitos setores que geram muitos empregos, como o comércio e a agroindústria, passam por dificuldades. Na visão do professor, o próximo governador terá que articular com o Legislativo para aumentar as políticas de financiamento, incentivar a qualificação profissional e melhorar a logística, buscando recursos federais para gargalos como a BR-470.
A taxa de subutilização da força de trabalho, que mede as pessoas subocupadas por insuficiência de horas trabalhadas, também aumentou no Estado, saltando de 5,1%, em 2014, para 10,9% neste ano – alta de 113%.
EXPORTAÇÃO E AGRONEGÓCIO
Santa Catarina começou a retomar os resultados positivos nas exportações nos últimos dois anos, mas os indicadores ainda estão longe dos períodos pré-crise. Depois de duas quedas consecutivas nas comparações interanuais (de -9,5% em maio e -0,8% em junho), o faturamento dos embarques ao exterior subiu 26,9% em julho.
Porém, no comparativo do acumulado deste ano com os sete meses de 2017, o crescimento ainda é modesto (3,32%) e está atrás da média nacional para o período, de 7,9%.
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O déficit da balança comercial de Santa Catarina (quando as empresas catarinenses compram mais de outros países do que vendem) atinge US$ 3,6 bilhões.
Porém, o principal problema hoje na balança comercial são os embargos de outros países à carne brasileira. Por conta disso, as gigantes do setor tiveram que colocar os produtos no país, o que foi bom para o consumidor, que observou o preço diminuir, mas foi ruim para os trabalhadores do campo, que tiveram que ficar parados por meses.
Segundo a presidente da Câmara de Comércio Exterior da Federação das Indústrias de Santa Catarina (Fiesc), Maria Teresa Bustamante, a suspensão da importação exige sincronização entre o governo e o setor empresarial, que devem atuar com as autoridades federais para manter um canal aberto com o mercado estrangeiro:
– É necessário criar programas de benefícios fiscais na cadeia produtora, ser amigável aos investimentos voltados a alavancar a abertura de mercados, alinhar com as entidades empresariais efetivo engajamento em abertura de mercados externos e defesa de políticas públicas para o comércio internacional, além de oferecer medidas para solucionar a falta de logística.
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RENÚNCIA FISCAL
Considerada por entidades como fator importante para a competitividade, mas questionada por especialistas em administração pública, a isenção fiscal faz com que o Estado deixe de arrecadar cerca de R$ 5,8 bilhões neste ano. No início do mês, o governador Eduardo Pinho Moreira (MDB) sancionou a lei que estipula um teto para o benefício. Até 2022, o governo só poderá renunciar até 16% da arrecadação em impostos estaduais (IPVA, ICMS, ITCMD), e não mais 25%. O corte representa cerca de R$ 1,8 bilhão.
Para o professor de Economia da Esag/Udesc Arlindo Rocha, o próximo governador terá que analisar os critérios para não retirar o subsídio de setores que precisam. Caso contrário, aponta, pode haver demissões em massa. Rocha pondera que não é papel do governo subsidiar empresas, mas fomentar programas de produtividade e inovação.
DESPESAS E ARRECADAÇÃO
Indicador que representa todas as riquezas do Estado, o PIB caiu pela primeira vez nesta década, em 2015, e mostrou que SC não estava longe dos respingos da recessão econômica do país. Para retomar o crescimento dos níveis pré-crise, os setores terão que produzir e vender mais. Por outro lado, a retomada da economia mais lenta afeta o desempenho.
Professor da FGV, Sérgio Luiz de Moraes Pinto explica que esse indicador reflete na arrecadação do Estado: quanto menor, menos dinheiro entra no caixa.
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– A redução acarreta na disponibilidade de recursos para investimentos. Você tem a despesa obrigatória e a discricionária, que são os investimentos. A hora que você não consegue arrecadar mais e tem aumento de gastos, como folha de pagamento e aposentadoria, terá de cortar as discricionárias. Em 2022, se não houver reformas, os cofres estarão 100% (restritos) às obrigatórias – conclui.
Segundo ele, a saída é reduzir o tamanho do Estado, cortando despesas desnecessárias, e é importante a aprovação de reformas, como a da Previdência.