Poucos conseguem falar da evolução da Oktoberfest Blumenau com tanto conhecimento quanto Valdecir Ciro Fernandes. Não que ele seja historiador ou coisa parecida, mas o homem participa intensamente da festa desde a primeira edição, em 1984. No começo, era um dos policiais militares que atuava no evento. Na sequência, tornou-se o supervisor da equipe terceirizada de segurança. Quarenta anos depois, Ciro, como é conhecido por todos, segue firme e forte na missão.
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Confira tudo sobre a Oktoberfest Blumenau 2024
Na certidão de nascimento, ele é de Itajaí. Na prática, veio para Blumenau tão pequeno que pode se considerar blumenauense. Aos 63 anos, sempre morou na terra da Oktoberfest. Tinha apenas 18 quando entrou para a Polícia Militar, no começo dos anos 1980. Em 1983 e 1984, passou dias consecutivos dentro da água para ajudar no resgate de dezenas de pessoas durante as enchentes que castigaram a região.
Com o surgimento da Oktoberfest, passou a fazer rondas e combater os crimes comuns em grandes eventos ao lado dos colegas. Ao olhar para trás, entretanto, não sente tanta saudade daquelas primeiras edições:
— Agora tem muita tecnologia, está muito bom para trabalhar. O conforto e segurança não têm comparação. Antigamente a gente chegava a colocar 30, 40 pessoas para fora em uma noite, hoje quase não se vê briga — avalia.
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Quem são as rainhas da Oktoberfest Blumenau desde a primeira edição; FOTOS
O fato é que a Blumenau dos anos 1980 e 1990 era outra. Com menos infraestrutura e controle que atualmente, casos de roubos, furtos e até violência sexual eram registrados pelas forças de segurança, recorda o ex-policial. Ciro lembra dos ônibus lotados de turistas que vinham apenas pela bagunça, protagonizando inclusive episódios de vandalismo.
Sem controle de público e acesso, naquele início da história da festa a região da Vila Germânica ficava tão lotada que era uma maratona para conseguir pegar um chope ou prato típico, descreve. Muitas mulheres não se sentiam seguras e quase não se via crianças na Oktoberfest justamente pelo perfil dos frequentadores. Um cenário muito diferente dos últimos anos. Uma pesquisa inédita do projeto Focus da Furb mostrou que 81% das entrevistadas em 2024 disseram se sentir respeitadas no ambiente da Oktoberfest sempre ou na maior parte do tempo.
— Teve uma vez que eu coloquei a cavalaria para separar briga dentro do pavilhão. Hoje você vê casais com bebês no carrinho circulando pela festa, é um evento familiar, com pessoas educadas — comenta o supervisor.
Enquanto a Oktoberfest ia se transformando em uma das festas mais organizadas e seguras do país, Ciro também foi evoluindo. Casou-se três vezes, teve a única filha, um neto, passou a participar do CTG e orgulha-se de se considerar um tradicionalista. Isso explica um pouco o porquê de nunca ter deixado de trabalhar na Oktoberfest.
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— Eu gosto. Simples assim. Já desfilei, fiz amizades no trabalho, conheço todo mundo e todo mundo me conhece. O dinheiro é bom também, não dá para reclamar.
A Oktoberfest ajuda a renda não só de Ciro, mas de outros 6 mil colaboradores que atuam temporariamente na Vila Germânica nos 19 dias de folia, segundo dados da organização. A festa movimenta R$ 350 milhões na economia local, sustenta ainda a prefeitura. No período, profissionais recebem treinamento para as diferentes funções que são necessárias no evento. Essa etapa, no entanto, Ciro pode pular.
Sabe o que fazer de cor e salteado. Afinal, quatro décadas não são quatro dias…
— Meus colegas sempre falam: “Você não disse que seria o último ano?”. Eu já pensei em parar, mas não me deixam, todo ano me chamam — revela em tom divertido.
O conhecimento é tanto que ele quase foi a São Paulo ajudar na estruturação das equipes de segurança quando a Oktoberfest paulista nasceu. No ano passado, enquanto enfrentava um câncer de intestino, liderou um grupo menor na festa em Blumenau, mas trabalhou. Precisou faltar dois dias por conta da reação da quimioterapia, mas não se abalou. Neste ano, já curado, está sendo visto de novo na Vila Germânica “pra lá e pra cá”.
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A hora que deixar o posto na empresa terceirizada responsável pela segurança da festa em Blumenau será um episódio importante, mas não o fim da relação. Ciro é também um frequentador da Oktoberfest. Junto com a esposa — que trabalha no monitoramento das câmeras espalhadas pelos pavilhões — pretende seguir observando as “repaginadas” do evento tantos anos quanto for possível.
Veja fotos do primeiro desfile da festa de 2024
Imagens de Patrick Rodrigues.