O diario.com.br adianta o editorial que os jornais da RBS publicarão no próximo domingo para que os leitores possam manifestar concordância ou discordância em relação aos argumentos apresentados.

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O TERROR E AS LIBERDADES

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Duas frases convergiram para elaborar a síntese dos sentimentos acionados pelos atentados terroristas de 11 de setembro de 2001. O prefeito de Nova York, Rudolph Giuliani, considerado o grande personagem da reação à barbárie, afirmou no mesmo dia em que morreram quase 3 mil pessoas: “Este país nunca mais será o mesmo”.

A revista britânica The Economist estampou o assombro na capa: “O dia em que o mundo mudou”. Os Estados Unidos e o mundo tiveram 10 anos, desde a mais covarde e avassaladora ação do terror, para perceber como o 11 de Setembro mexeu com as mentes de todos os que, pela primeira vez na História, puderam acompanhar ao vivo uma tragédia capaz de provocar comoção universal imediata. O balanço das mudanças não é alentador.

O terrorismo ainda é uma ameaça. E todas as tentativas feitas para tornar a vida mais segura não ofereceram, como contrapartida da caçada aos extremistas, nenhum sinal de que o mundo esteja a caminho da mais tênue pacificação. Os sentimentos mobilizados há uma década revelam agora suas frustrações.

Um bom termômetro dessa percepção de desesperança foi exposto por uma pesquisa realizada pelo Public Religion Research Institute, de Washington, que ouviu 2.450 americanos em agosto. Sete em cada 10 entrevistados disseram que os EUA são hoje menos respeitados no resto do mundo e 77% afirmaram ter menos liberdades pessoais. Mesmo assim, mais da metade se sente mais segura do que antes do 11 de Setembro.

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A guerra ao terror acionou outros sentimentos mundiais, e não só americanos. O apoio à reação militar que promoveu a invasão do Afeganistão teve, apenas dois anos depois, a companhia da dúvida, quando da intervenção no Iraque.

A exacerbação da opção bélica passou a ser uma estratégia no mínimo questionável. As duas guerras mataram milhares de soldados de várias nações e massacraram populações civis. Produziram para os EUA um gasto militar de mais de US$ 5 trilhões. Contribuíram para ampliar a visão distorcida que relaciona o islamismo ao terrorismo e, na mesma medida, incitaram outra distorção, representada pelo antiamericanismo.

O combate ao terror acabou por livrar o mundo de Bin Laden, mas não promoveu avanços civilizatórios significativos no Afeganistão e no Iraque e confrontou os Estados Unidos com um paradoxo.

O país da democracia exemplar suprimiu direitos, criou leis de exceção, afrontou normas internacionais ao torturar prisioneiros mantidos sem julgamento e, como reafirmam agora os próprios americanos, subtraiu liberdades. Este é um dos mais danosos custos, em tempos de guerra ou de paz.

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Como observa o sociólogo polonês Zygmunt Bauman, um dos grandes intérpretes da conturbação mundial, segurança e liberdade são os valores essenciais da humanidade. O desafio, diz o pensador, é fazer com que ambas não se excluam e convirjam sem conflitos. Nesse sentido, a missão dos Estados Unidos e dos aliados na guerra ao terror ainda é incompleta.

As liberdades, manifestadas nos mais banais atos cotidianos, são conquistas universais, e as restrições impostas a americanos ou a estrangeiros acabaram por endossar, pela contradição, muito do que é condenado nas ideologias que continuam movendo bárbaros como os do 11 de Setembro.

A civilização – aqui compreendidos todos os povos comprometidos com conceitos básicos universais de democracia – continua sob o desafio de garantir segurança com liberdade, por mais utópico que isso pareça, ou estaremos cada vez mais distantes de pacificar nossos próprios dilemas.