O Diário Catarinense adianta o editorial que os jornais da RBS publicarão no próximo domingo para que os leitores possam manifestar concordância ou discordância em relação aos argumentos apresentados. Participações enviadas até as 18h de sexta-feira serão selecionados para publicação na edição impressa.

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POR UM PUNHADO DE SEGUNDOS

Alianças esdrúxulas entre antigos adversários com vistas à obtenção de segundos a mais no horário eleitoral obrigatório de TV e rádio têm marcado a largada da campanha para as prefeituras. O episódio mais notório foi o da aliança entre o PT de Luiz Inácio Lula da Silva e o PP de Paulo Maluf, em São Paulo, mas há outros exemplos igualmente constrangedores.

No outro lado da trincheira, na mesma São Paulo, o PSDB de José Serra se une ao PR de Valdemar Costa Neto, envolvido no mensalão; em Porto Alegre, o PDT de José Fortunati dá as mãos ao DEM de Onyx Lorenzoni; em Florianópolis, o PC do B de Angela Albino discute coligação com o PSDB. Não há inocentes nesse vale-tudo pela obtenção de uma fatia maior no cada vez mais desacreditado palanque compulsório dos meios eletrônicos.

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A tendência a juntar alhos com bugalhos, ao arrepio de identidades programáticas e afinidades de ontem e anteontem, é uma característica inconfundível da política brasileira pós-1985. Uma tradição de patrimonialismo e clientelismo combinada com longos períodos de autoritarismo resultaram em uma vida político-partidária no mais das vezes vazia e sem marcas da coerência.

Isso é potencializado pela legislação em vigor, que contém um anabolizante poderoso e ao mesmo tempo nocivo à saúde partidária: o fatiamento de espaços na TV e no rádio, num programa cada vez menos capaz de atrair a atenção dos telespectadores para as grandes questões da vida nacional, aliás ausentes da maior parte da programação dos partidos. Compulsório, com regramento cada vez mais frouxo e sem conexão com a realidade da maioria dos brasileiros, o horário gratuito na TV e no rádio se transformou no sucedâneo de um programa humorístico de baixa qualidade, ao qual não faltam bordões, claques e performances de gosto duvidoso.

Não há receitas prontas para corrigir os rumos equivocados do sistema partidário brasileiro. Um caminho pode ser partir de uma pergunta singela: para que serve um partido político? Parece óbvio que essas agremiações destinam-se a representar, nas distintas instâncias da esfera pública, correntes de opinião existentes na sociedade. A ideia de que um partido possa representar interesses particulares ou particularistas é uma contradição em termos, a negação da política e do ideal republicano, cuja denominação é uma referência à expressão latina res publica (coisa pública).

O que se espera das siglas registradas junto à Justiça Eleitoral é que escolham entre assumir uma identidade política e programática e agir em consonância com a mesma ou renunciar à autonomia para não enganar o eleitorado. Essa deve ser uma exigência da sempre adiada reforma política e partidária, que se torna cada vez mais urgente no Brasil.

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