O diario.com.br adianta o editorial que os jornais da RBS publicarão no próximo domingo para que os leitores possam manifestar concordância ou discordância em relação aos argumentos apresentados.
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O BRASIL DAS DIFERENÇAS
As teorias conspiratórias desenvolvidas pelo autor do massacre na Noruega denunciam uma mente doentia, mas não expressam uma voz solitária, principalmente quando enxergam no multiculturalismo os problemas do mundo. Em textos na internet, Anders Behring Breivik referiu-se especificamente ao Brasil como um exemplo de nação que não teria dado certo por causa da mistura de raças e culturas. O norueguês é a expressão de uma tendência que prospera em países do Primeiro Mundo. Seus seguidores, em maioria, inspiram-se na xenofobia e na aversão à diversidade que levaram Hitler a executar o mais brutal massacre étnico da História, com o extermínio de milhões de judeus no Holocausto. Tais grupos, como os nazistas apegados à ideia da raça pura, refletem uma patologia e também um projeto político articulado, que se normatiza em partidos e tem líderes bem identificados. Pois todos são aberrações da História. A multiplicidade de etnias confirma-se, no caso brasileiro e da grande maioria das nações que a acolhem, entre as quais a Noruega, como uma virtude e não como um defeito. É assim, múltiplo, diversificado, que o Brasil dá certo, sim, como nação pacífica, solidária e voltada para a prosperidade.
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É nesse contexto que as diferenças, em todas as suas manifestações, na política, na economia, nas artes, se reafirmam como valores da democracia. Mas ainda causam, mesmo dentro do Brasil, certo desconforto. Somos desafiados a aprender a respeitar a multiplicidade étnica e cultural que nos identifica. O recente estudo do IBGE Características Étnico-Raciais da População, que aborda a percepção dos brasileiros sobre as classificações de cor e de raça, mostra que para 63,7% dos entrevistados esses dois aspectos influenciam na vida das pessoas, no trabalho, no convívio social.
É interessante observar que o IBGE recorreu ao conceito de raça humana, há muito questionado pela ciência social e pela biologia, para poder avaliar as reações dos pesquisados diante do próprio conceito. O estudo mostra como o brasileiro se vê e como percebe que é visto pelos outros e conclui: as pessoas têm sua condição avaliada, de forma positiva ou negativa, de acordo com a cor ou a raça. O levantamento ratifica outros estudos, como uma amostragem do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada segundo a qual negros e pardos são discriminados até mesmo nas cirurgias de transplantes de órgãos como coração, fígado, rim, pâncreas e pulmão. E negros e pardos são pela primeira vez, desde o Censo de 2010, a maioria dos brasileiros, com 52,27% da população. Raça e cor não deveriam ser preponderantes para determinar as relações humanas, muito menos num país em que a miscigenação é exaltada como identificadora da nação por clássicos da sociologia, como Casa-Grande e Senzala, de Gilberto Freyre. Não reconhecer diferenças é negar o que somos desde nossas múltiplas origens. A missão de contribuir para essa compreensão é da cidadania e principalmente da área educacional. Em quaisquer circunstâncias _ e de forma especial na escola, onde se formam muitos conceitos e também preconceitos _, cor e raça não podem ser indicativos discriminatórios de indivíduos ou de categorias sociais, mas essências de nossas identidades.