O desafio do Parlamento é encontrar um caminho que ajude a prevenir a violência e proteger os cidadãos, sem cassar-lhes direitos e liberdades individuais.

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Cresce a pressão sobre o Congresso Nacional para que aprove legislação restritiva ao uso de máscaras em manifestações públicas, posição defendida pelas forças de segurança para melhor prevenir e reprimir atos de vandalismo praticados por encapuzados. Embora a Constituição brasileira deixe margem para a regulamentação ao definir no inciso IV do artigo 5o que “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”, há sérias controvérsias a respeito do assunto, inclusive por parte de legisladores e constitucionalistas. Argumentam os opositores que o projeto fere a liberdade de expressão e abre caminho para o autoritarismo por parte de governos e corporações policiais.

O desafio do Parlamento é exatamente este: encontrar um caminho que ajude a prevenir a violência e proteger os cidadãos, sem cassar-lhes direitos e liberdades individuais. Porém, como ocorre nas principais sociedades democráticas, alguma concessão individual se pode fazer em nome da segurança coletiva. É o caso, por exemplo, das câmeras de vigilância atualmente instaladas em espaços públicos e privados das grandes cidades. Se elas existem para identificar e inibir os delinquentes, parece um contrassenso permitir que potenciais depredadores possam usar máscaras exatamente para não serem identificados.

Evidentemente, ninguém pode ser incriminado preventivamente, apenas pela presunção de que vai praticar algum crime. Mas também é incompreensível que alguém precise esconder o rosto para participar de uma manifestação ordeira e pacífica, a não ser em casos específicos de representação simbólica. Considerando-se o retrospecto recente dos grupos mascarados em protestos violentos, a prevenção se torna necessária. Países reconhecidamente democráticos como o Canadá, os Estados Unidos e a França possuem legislação que proíbe o uso de máscaras em manifestações e passeatas. Evidentemente, a lei precisa ser bem específica, para não chancelar abusos contra as liberdades civis. Trata-se de uma situação excepcional, gerada pela atuação e pelo crescimento dos chamados black-blocs. Deve funcionar mais como um recurso inibitório do que propriamente como incriminação.

O simples fato de colocar máscara não pode ser interpretado como crime. Mas o cidadão que escolher esta atitude tem que saber que pode ser interpelado pela polícia e ter de retirá-la e mostrar o rosto, assim como é legítimo que os policiais exijam documentos de identificação de suspeitos ou que agentes de trânsito exijam carteira de habilitação de motoristas.

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O desafio, portanto, está posto e o Legislativo precisa enfrentá-lo logo.

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