Aguardada com expectativa, pelo seu potencial de contribuição para o aperfeiçoamento da democracia, a reforma política vai aos poucos se transformando numa ação em causa própria dos parlamentares encarregados de levar o debate adiante. Primeiro, o texto do relator Vicente Cândido (PT-SP) incluiu artigo vetando a prisão de candidatos por um período de oito meses até a eleição – razão pela qual a tentativa vem sendo chamada de “Emenda Lula”. Agora, com o apoio de pelo menos uma dezena de siglas, a reforma se inclina pelo sistema eleitoral conhecido como “distritão”, que, na prática, funcionaria como proteção para políticos hoje ameaçados pela Lava-Jato de ir para a cadeia. O país precisa de mudanças que contribuam para fortalecer a democracia, não de casuísmos destinados a proteger políticos em apuros.

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Nos acordos de bastidores, parlamentares do PMDB, do PSDB e de vários partidos do Centrão têm se dividido apenas quanto ao fato de a inovação ser implantada de forma definitiva ou apenas temporária, como caminho para o voto distrital misto – no qual metade dos legisladores é escolhida em uma lista partidária, e o restante, de forma majoritária. A mudança, a ser analisada depois do recesso, alteraria o sistema proporcional, hoje em vigor, no qual são eleitos os mais lembrados nas urnas dentro de cada sigla. Pelo modelo em debate, saem vencedores os mais votados, independentemente do apoio das legendas.

Em consequência, a tentativa de preservar com imunidade quem hoje tem mandato – e, portanto, mais visibilidade, além do apoio da máquina administrativa – tende a enfraquecer ainda mais os partidos. Vai, portanto, na contramão do que se deveria esperar de uma reforma. Se for adiante, deve favorecer a permanência dos atuais parlamentares. Além disso, beneficia as chamadas “celebridades”, dificultando uma renovação na política baseada na defesa de princípios programáticos.

Há pouco, os brasileiros assistiram a um descabido esforço da Câmara de ressuscitar uma anistia a parlamentares envolvidos com dinheiro de caixa 2. As tentativas de alterações em defesa de interesses próprios não devem parar por aí. Só uma pressão continuada pode impedir que as aguardadas mudanças na área política acabem se restringindo à preservação de parlamentares encrencados no âmbito da Lava-Jato.

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