O Diário Catarinense adianta o editorial que publicará no próximo domingo para que os leitores possam manifestar concordância ou discordância em relação aos argumentos apresentados. Participações enviadas até as 19h de sexta-feira serão selecionados para publicação na edição impressa. Ao deixar comentário, informe nome e cidade.

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INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA

Aprovado em dezembro último pela Comissão Especial do Sistema Nacional de Políticas sobre Drogas, um projeto do deputado gaúcho Osmar Terra promete se transformar na primeira grande polêmica deste ano no Congresso Nacional. A matéria prevê penas mais duras contra traficantes, internação compulsória para dependentes e criação de uma rede de comunidades terapêuticas sob responsabilidade do poder público, para tratamento de longa duração.

O texto, que também cria um sistema de informações de abrangência nacional, não revoga a legislação atual, mas acrescenta 33 novos dispositivos à Lei de Drogas e à lei que trata da proteção e dos direitos de pessoas com transtornos mentais. Mas o foco do debate será, sem dúvida, a internação sem o consentimento do paciente – tema que divide até mesmo especialistas experimentados. Caberá ao plenário da Câmara examinar o assunto no reinício do ano legislativo.

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Considerando-se a degradação social causada pelas drogas pesadas, especialmente pelo crack, não há dúvida de que a iniciativa parlamentar merece total atenção. O país tem urgência em encontrar novas soluções para essa epidemia que infecta a juventude, destrói famílias e estimula a criminalidade. Então, a questão do combate ao tráfico é pacífica.

O questionável é o tratamento que deve ser dispensado aos usuários e aos dependentes. A legislação atual já contempla a internação compulsória, além da voluntária (quando o paciente aceita o tratamento) e da involuntária (quando o viciado oferece riscos à sociedade ou a si mesmo). Todas, porém, dependem de autorização judicial. O que pode mudar agora é a transformação dessas alternativas em política pública, o que, em alguns casos, dispensaria a intervenção judicial.

Antes de se dar tal poder ao Estado e aos agentes públicos, porém, é imprescindível oferecer à sociedade todas as garantias de que haverá uma rede de atendimento comprovadamente eficaz e acessível. As pessoas só podem ser internadas contra a sua vontade se forem conduzidas para instalações apropriadas e para um tratamento digno, que efetivamente lhes devolva a oportunidade de se livrar do vício.

Sem esse pré-requisito, a retirada forçada de drogados das ruas será apenas uma faxina social desumana, voltada muito mais para o conforto das pessoas incomodadas e para interesses econômicos do que para a recuperação dos doentes.

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Não se pode ignorar, evidentemente, os danos causados pelos dependentes à sociedade, a começar pela desestruturação familiar. Viciados que agridem parentes, vendem objetos da casa, roubam e cometem outros delitos precisam, sim, de contenção forçada – e para casos assim já existe legislação autorizativa. Incompreensível e inaceitável é a abordagem higienista, cujo propósito prioritário é retirar drogados da via pública mesmo que seja para submetê-los a constrangimentos e a tratamento desumano.

A internação compulsória, portanto, só terá sentido quando houver clínicas gratuitas e eficazes, que permitam ao paciente manter seus vínculos familiares e comunitários. Antes disso, é preciso investir mais na prevenção.