O diario.com.br adianta o editorial que publicará no próximo domingo para que os leitores possam manifestar concordância ou discordância em relação aos argumentos apresentados. Comentários enviados até as 19h de sexta-feira serão selecionados para publicação na edição impressa.

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O SOCORRO DA INTERNAÇÃO

Foi finalmente deflagrado no país o debate sobre a internação compulsória de dependentes de crack. Mesmo que cada caso deva ser avaliado em suas particularidades, que se relativizem as circunstâncias e as realidades dos dependentes e se avaliem os suportes oferecidos para o acolhimento dessas pessoas, é preciso caminhar na direção da aceitação da internação compulsória como medida humanitária.

Situações em que o usuário da droga perdeu totalmente a capacidade de discernimento somente serão enfrentadas dessa forma, respeitando-se a avaliação médica e a opinião das famílias e submetendo-se tais procedimentos à vigilância do Ministério Público.

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São muitos os argumentos pró e contra a internação sem consentimento do usuário, o que produz controvérsias previsíveis quando o assunto tem tal complexidade. Discute-se até mesmo a aparente sutileza semântica entre internação involuntária, solicitada por um terceiro, que pode ser um familiar, e internação compulsória, determinada pela Justiça por interferência, por exemplo, do Ministério Público.

Detalhes jurídicos, que devem ser esclarecidos, e mesmo questões médicas e sociais, que avaliem a real situação de risco do dependente, ainda buscam consensos que somente serão obtidos com o debate, como ocorrerá no dia 1º de dezembro em Porto Alegre, no painel Crack, Internação Compulsória Resolve?, organizado pelo Instituto Crack Nem Pensar.

A exposição de pontos de vista impede a acomodação das autoridades diante de um flagelo que atinge todas as classes sociais, mas é mais impiedoso com os jovens de baixa renda ou com precária estrutura familiar.

Nesse contexto, devem ser respeitadas as naturais reações à internação sem autorização. Essas levam em conta, além de aspectos legais, as falhas de experiências como a do Rio de Janeiro – onde a abordagem de dependentes nas ruas tem sido considerada por alguns setores como arbitrária ou socialmente mal conduzida – e a precariedade da rede de acolhimento.

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Que se revisem as leis, se corrijam as deficiências e o Estado assegure estrutura e suporte técnico necessários, para que os eventuais erros não se apresentem como pretextos desqualificadores de uma ideia em discussão em todo o país e que sensibiliza também o Congresso, onde tramitam projetos com propostas de reformulação da legislação e viabilização das internações sem consentimento.

O argumento mais usual contra a medida se baseia na defesa radical das individualidades ou, num sentido filosófico mais amplo, na chamada autonomia da vontade. Sob esse entendimento, o usuário de drogas, mesmo em risco de vida, é dono absoluto de seus atos e deve ser ouvido para consentir ou não com o tratamento terapêutico.

Na urgência da epidemia do crack, é ilusório pensar que há vontades em dependentes que se degradam nas ruas, devastam famílias e contribuem para o aumento da delinquência e da violência sem o socorro do Estado. A vontade a prevalecer, nesses casos, é a da sociedade e das instituições encarregadas de protegê-los. Se não for assim, todos seremos omissos diante de uma tragédia que há muito destrói jovens nos grandes centros urbanos e se alastra agora em direção a cidades do Interior.