O Diário Catarinense adianta o editorial que publicará na edição impressa para que os leitores possam manifestar concordância ou discordância em relação aos argumentos apresentados. As participações serão selecionadas para publicação no jornal impresso. Ao deixar comentário, informe nome e cidade.

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A LEI DAS MULHERES

Poucos avanços legais merecem o reconhecimento que operadores da Justiça, quadros da segurança, estudiosos da violência doméstica e instituições da sociedade civil expressam à Lei Maria da Penha. É oportuno, no oitavo aniversário da promulgação, que o Ministério Público de São Paulo apresente proposta de aperfeiçoamento, para que a legislação continue avançando. A ideia difundida pelo MP junto ao Congresso sugere que os legisladores incluam no Código Penal a figura do feminicídio, para caracterizar o assassinato de mulheres. Aos que argumentam que já há leis suficientes para punir os criminosos, os articuladores da campanha respondem que, com o acréscimo, a legislação dará maior visibilidade aos crimes, ampliando o alcance das penas e eliminando eventuais impunidades.

É uma iniciativa meritória, mas que ganha forma com certo atraso. Leis criadas especialmente para tratar de agressões domésticas já vigoram em 12 países latino-americanos. Admita-se igualmente que fomos retardatários ao adotar somente no dia 7 de agosto de 2006 uma legislação provocada pela indignação de uma mulher sistematicamente maltratada pelo marido. Com a repercussão do caso da farmacêutica Maria da Penha Maia Fernandes, o Brasil foi alertado para a negligência que vinha sendo cometida pela polícia, pelo Ministério Público, pela Justiça e pela própria sociedade. Maria da Penha sofreu maus tratos por 23 anos. Milhões de brasileiras vêm sendo maltratadas há séculos e continuam, apesar da lei, sendo desrespeitadas.

Estimativas dessa crueldade dão conta de que pelo menos 5 mil mulheres são assassinadas por ano no país pelo marido, namorado ou companheiro. O mais grave é que, em muitos desses casos, há subnotificação, com as mortes sendo atribuídas a outros fatores, em especial nas regiões em que a presença do Estado é quase nula. Estudos e acompanhamentos de quem convive com os conflitos, como policial, assistente social, promotor ou juiz, indicam que número expressivo de mortes poderia ser evitado. A lei ampliou as estruturas da área da segurança e dos juizados especiais, mas foi insuficiente para que se conseguisse o que mais importa, a implementação de ações preventivas.

Amostragens feitas entre 2009 e 2011 oferecem o assustador retrato da violência que a Maria da Penha tenta reprimir. O maior número de vítimas está entre a população pobre e jovem. Das mulheres mortas nesse período, a maioria residia no Nordeste e no Centro-Oeste, 31% estavam na faixa dos 20 aos 29 anos, e 61% eram negras. Denuncia-se assim que a mulher brasileira que mais precisa de proteção é, ao mesmo tempo, a que menos atenção recebe de órgãos competentes e da sociedade, estando ainda mais vulnerável a desrespeito e agressão.

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Há, em cada caso, uma dramática questão humanitária, e no conjunto, um dano social irreparável, principalmente por envolver órfãos e o agravamento da desestruturação familiar. Nesse contexto, a campanha pela adoção da figura jurídica do feminicídio, como tentativa de fortalecimento da proteção efetiva, merece ser avalizada pela sociedade e acolhida sem restrições pelo Congresso.