O Diário Catarinense adianta o editorial que publicará no próximo domingo para que os leitores possam manifestar concordância ou discordância em relação aos argumentos apresentados. Participações enviadas até as 18h de sexta-feira serão selecionados para publicação na edição impressa.
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O ANO DO TABLET
Uma das mais polêmicas novidades deste reinício de ano letivo é o anúncio feito pelo novo ministro da Educação, Aloizio Mercadante, sobre a aquisição pelo governo de 600 mil tablets digitais, ao custo de R$ 180 milhões, que serão distribuídos em 58,7 mil escolas públicas brasileiras localizadas em áreas urbanas que já contam com banda larga. Trata-se, sem dúvida, de um passo importante para a modernização tecnológica do ensino brasileiro, mas que suscita comparações e questionamentos. Faz sentido investir recursos públicos em computadores quando muitas escolas sequer dispõem de água encanada, luz, biblioteca ou ginásio coberto para atividades físicas? Estarão os professores e alunos preparados para utilizar o novo equipamento de forma pedagógica e produtiva? Não se repetirão com os tablets os equívocos cometidos na adoção do programa Um Computador por Aluno, iniciado em 2007, que chegou a distribuir netbooks para escolas que não tinham acesso à rede elétrica, nem à internet? Por fim, o programa dos tablets não será utilizado apenas como demagogia política?
São dúvidas pertinentes e que merecem ser debatidas pela população, por seus representantes políticos e, especialmente, pela comunidade escolar. Ainda assim, entendemos que o investimento será válido se for efetivado sob critérios de total transparência e acompanhado de cuidados, como o treinamento adequado dos professores que receberão o equipamento para que possam utilizá-los pedagogicamente, em benefício da aprendizagem.
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A capacitação dos professores, não apenas para o uso das novas ferramentas tecnológicas, mas também para o ensino tradicional, continua sendo o grande desafio da educação brasileira. Todos conhecemos o círculo vicioso da má qualidade do ensino em nosso país: professores mal formados e mal pagos, alunos desinteressados e indisciplinados, governos impotentes, escolas deficientes, sindicatos retrógrados e, como consequência, últimas colocações nas avaliações internacionais. Este círculo precisa ser rompido neste momento em que o país, impulsionado pela política interna de distribuição de renda, tem a oportunidade de dar um salto de desenvolvimento.
Certamente não será com a simples distribuição de tablets num número insignificante de escolas que o problema estrutural será resolvido. Mas é um pequeno passo no rumo certo. Ainda que o benefício vá atingir uma parcela pequena do universo escolar, a inovação é emblemática, tira o professor da zona de conforto, obriga-o a se atualizar, a se informar sobre novas práticas pedagógicas e até mesmo a compartilhar suas dúvidas com alunos que já nasceram à sombra da era digital.
Ao colocar tablets nas mãos de professores de escolas públicas, o governo rompe barreiras, mas fica também na obrigação de prestar contas à sociedade do que está fazendo para resolver mazelas históricas como a desvalorização dos educadores, o descompromisso das famílias com a educação dos jovens, a inadequação da política educacional e a insuficiência de recursos para uma área que sempre aparece como prioridade nos discursos políticos e recebe pouca atenção na prática administrativa.