Um país em que o setor público está na iminência de uma revisão inédita na meta do déficit de R$ 139 bilhões, fixada para este ano, não poderia abrir mão de uma reforma ampla na Previdência. Ainda assim, depois da votação na Câmara que livrou o presidente Michel Temer de investigação no Supremo Tribunal Federal (STF), o governo federal se encaminha justamente para tomar esse rumo. A aparente vitória política sob o ponto de vista do Planalto teve um custo que vai muito além dos desembolsos com emendas parlamentares e benesses. A conta vai sobrar para todos os brasileiros.

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Assumida como compromisso pelo presidente da República, a reforma da Previdência esbarra em argumentos emocionais, quando deveria ser enfrentada de forma técnica e objetiva. Sem mudanças realmente consistentes e de efeitos imediatos, o país não terá como arcar com o déficit previdenciário resultante da crônica má gestão do sistema e da rapidez das transformações demográficas. Em reunião com a cúpula do Congresso e ministros no fim de semana, o presidente da República manteve o discurso de prioridade às mudanças, mas o conteúdo do projeto vai ficando cada vez mais raso, enquanto a crise se aprofunda. O agravante é que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da reforma da Previdência precisa ser aprovada com os votos de 308 dos 513 deputados federais, total com que o Planalto não conta hoje.

Em entrevista publicada também no fim de semana, o próprio presidente passou a definir as mudanças como ¿atualização¿. Começa a ficar evidente que, se vierem, as alterações serão de faz de conta, como ocorreram em governos anteriores. Isso significa que irão contribuir menos para a redução de um déficit que, já neste ano, deve ter sua meta revista, pela impossibilidade de cumprimento. A troca nos planos acaba servindo para arranhar até a imagem de bons gestores da equipe econômica – hoje, a principal fonte de credibilidade do governo. A própria idade mínima, se mudar, só terá efeitos num futuro remoto. Os desequilíbrios, portanto, devem persistir.

Quem hoje está no Planalto ou no Congresso deveria se preocupar menos com as eleições de 2018 e mais com a sustentabilidade do sistema previdenciário e do setor público em geral. O governo, que até agora procurava compensar a falta de apoio popular com maioria no Legislativo, tem o dever de rearticular sua base, garantindo os votos necessários para levar adiante o texto já aprovado por comissão especial da Câmara.

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