É verdadeiro dizer que Afonso Marques, 33 anos, veste a camisa da empresa. Ele considera a logomarca da Afonso Marques, Reparos e Manutenções, registro que conseguiu como Micro Empreendedor Individual (MEI), um dos símbolos da batalha sobre o cotidiano desafiador das ruas de São José, na Grande Florianópolis. 

Continua depois da publicidade

– Se hoje eu ajudo a levar luz e brilho da pintura à casa dos outros, ontem eu dormia num casarão abandonado sem telhado, com ratos andando ao meu lado, e mato em volta. Hoje sento num sofá descente, muito diferente daquele que encontrei jogado na rua e que improvisei como cama – recorda.

> Receba as principais notícias de Santa Catarina pelo WhatsApp

> De volta pra casa: confira as reportagens da série em página especial

A atenção de Afonso vai além do entorno, do ambiente, do lugar onde mora com a família. Também sentiu a necessidade de melhorar a saúde. Por meio de um amigo chegou numa academia e pediu para treinar Muay Thai.

Continua depois da publicidade

– Pensar que eu cheguei a ficar 12 dias acordado de tanta droga que usava. Quando batia o cansaço, eu arriava no meio fio.

Quantas vezes as pessoas me acordavam dizendo que eu estava atrapalhando a passagem.

Afonso nasceu em Belém do Pará. Na capital paraense ele morava com a mãe, mas gostava de beber com os amigos e vez que outra criava confusão nas festas da comunidade. A violência crescia na periferia e a família preferiu que se mudasse para Santa Catarina. Aqui já moravam alguns conhecidos. 

Em 2012, aproveitando-se de um período de economia em alta no país, desembarcou no Aeroporto Internacional Hercílio Luz na expectativa de uma vida mais regrada. A temporada de verão se aproximava em Florianópolis e Afonso conseguiu emprego num restaurante da Lagoa da Conceição. Na época, o movimento era tanto que o patrão oferecia quartos para os funcionários ficarem por perto. Foi quando conheceu a esposa, também paraense. Casou. Dois anos depois nascia a primeira filha do casal.

– Tudo corria bem até eu voltar a beber. Foi o recomeço da desgraça.

Afonso conta que ficava três meses num emprego e era demitido. A ressaca não permitia com que se apresentasse. Enquanto isso, a mulher seguia trabalhando numa empresa terceirizada. Se ela deixasse dinheiro para o leite e pão, ele gastava na droga.

Continua depois da publicidade

> Pode beber depois de tomar a vacina da Covid-19?

> Quem são as personalidades de SC que morreram de Covid-19 em 2021

Foram muitas oportunidades. Até que certo dia ele fez a escolha de não mais voltar para a casa. Depois de alguns dias na sarjeta, pediu ajuda para um parente que também morava em Santa Catarina: ‘Do jeito que você está não tem condições’, ouviu.

– Hoje eu penso assim: do jeito que eu estava, nem eu ia me querer mesmo.

Foi tanto vaivém que Afonso nem sabe precisar o tempo que perambulou. Mas lembra que se alimentava com restos de comida, bordas de pizza e que revirava frutas nas lixeiras de mercados.

> Oque são as variantes do coronavírus e como elas impactam Santa Catarina

Também recorda de pedir água nas casas e dinheiro a quem passava. Reciclou latinhas, virou olheiro do tráfico e apanhou da polícia para não entregar o dono da boca. Afonso reconhece que a mudança de vida se deve à ajuda espiritual e à família que o acolheu. Mas aposta na vontade própria, na autoestima.

– A gente acredita em algo superior, maior do que nós. Mas também é preciso querer a mudança em nossas vidas.

Continua depois da publicidade

Leia também

“Luzes misteriosas” no céu intrigam moradores no Planalto Norte de SC

Médium escreve carta psicografada sobre Paulo Gustavo: mensagem seria de uma ancestral do artista

Operação apura venda de carne de cavalo para consumo em SC