Especialista em estudos asiáticos, o cientista político Alexandre Uehara afirma que a tensão na península coreana pode dar a incidentes menores proporções imprevisíveis. Confira trechos da entrevista a ZH:

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Zero Hora – Qual a capacidade real de ataque da Coreia do Norte?

Alexandre Uehara – A Coreia do Norte é, de fato, uma grande ameaça à estabilidade da região. O risco e o potencial de iniciar um conflito é grande. Ninguém tem dúvidas de que eles têm capacidade de causar prejuízos significativos para o Japão e para a Coreia do Sul, pela proximidade. Para os Estados Unidos, já sou mais cético. Não creio que sejam capazes de atingir o continente americano. Até poderiam atingir as ilhas Guam, mas existe um ceticismo internacional sobre a capacidade de lançar mísseis de longo alcance com ogivas nucleares. Eles já têm o domínio da tecnologia da construção da bomba, mas para bombas grandes (que precisam ser reduzidas). O maior risco é de um ataque à Coreia do Sul ou ao Japão.

ZH – Onde Kim quer chegar?

Uehara – O governo do Kim Jong-Un é novo e na época da ascensão dele, até eu fiz análises de que, uma das possibilidades seria a de que buscaria um distensionamento das relações por ser um líder novo, sem histórico de conflitos com outros atores internacionais. Também porque a Coreia tem muitas carências. A outra possibilidade seria a de Un dar ênfase à área militar, e foi o que ocorreu. A área militar está mais forte do que antes. Com testes nucleares e mísseis, ele tentaria dar uma demonstração interna e externa de que o país é forte e merece respeito. Só que essa é uma aposta de muito risco. A Coreia do Norte tem, sim, grande potencial de fazer ataques ao Japão e à Coreia do Sul, mas uma guerra continuada seria muito difícil, mesmo com o contingente enorme que eles têm. Isso explica um pouco os investimentos em armas de destruição em massa.

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ZH – O que buscam de forma imediata?

Uehara – Desde que foram feitos os testes com foguetes e testes nucleares, foi suspensa a ajuda internacional. Por isso, agora, as sanções sobre a Coreia do Norte são quase inócuas. O país já não tem quase relações comerciais com o mundo. Realmente, não há o que barganhar. Neste momento, não parece que queiram ajuda internacional. De imediato, o problema é a insatisfação em relação aos exercícios feitos pelos EUA e Coreia do Sul, que são regulares todos os anos. E, todos os anos, eles reagem, mas, agora, essa reação ganhou um tom muito mais forte. A explicação pode ser a busca de um jovem líder em demonstrar força e ganhar autoridade ou pode ser consequência da própria inexperiência dele. Um conflito significaria a queda do poder da dinastia Kim. Dificilmente, eles conseguiriam se manter.

ZH – Estamos mais perto de uma crise nuclear ou da reunificação das Coreias?

Uehara – Estamos longe dos dois. Tanto os EUA quanto a China estão longe de usar o poder nuclear, mas não vejo a unificação como algo próximo. A China não tem interesse em reunificar a península porque as forças americanas poderiam chegar até as fronteiras chinesas. Porém, a situação hoje é de tensão crescente. Já tivemos diversos incidentes envolvendo navios, e a tensão não era como agora. O grau de tensão é tão grande que qualquer incidente pode ser imprevisível. Se ocorrer um ataque, espera-se que a China contenha a agressividade da Coreia do Norte. Se os EUA interviessem, o conflito ganharia proporções complicadas, com as potências em campos opostos.