Uma palavra que Del Bosque usa naturalmente à beira do gramado nos momentos mais tensos (ou nem tanto) da multicampeã Espanha:

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– Tranquilo, tranquilo.

Uma expressão que caracteriza Felipão, cara a cara com o seus atletas (“familiares”), no campo de jogo da Seleção.

– Pega, pega.

Luiz Felipe Scolari, que nasceu em Passo Fundo, e Vicente Del Bosque, que é de Salamanca, são técnicos campeões nacionais, continentais e mundiais, sessentões, mais de 1m80cm, nascidos e criados no interior de seus países, apreciadores de um bom vinho tinto, ligados à família numerosa e com domínio total dos vestiários que comandam – independentemente da constelação de estrelas com quem dividem assentos e ideias.

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Parecem iguais, homens de uma mesma aldeia distante das capitais, dois tiozões de bigodes grossos lotados de fios brancos (Felipão pinta os cabelos, Del Bosque, não), mesmo separados por um Oceano. As aparências sempre enganam quem olha de longe. Eles enxergam o futebol com diferentes óculos de leitura. Não são próximos.

Podem dividir um café, um papo sobre tudo, jamais adotarão a mesma cartilha tática no trabalho. Um acha que um time começa pela defesa, o outro pelo meio-campo. Felipão entrou no futebol pelo centro da zaga dos campos de barro e cerca de arame do Gauchão. Del Bosque frequentou o Real Madrid e a Europa a partir do Santiago Bernabeu, estádio cinco estrelas.

O zagueirão do bate e rebate não tem nada a ver com o fino jogador de meio-campo. Nem as chuteiras são as mesmas, travas altas, quase garras, travas curtas, a bola grudada no pé.

As seleções do Brasil e da Espanha, cada uma a seu modo, refletem as ideias de futebol do seus atuais mentores. Entre os ibéricos, o balão é um crime, o chutão, pecado mortal. Junto aos sul-americanos, o bumba meu boi é nova identidade. O melhor toque de bola do século passado, fotografia na carteira de identidade do futebol brasileiro, mudou de endereço. Não há nada mais espanhol no terceiro milênio do que o futebol bem jogado.

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Felipão gosta do centroavante fincado na grande área, dos cruzamentos laterais e dos volantes com perfil valentão. Del Bosque nem sempre conta com um número 9 de carteirinha, é fã do toque de bola refinado e de quem chama a Cafusa de você, a posição pouco importa.

Os jornalistas espanhóis em viagem ao Nordeste, na semana passada, garantiam que se a sua seleção contasse com os fabulosos atacantes que o Brasil gerou recentemente, um Ronaldo, outro Rivaldo, não só seria imbatível, o que quase é sem eles, como faria uma pilha de gols em todas as partidas.]

O espanhol está em vantagem. Conhece seu grupo desde a década passada e recebeu os melhores jogadores de toda a história do futebol espanhol. Cresceu com eles, ganhou todas as taças Fifa disponíveis nos últimos anos. Patrolou as grande seleções do continente, uma a uma. É um treinador que adota o diálogo, deixa o atleta falar, dá liberdade em campo, não se importa nem quando Iniesta escolhe o batedor de um pênalti como nas semifinais com a Itália.

O brasileiro chegou agora. Pegou um grupo desacreditado e desiludido. Fez o que sempre faz, chamou um a um, uniu todos, disse que estaria ao lado deles até o final. A partir da primeira vitória, num amistoso contra a França, um campeão mundial, nasceram outras quatro em jogos oficiais pela Copa das Confederações.

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Felipão é um técnico que gosta da conversa, mas com os jogadores. Vê os repórteres como fantasmas, sempre desconfiado que eles lideram um complô contra a Seleção e seu grupo. Gosta de vender aos atletas uma imagem de que eles precisam se unir. São eles (os jogadores e o técnico) contra o mundo.

Gratos pela Tríplice Coroa inédita, títulos da Eurocopa e da Copa do Mundo, Vicente Del Bosque, 62 anos, ganhou da Espanha o título de marquês. Caso vença a Copa das Confederações e recoloque o Brasil nos trilhos, Felipão, 64, pode escolher o título. O de presidente da CBF, no lugar do atônito José Maria Marin, seria uma ideia. O Brasil pede mudanças radicais nas ruas.