As discussões em torno do projeto da Lei de Ordenamento Territorial (LOT) continuam intensas em Joinville. Agora, as emendas parlamentares estão sendo analisadas pelos membros do Conselho da Cidade, que se reúne para apreciar o conteúdo das matérias e, depois, encaminha as sugestões à Câmara de Vereadores para votação.

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A intenção de terminar as avaliações das mais de 70 emendas até o fim deste mês se torna cada vez mais improvável diante do grande volume de propostas que chegam ao conselho. Vale lembrar que a LOT está em pauta do Legislativo há pelo menos cinco anos.

A coluna procurou lideranças do município que têm visões diferentes sobre o tema para explicar por que o projeto da LOT é bom ou ruim para o futuro de Joinville.

Neste espaço, o presidente da Fundação Instituto de Pesquisa e Planejamento para o Desenvolvimento Sustentável de Joinville (Ippuj), Vladimir Constante, e Luiz Tarquínio Sardinha Ferro, executivo que preside a Fundição Tupy, defenderam suas posições de forma enfática a respeito do tema que mexe com toda a cidade.

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Nestas duas páginas, você poderá ler o que ambos pensam sobre a LOT, as sugestões que eles dão para equalizar os problemas e como o cidadão joinvilense pode se beneficiar das eventuais mudanças. Confira:

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LUIZ TARQUÍNIO SARDINHA FERRO

“Do jeito como está encaminhada a LOT, Joinville vai piorar”

A Notícia – O senhor tem liderado um movimento contrário ao texto do projeto da LOT. Na sua opinião, a lei é necessária para a cidade?

Luiz Tarquínio – Sim, o projeto é necessário. Todas as cidades devem ter regras que as organizem sob aspectos variados, que envolvem dimensões de negócios, desenvolvimento econômico, mas, igualmente, que pense a respeito de qualidade de vida, da infraestrutura, do esgotamento sanitário, da mobilidade, entre tantos outros pontos a considerar.

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AN – O que falta no texto do projeto e nas emendas apresentadas?

Tarquínio – No documento, não há nenhuma preocupação com o lazer, por exemplo. Presido uma empresa com 7.800 funcionários, que são meus colegas de trabalho. Como não há nenhuma grande obra de mobilidade urbana feita nas últimas décadas, o tempo de deslocamento de casa para o trabalho, e vice-versa, é muito grande. Muitas vezes, demora mais de uma hora. Outro aspecto muito importante é o que trata de esgoto sanitário. Em Joinville, a cobertura é de apenas 32% da cidade. Sei que há projetos e obras, mas estamos aquém do razoável. A LOT deveria ter pensado nisso porque o adensamento populacional pretendido exigirá cobertura massiva de esgoto.

AN – Na sua opinião, a LOT vai melhorar o ambiente para os negócios em Joinville? Há expectivas nesse sentido?

Tarquínio – Não, não vai. Sou morador de Joinville há 14 anos e a cidade não é atrativa para os negócios. Há uma premissa de que Joinville vai se transformar num ambiente favorável aos negócios. Tenho dúvidas a respeito. Joinville nunca se preocupou em ter áreas verdes, sequer tem calçadas boas. São coisas básicas. Não sou contra a criação de faixas viárias, mas a sua criação indiscriminada, com mais de cem faixas viárias por diferentes bairros, só vai piorar isso. Gerentes seniores querem morar onde encontram mais do que só um salário e uma oportunidade de trabalho.

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AN – Mas a cidade vai enriquecer depois que a nova legislação entrar em vigor. O senhor concorda?

Tarquínio – Claro que Joinville possui infraestrutura de logística portuária invejável. A BR-101 é razoável, mas tenho uma compreensão mais ampla. Não enxergo a cidade apenas do ponto de vista restrito ao elemento econômico-financeiro. Olho para o social, para as pessoas. Por isso, penso que vai piorar. Por que se planeja uma cidade para 4 milhões de pessoas se a população vai estagnar em 1 milhão, como prevê o IBGE? A Prefeitura calcula? Essa pergunta nunca foi respondida.

AN – A ideia de fomentar empresas na região Sul é boa para aproximar o emprego das moradias?

Tarquínio – A proposta de setorizar é boa. Essa preocupação com as pessoas da zona Sul é um ponto bom do projeto.

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AN – O Conselho da Cidade representa os interesses plurais da sociedade?

Tarquínio – O Conselho da Cidade é um órgão de pessoas eleitas. Penso que deve ser um órgão consultivo. E o Ippuj deve ser moderador, com visão técnica. As reuniões do conselho acontecem de manhã e poucos podem ir. A maioria das pessoas tem de trabalhar nesse horário.

AN – E o papel do Poder Legislativo nisso tudo?

Tarquínio – O Legislativo tem de ser mais ativo. Quantos dos proponentes de emendas participaram, de fato, das audiências públicas? Deveriam estar lá, até para justificar e defender suas ideias. A Câmara de Vereadores deveria discutir o assunto maciçamente com as pessoas.

AN – Parece haver um olhar imediatista, quase que só para o lado da expansão de empreendimentos. É isso o que o senhor percebe?

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Tarquínio – Tem de se olhar para as futuras gerações. Não se deve olhar quase que só para o resultado econômico-financeiro. A preocupação tem de ser para a sustentabilidade ambiental, para a segurança social.

AN – A cidade vai piorar?

Tarquínio – Do jeito como a LOT está sendo encaminhada, a cidade vai piorar. O que se está fazendo é agir na direção de crescimento e pujança temporários, sem compromisso com o desenvolvimento, com a sustentabilidade futura. Temos, como sociedade, de ter ambição para melhorar no interesse coletivo. Temos de estar conectados com as tendências que orientam para melhor qualidade de vida, inclusive do ponto de vista dos negócios.

AN – O senhor fala em sustentabilidade dos negócios. Que fatores são importantes quando empresas e executivos escolhem uma cidade para instalar suas atividades?

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Tarquínio – Publicação do Instituto Global da McKinsey mostra que, hoje, filiais de multinacionais de grande porte buscam se instalar em cidades bem conectadas, boas para negócios, mas, acima de tudo, onde os executivos de ponta gostariam de viver. Cidades com reputação pela qualidade de vida, como Sydney, Toronto, Praga e Singapura.

VLADIMIR CONSTANTE

“O potencial construtivo vai se reduzir”

A Notícia – Por que a LOT é necessária para Joinville?

Vladimir Constante – A Lei de Ordenamento Territorial é necessária porque deriva da criação do Estatuto da Cidade, de um plano diretor com visão participativa. Daí vem a LOT, com o Conselho da Cidade opinando e se realizando as audiências públicas.

AN – O senhor considera que o longo tempo de análises é bom?

Constante – O tempo de discussão da lei é fora do comum. Mas isso acontece porque há interesses contraditórios variados e todos lutam por aquilo que acreditam ou desejam. É na LOT que aparecem as visões pessoais distintas. Isso acontece porque mexe diretamente com o tipo de vida futura que teremos. E cada pessoa tem suas ideias próprias.

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AN – As decisões que forem adotadas vão impactar no cotidiano?

Constante – Sim, é exatamente isso que vai ocorrer. Aí, o embate é grande. Há segmentos fortíssimos, cada um defendendo posições e causas bem específicas. Estão em jogo vontades dos industriais, de comerciantes, das áreas da construção civil, de loteadores, de universidades, de movimentos sociais, de associações de moradores etc.

AN – O senhor acha que a discussão passou do tempo?

Vladimir – Ah, sim! Demorou mais do que o razoável. Em compensação, estes anos todos garantiram amplo debate e publicidade. O texto geral não é polêmico em seus conceitos. O problema não está aí. É quando se entra nos detalhes de uso e ocupação do solo – do que pode ou não pode nas ruas A, B ou C – que começam as divergências. É a hora dos interesses individuais.

AN – Joinville vai ficar mais cinza, com prédios mais altos. Isso é bom?

Constante – O que é combatido por alguns é isso. Mas, no geral, essa percepção está equivocada. O potencial construtivo vai se reduzir em relação à lei nº 312, ainda em vigor. O que o Executivo quer é adensar a cidade nas áreas com boa infraestrutura, nos bairros próximos do Centro. Em alguns lugares, hoje os prédios podem ter 18 andares, subindo para até 21.

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AN – A criação de faixas viárias tem gerado muitas críticas?

Constante – As críticas existem. Elas vêm da Associação de Moradores do Bairro América e de algumas outras; de um grupo influente na cidade, que se mobiliza fortemente. Lá no América, a discussão é mais quente. Abrange a área em volta do Hospital Infantil, seguindo para a rua Aquidaban, entre a rua 15 de Novembro e a Otto Boehm. No geral, considerando-se o município todo, a proposta é mais restritiva e se aproxima do potencial construtivo já existente.

AN – Como o senhor avalia as emendas dos vereadores?

Constante – Várias delas vão restituir o potencial construtivo de antes. E até uma emenda eleva o potencial para 18 pavimentos neste polígono do bairro América, do qual falamos.

AN – Há muitas emendas ainda sendo apresentadas ao Conselho da Cidade. Há possibilidade de retardar, de novo, a apreciação da lei?

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Constante – Os vereadores têm legitimidade e direito a apresentar emendas ainda nesta fase. E o Conselho da Cidade tem a obrigação de analisar todas. Acredito que até o fim de agosto as emendas estejam todas analisadas. O projeto pode ser votado em setembro. (A entrevista foi feita na terça-feira, dia 9, antes de os vereadores terem entregue mais 20 sugestões ao conselho. Anteriormente, já tinham apresentado 54. Essa circunstância nova talvez retarde ainda mais a votação).

AN – Como ficará a região Sul da cidade pelo projeto do Executivo?

Constante – Estamos criando a área de expansão industrial Sul. Para lá, está prevista a instalação de empresas de logística e grandes empreendimentos industriais à volta da fábrica de motores da GM até o limite com Araquari. Há ótimas áreas para a construção de empreendimentos no final da avenida Santa Catarina e no Eixo Sul. A estratégia é aproximar a moradia do emprego. Claro que ninguém quer instalação de ferramentarias ao lado de regiões residenciais por causa do barulho. Empresas de baixo impacto, ok.

AN – O Projeto Vale Verde, na zona rural, lhe parece adequado?

Constante – Achamos que o projeto tem tamanho muito extenso. Grande demais. Defendemos uma área muito menor do que a que querem os investidores e proponentes.

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