Foi-se o tempo em que ver ex-jogadores barrigudos na TV era privilégio dos espectadores de showbol. Uma zapeada pelo horário eleitoral e lá estarão escretes inteiros, do goleiro ao centroavante, defendendo partidos políticos em vez de clubes.

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Não é exatamente um fenômeno novo. Larry, ídolo do Inter, foi eleito vereador de Porto Alegre em 1959, quando a definição “lacerdista da UDN” ainda fazia algum sentido. Mas eram tempos em que tanto o futebol quanto a política eram menos exigentes com os atletas.

– A rotina da Câmara não era diária, então dava tempo para conciliar treinos, jogos e sessões – conta Larry, um dos que intercalavam treino e tribuna.

A sensação de que a eleição de 2014 virou uma Copa João Havelange no que se refere ao inchaço de boleiros é, sobretudo, a proliferação de novos partidos. Como a lei da fidelidade partidária limitou trocas entre legendas já existentes, novas surgiram. A concorrência fez com que partidos escalassem “coelhos”, o que na política não tem nada a ver com o reserva do Barcos.

– Ex-jogadores são escolhidos não necessariamente para se eleger, mas para puxar votos para a legenda. É cômodo, porque eles já são conhecidos, e é o partido, em geral, quem banca toda a campanha. O que vier de votação deles é lucro e ajuda o partido a inflar a sua bancada – explica o consultor em marketing político, Carlos Manhanelli.

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Exemplos estão de norte a sul. Em Roraima, Josimar da Seleção (é assim mesmo o nome na urna), eternamente conhecido pela bucha contra a Irlanda na Copa de 1986, tenta ser deputado estadual pelo PPS. No Rio, Bebeto “Tetra” vem à reeleição com o número 77777. Em São Paulo, o recém-fundado SD escalou Dinei para deputado federal _ o amuleto corintiano já havia tentado ser vereador duas vezes pelo PDT, em 2008 e 2012, sem sucesso. Na última eleição, teve companhia de Marcelinho Carioca, então no PSB. Tampouco eleito, o Pé de Anjo tenta de novo o ingresso na política, agora no PT.

– Eu jogava no Madureira e agora vou para um time grande – comparou.

Vereador em Belo Horizonte de 1972 (quando ainda jogava) a 1988, Piazza vê oportunismo nas candidaturas. Como não é de faro de gol que estamos falando, o ex-cruzeirense confia no discernimento do eleitor:

– Um jogador que não se prepara para a aposentadoria não recebe fora de campo R$ 15 mil ou R$ 20 mil como um deputado recebe. Felizmente, a maior parte do eleitorado procura votar em um cara diferenciado mesmo entre ex-jogadores. Você não votaria no Adriano Imperador, votaria?

Reeleição é tarefa mais complicada

O tricampeão do mundo afirma ainda que o primeiro mandato é o mais fácil, quando o carinho da torcida rende votos. A reeleição já é bem mais complicada. Que o diga outro astro do Mineirão, o atacante Marques. O gol do título mineiro de 2010 não impediu que Vanderlei Luxemburgo barrasse a renovação do seu contrato. Aposentado a contragosto, se lançou a deputado estadual cinco meses após a final contra o Ipatinga. Recebeu 153 mil votos, mais de mil para cada um dos 133 gols marcados pelo clube.

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– Agora, é um momento diferente mesmo, sou mais cobrado – afirma Marques, que tomou gosto pela coisa.

O atacante concorre com o ex-goleiro atleticano João Leite (PSDB), que busca o sexto mandato consecutivo. Já para a Câmara Federal, ainda há Reinaldo, melhor jogador da história do Galo. O clássico é parelho. Presidente do Cruzeiro, Gilvan Pinho Tavares (PV) concorre a estadual e o ex-goleiro Raul Plassmann (PSC), a federal.

Em alguns Estados, já é muito ídolo para pouca urna.