*Por Veronique Greenwood

As donzelinhas são insetos que reluzem pelas florestas e rios como varinhas de condão feitas de pedras preciosas.

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"Elas voam como pequenos helicópteros até identificarem uma presa, em geral insetos voadores menores", de acordo com Paloma Gonzalez-Bellido, bióloga da Universidade de Minnesota. Então, elas mergulham a toda a velocidade em direção à próxima refeição.

Você pode confundir as donzelinhas com suas primas, as libélulas. Mas, agora, novas pesquisas mostram que esses dois predadores compartilham algo mais profundo que a aparência. Em um artigo publicado na revista científica "Current Biology", Gonzalez-Bellido e seus colegas revelaram que os sistemas neurais por trás da visão das donzelinhas são parecidos com os das libélulas. Os dois insetos têm um antepassado em comum, que já existia antes dos dinossauros. Mas, com o passar dos milênios, o cérebro dessas criaturas se adaptou de maneiras diferentes, permitindo o desenvolvimento de estratégias de caça radicalmente diferentes.

Para criaturas voadoras, a visão instantânea e precisa é fundamental para a sobrevivência. Pesquisas recentes mostram que aves de rapina que voam mais rápido também veem mais rapidamente as mudanças em seu campo de visão, demonstrando uma conexão entre a velocidade da asa e a do cérebro.

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Mas o grupo de insetos que inclui donzelinhas e libélulas aprendeu a voar muito antes que os pássaros aparecessem no horizonte evolutivo, e sua visão é mais rápida que a de qualquer vertebrado estudado até o momento, afirmou Gonzalez-Bellido. Por isso, pesquisadores que buscam compreender como sua visão, seu voo e suas habilidades de caça se interligam ficaram particularmente interessados nos neurônios que enviam informações visuais para as asas.

O comportamento das donzelinhas envolve atacar o que está exatamente à sua frente, revelaram os pesquisadores. No entanto, gravações feitas em laboratório por Gonzalez-Bellido e seus colegas confirmaram que as libélulas atacam de baixo para cima em linha reta, atingindo suas vítimas por baixo, como se a presa tivesse pisado em uma mina terrestre.

Essa subida repentina pode contribuir para o sucesso de seus ataques: as libélulas são bem-sucedidas 97 por cento das vezes.

A diferença no comportamento de caça pode estar relacionada com a posição dos olhos dos insetos. Os olhos das donzelinhas ficam na lateral da cabeça, virados para a frente. Os olhos das libélulas – da espécie Sympetrum vulgatum – ficam no topo da cabeça do inseto, fechados em uma espécie de domo iridescente, com uma linha fina percorrendo o meio para destacar que, em algum momento da evolução, os olhos já foram separados.

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"Os olhos funcionam juntos, como um panorama contínuo", explicou Gonzalez-Bellido a respeito desse tipo de libélula. Pesquisas anteriores revelaram que os neurônios visuais que guiam os músculos dos olhos da libélula funcionam praticamente como se o inseto tivesse um único olho, com um fio de cabelo no meio.

Para observar mais de perto os neurônios que conectam a visão e o voo, os pesquisadores equiparam donzelinhas com sensores e mostraram a elas o vídeo de um ponto em movimento, similar ao que foi feito em pesquisas anteriores envolvendo libélulas. Quando um neurônio entrava em ação, um clique era ouvido pelos pesquisadores, para que eles pudessem dizer exatamente a quais movimentos – esquerda, direita, para cima, para baixo ou alguma combinação – cada neurônio reagia. Os pesquisadores revelaram que as donzelinhas enxergam melhor aquilo que está à sua frente, enquanto a visão das libélulas é mais clara em relação ao que está acima delas.

A equipe ficou intrigada ao descobrir que, embora os neurônios da donzelinha nem sempre reajam como os das libélulas, o número e a organização dos neurônios são similares. Isso sugere que o sistema que passa essa informação dos olhos para os músculos das asas não surgiu recentemente na linha evolutiva, mas tem raízes milhões de anos mais antigas que os dinossauros mais antigos. E esse ancestral comum provavelmente já contava com grande velocidade de visão e de voo. Então, com o passar dos milênios, o sistema evoluiu para se adaptar a cada espécie de inseto.

A principal diferença apareceu quando os pesquisadores bloquearam a visão de cada olho da donzelinha, usando um tapa-olho preto. Quando um dos olhos ficava coberto, determinados neurônios paravam de enviar informações. Esses neurônios recebiam mensagens de ambos os olhos.

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Isso sugere que as donzelinhas organizam as informações vindas de ambos os olhos enquanto voam, algo que as libélulas não conseguem fazer. Ainda não se sabe se elas são capazes de gerar uma visão em três dimensões e identificar profundidade nas imagens, como os seres humanos (e as lulas) conseguem fazer. Mas é possível que receber duas imagens ligeiramente diferentes do mundo de uma só vez dê às donzelinhas uma visão mais sutil.

As libélulas caçam a céu aberto, sob a luz do sol, afirma Gonzalez-Bellido, num contexto em que a precisão é fundamental. A donzelinha caça em meio às sombras e raios de sol da floresta, onde usar a visão dos dois olhos para evitar obstáculos pode ser mais importante.

Esse sistema neural compartilhado pode ter mais de 250 milhões de anos, mas ele também é flexível o bastante para se transformar de acordo com as necessidades de incontáveis espécies, em diferentes épocas e ambientes, sugerem as descobertas do estudo.

Uma possível explicação para essa capacidade é que, entre todos os animais voadores, os insetos são os únicos cujas asas não se desenvolveram a partir de outros membros, como acontece com pássaros e morcegos, explicou Gonzalez-Bellido. "Não ter de reutilizar um sistema mais antigo para aprender a voar pode ser o que permitiu a rápida evolução desse impressionante controle de voo", afirmou.

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