Atos como jogar papel de bala ou bituca de cigarro em ruas e locais públicos podem deixar de ser só falta de educação e virar infração em Joinville. Um projeto de lei do vereador Lioilson Correa (PT) propõe que quem for pego jogando lixo no chão pague multa que hoje seria de R$ 206 aos cofres públicos. A proposta é polêmica e acabou reacendendo o debate sobre a falta de lixeiras.

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A justificativa do projeto, segundo o vereador, é incentivar a população a jogar lixo em lugares adequados e evitar que pequenos atos da falta de educação colaborem para entupir bocas-de-lobo durante chuvas, por exemplo. Quem for flagrado deixando lixo como copos plásticos, sacos de salgadinho, latinhas, entre outras embalagens em praças e parques também estará sujeito à punição. O projeto ainda tem de ser avaliado pelas comissões da Câmara de Vereadores antes de ir à votação.

Como não bastasse uma lei para garantir que o lixo seja jogado no lixo, outra regra básica de convivência virou projeto. O dejeto deixado pelos cães e gatos nas ruas de Joinville pode estar com os dias contados. Caso seja aprovada a proposta que está em discussão no Legislativo, os donos que não limparem a sujeira que seus animais de estimação fazem em calçadas, gramados e vias públicas poderão ser multados em

R$ 150. O dinheiro arrecadado seria destinado para um instituto de proteção animal de Joinville.

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A ideia do vereador Maycon César (PR) é uma tentativa de criar uma penalidade para uma lei que já existe em Joinville. Desde o ano passado, está previsto que os donos são responsáveis por recolher os dejetos de seus animais de estimação. Um projeto semelhante foi aprovado em Florianópolis, sem também especificar a aplicação de multa.

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Blog Intervalo: É preciso ligar o desconfiômetro

No caso das lixeiras, leis semelhantes já existem ou estão em elaboração em outras cidades do País, às vezes com variações, como não jogar lixo em pontos de ônibus ou não deixar sacos de lixo ao lado de postes. Em São Paulo, desde 2011, a prática rende multa de até R$ 12 mil. No Rio, a Prefeitura vai multar a partir de julho. Os valores variam de R$ 157 a R$ 980.

O problema é que a punição gera dúvidas. A principal delas é como colocar lixeiras em todas as ruas da cidade e, depois, mantê-las. Hoje, apenas locais de maior circulação e onde há equipes de varrição de rua da Ambiental (empresa da coleta de lixo) dispõem de lixeiras públicas. O presidente do Ittran, Eduardo Regua, diz que será aberta licitação para compra de mais 130 lixeiras, mas elas também devem ir para a região central, onde a demanda é maior. A Câmara já aprovou lei que permite parceria da Prefeitura e iniciativa privada para que estabelecimentos paguem e mantenham as lixeiras.

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Dúvidas sobre a aplicação de multa

Em princípio, agentes de trânsito seriam responsáveis pela fiscalização e pela emissão das multas. Há quem defenda que o caso do lixo é mais de conscientização do que punição, até porque não haveria agentes para fiscalizar todo o fluxo de pessoas que jogam lixo. Pelo projeto de lei, o agente de trânsito terá de gerar um auto de infração bastante detalhado, descrevendo como ela ocorreu, e pedir assinatura do infrator.

Outra dúvida é se a pessoa pode ser multada onde não há lixeiras. Pelo projeto, sim, porque a lei se refere a lixo jogado em qualquer logradouro ou local público. Pelo bom senso, também, porque a pessoa poderia levar o lixo e descartá-lo na lixeira de casa. Se o caso for parar na Justiça, porém, pode haver interpretação de que a pessoa só pode ser orientada e não multada, porque o próprio poder público que multa é quem não forneceu a lixeira, outra chance de a lei se tornar inócua.

Também pode haver conflito com outras leis. O Código de Trânsito já prevê multa de R$ 89,13 se o motorista atirar lixo pela janela do carro. O projeto da Câmara não especifica se, neste caso, a pessoa pode levar as duas multas, a de trânsito e a de R$ 202,06. Por não tratar de quantidade, também não responde se quem jogar um caminhão de entulho em um terreno da Prefeitura (local público), o que gera multa ambiental, teria de pagar da mesma forma os R$ 206,02 propostos.

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Dificuldades na hora de fiscalizar

Apesar de determinar o pagamento de R$ 150 de multa para quem deixar dejetos de animais nas ruas, a proposta não define qual deve ser o órgão responsável pela fiscalização do cumprimento da lei. Mesmo assim, Maycon César defende a necessidade da aprovação imediata da matéria.

– É uma questão importante que deveria fazer parte da educação da população. Mas como existe dificuldade em entender isso, estou propondo essa lei. Ela surge até como uma medida educativa -, explica o vereador.

Entre entidades e especialistas, o projeto causa polêmica. A Frente de Ação pelos Direitos dos Animais (Frada) diz ser favorável à medida, mas acredita que outras leis que garantem o bem-estar de animais de estimação precisam ser discutidas antes.

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– Sou contrária a quem não recolhe o cocô do animal na rua. Mas não vejo praticidade nesse projeto. Quem irá fiscalizar? Vai aplicar multa para quem? E o que fará com os cachorros abandonados? Dará multa a eles? -, questiona Ana Rita Hermes, presidente da organização.

A Prefeitura vê dificuldades em fiscalizar e em como determinar as infrações dos eventuais transgressores. A Fundema, que é responsável por cuidar da área do Bem-estar Animal, adverte da dificuldade em conseguir colocar em prática a proposta.

– O projeto não leva em conta um monte de fatores, nem o básico, que não temos pessoal para fiscalizar. Isso precisa partir da conscientização e não ser imposição -, diz o presidente Aldo Borges.

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Falta de educação enraizada na sociedade

O antropólogo Roberto Da Matta afirma que a falta de educação refletida em situações cotidianas como o desrespeito às filas e a irresponsabilidade no trânsito está entranhada na sociedade. Segundo ele, pesquisas demonstram que a população brasileira vê como “otário” quem cumpre rigorosamente as normas.

As origens desse tipo de distorção estão enraizadas na história.

– Em um país que teve escravidão até anteontem, só quem seguia normas eram os escravos, que levavam porrada. Por isso, até hoje consideramos cumprir regras uma babaquice -, avalia Da Matta, 76 anos, que costuma ver engravatados de 40 anos cortando sua frente em filas de aeroporto quando o alto-falante convoca os idosos a embarcar com prioridade.

Outro problema, segundo o antropologo, é que essa herança nefasta é reforçada por maus exemplos que vêm de cima.

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– Saiu no jornal hoje (terça-feira) que a comitiva do prefeito de São Paulo estacionou em local proibido. Se ele faz isso, por que eu não vou fazer? -, questiona, referindo-se a mais de uma dezena de carros oficiais que acompanhavam Fernando Haddad e pararam em lugar irregular durante uma visita esta semana.

Não há punição efetiva no País para quem descumpre regras.

O psicanalista Abrão Slavutzky acredita que o cenário brasileiro é agravado pela falta de punição efetiva para quem descumpre normas tácitas ou leis formais – seja pelo constrangimento público, por multa ou outra forma de reprimenda. Ele recorda que viu um brasileiro ser censurado por um policial, na Itália, ao jogar papel no chão.

Projeto dos cães

– Donos de animais domésticos (cães e gatos) que circularem por vias públicas ficam obrigados a recolher todo dejeto que

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os animais fizerem.

– Isso vale também para calçadas e gramas de propriedades particulares.

– Quem não cumprir a lei e deixar os dejetos na rua será multado em R$ 150

– Os recursos arrecadados serão destinados a um instituto de proteção

animal de Joinville.

Proposta do lixo

Projeto de lei do vereador Lioilson Correa (PT) quer multar cidadão que jogar lixo na rua. Veja como a lei funcionará, se aprovada.

– Proposta: Multar todo cidadão que for flagrado jogando lixo em vias e locais públicos.

– Multa: Uma unidade padrão municipal (UPM), que é reajustada todo mês. Hoje, o valor é de R$ 206.

– Locais: Lei valerá para vias e espaços públicos, sejam ruas, avenidas, rodovias municipais ou praças, parques e até estabelecimentos como hospitais, escolas, entre outros.

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– Fiscalização: Caberá aos agentes de trânsito do Ittran, em princípio.

– Polícia: A polícia pode ser chamada se o cidadão se negar ou causar confusão ao ser notificado. Se ele for reincidente, o valor da multa dobra.

– Arrecadação: O dinheiro arrecadado vai para o Ittran e deve ser aplicado em campanhas publicitárias de educação sobre o lixo.

– Lixeiras: A Prefeitura fica obrigada a instalar lixeiras em toda a extensão das vias públicas do município.

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– Cadastro: A lei obriga que o auto de infração contenha dados e assinatura do infrator, do agente que o notificou e descrição de como a pessoa jogou o lixo no chão. O Ittran terá de criar um cadastro para saber quem já foi multado.

– Passos: Lei terá de ser discutida nas comissões da Câmara de Vereadores primeiro.

Só depois poderá ir a plenário para ser votada.