Certa vez, o Galego, uma espécie de Garrincha que tínhamos no time de garotos (pelas artimanhas com que tentava passar pelos adversários), provocou-nos frouxos de risos ao encenar um curioso comício. O candidato que ele representava com os mesmos gestos que levava a campo prometia aos eleitores construir a mais barata ferrovia do mundo, “com trilhos de bambu e dormentes de banana”. Outro se excedeu de tal modo que, num dado momento, alguém na plateia não aguentou e berrou na direção do palanque: “Desce, mentiroso. Vem apanhar aqui embaixo”.
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O título de eleitor foi o quarto documento que tirei. Antes dele vieram a carteira de trabalho, a identidade e a “terceira” do Exército. Na primeira vez que entrei em uma fila de votação, senti-me o dono do mundo. Quando me entregaram a cédula de papel e empunhei a caneta para anotar os escolhidos, suava pelas mãos. O votar marcando nomes num papelzinho foi a primeira fase. Depois, fui apresentado à urna eletrônica. Já estava batizado em votar, o glamour não foi o mesmo. A biometria, bola da vez, me alcança enfastiado, jururu, com as barbas de molho.
Papai não votava. Porque mal sabia escrever o nome. Esta condição o levou a jamais ter título de eleitor. Mamãe não perdia eleição. Nos tempos em que votar tinha ares mais formais, ela fazia o que se chama de cola: anotava nome e número dos escolhidos num papel que dobrava e, ao sair para votar, guardava no sutiã. Era segredo que ninguém conheceria e muito menos botaria as mãos.
Neste domingo, exercerei o papel de eleitor segundo modernos conceitos. Minha primeira “eleição biométrica”, processo que chega a Joinville. O que isso significa? Talvez surja algo a contar da experiência. Talvez. Quase certo é que se continuará elegendo muito engodo acreditando piamente em dias melhores – porque não desistimos nunca, não é mesmo?
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Neste 2/10, seremos disputados. Votemos conscientemente. Mas não fiquemos esperando presentes ou milagres. Li todo papel de campanha que recebi. Há algumas boas ideias. E bobagens a dar com o pé, coisas que nem da alçada do candidato são. Política é locupletação, ensina a história de hoje e de ontem. Sejamos vigilantes com ela, exercendo a mesma condição que nos torna tão valorizados e disputados nestas horas.
Renovação é a palavra mais bonita do processo. Perpetuação é a condição mais perseguida. Ceticismo é o sentimento mais aplicado.