O vento que sopra por meses, modificando a paisagem e carregando os grãos finos das dunas, empurra para a mudança os moradores da itinerante Vila do Arvoredo, conhecida por Favela do Siri, no norte da Ilha. A vida, as dificuldades e algumas histórias dessa comunidade, que cresce sobre as montanhas móveis desde os 1980, está no documentário Vida na Areia, da diretora Fernanda Friedrich. O filme, vencedor do Prêmio Funcine de Cinema em 2011, será lançado hoje às 18h, com exibição no auditório do Centro de Comunicação e Expressão (CCE) da UFSC em Florianópolis.
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Com depoimentos de moradores antigos, que viram a comunidade e os problemas crescerem desde a década de 1980, a narrativa expõe a falta de infraestrutura enfrentada por cerca de 160 famílias que moram cercadas por dunas que engolem casas. Na parte mais alta, aproximadamente 200 metros de terrenos construídos estão sob a areia, que não para de deslizar em direção às moradias restantes. A cada avanço das dunas, a comunidade reconstroi seus barracos em outra área próxima, sem ligação regular de luz, água e saneamento básico.
– Eles vivem como nômades na própria comunidade. É uma realidade bem triste, onde crianças brincam no esgoto e as famílias convivem diariamente com areia em praticamente tudo: na água, na comida, na roupa. Eu, que não tenho problema respiratório, passei mal uma semana depois dos três dias de filmagens – descreve a diretora.
Assista ao trailer:
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Personagem do documentário, o líder comunitário Nivaldo Araújo da Silva diz que pouca coisa mudou desde a produção do filme, entre 2012 e 2013.
– É como se voltasse a estaca zero, ao período de promessas. Estavam vendo um terreno, mas nada de concreto. E a areia continua a avançar. Minha segunda casa, de madeira, jé está a 12 metros das dunas – disse Nivaldo, que mora há 12 anos na vila.
Prefeitura pretende realocar 96 famílias do Siri
O diretor de Habitação da prefeitura de Florianópolis, Américo Pescador, diz que acompanha a situação na Vila do Arvoredo desde 2005. Ele afirma que parte das 215 famílias que lá estavam na época receberam incentivos do poder público para retornarem aos seus lares ou indenizações que permitiram mudança de endereço para outras localidades na Ilha. Atualmente, 168 famílias estão cadastradas na Secretaria Municipal de Habitação.
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– Está em fase de conclusão o projeto para a construção de um condomínio residencial do Minha Casa, Minha Vida, nos Ingleses, para beneficiar 96 famílias da Vila do Arvoredo – afirmou.
De acordo com o diretor, as obras devem ser iniciadas no primeiro semestre de 2015 e as famílias mais próximas da areia terão prioridade. Outra informação repassada por Américo, é que um dos dois terrenos necessários para a construção das moradias já foi adquirido pela Prefeitura.
A Vila do Arvoredo, vulgo Favela do Siri, foi se constituindo entre as décadas de 80 e 90, com crescimento mais acelerado a partir dos anos 2000. Segundo o diretor de Habitação, Américo Pescador, a maioria da população veio do Oeste, Meio Oeste e Paraná para servir de mão-de-obra para a construção civil.
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“Eles não são invisíveis”, diz diretora
O documentário Vida na Areia é o terceiro trabalho na carreira da cineasta Fernanda Friedrich. O projeto de retratar a realidade na Favela do Siri foi se construindo ao longo da formação da diretora gaúcha, que se formou em jornalismo na UFSC.
– Sempre frequentei a praia dos Ingleses e ouvia falar da Favela. Na graduação tive contato com um trabalho acadêmico de uma outra colega feita no local. Quando surgiu o edital do Funcine eu resolvi fazer o projeto, que acabou selecionado – diz.
A proposta do filme é chamar a atenção para a comunidade.
– Quero mostrar que eles não são invisíveis e merecem atenção e cuidados do poder público como qualquer outro morador de Florianópolis – diz.
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Entre os trabalhos da autora, destaque para o curta Família no Papel, de 2012, que discute a adoção por casais homoafetivos _ filme que está em exibição no canal de TV a cabo GNT.
Cinema Catarinense em debate
Além do lançamento de Vida na Areia, o Curso de Cinema promove a exibição de outros dois curtas catarinenses: L’Amour, de Sandra Alves, e Pela Boca, de Diego Lara.
– Pensamos no evento como uma forma de debater no meio acadêmioco sobre a atual produção catarinense. Os filmes mostram personagens ligados à aspectos culturais do nosso Estado. É importante que as produções feitas aqui retratem o nosso povo – diz Fernanda.
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Após a exibição, os diretores dos três curtas vão participar de um bate papo sobre cinema catarinense. Vida na Areia já foi exibido no Rio De Janeiro, durante o festival Visões Periféricas, e foi selecionado na última semana para rodar em setembro, no Festival de Cinema de Vera Cruz, em Goiânia.