Pelo menos 100 residências foram atingidas pelo rompimento de um reservatório da Companhia Catarinense de Águas e Saneamento (Casan), por volta das 2h desta quarta-feira, no bairro Monte Cristo, área continental de Florianópolis. Cerca de 2 milhões de litros de água vazaram arrastando postes de luz, paredes, muros, carros, móveis, roupas, objetos de uso pessoal. Não houve mortes, mas duas pessoas ficaram feridas.
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A estrutura localizada na rua Luiz Carlos Prestes dava sinais de vazamentos, conforme vídeos feitos pelos moradores, em maio, somente um ano depois da inauguração, em abril de 2022. A Polícia Civil abriu inquérito para investigar responsabilidades e o deputado Marquito (PSOL) sugeriu a abertura de uma CPI na Assembleia Legislativa de Santa Catarina. O Ministério Público e o Tribunal de Contas do Estado também se pronunciaram e vão investigar o ocorrido.
Do susto na madrugada à compreensão da realidade. Assim se passaram as horas desta quarta-feira para os moradores do Monte Cristo, uma das regiões com maior vulnerabilidade da cidade. A maioria das casas do bairro é de alvenaria e as construções são bastantes insalubres. O saneamento básico é precário. A renda familiar varia de um a três salários-mínimos. O perfil educacional é baixo e muitas pessoas trabalham na informalidade. Esta realidade torna ainda mais doloroso o cenário de destruição, o qual pode ser visto por quem caminha pelos becos e ruelas.
No final da tarde, a Casan informou que 26 pessoas seriam encaminhadas para hotéis. Alegando escassez de vagas na rede hoteleira, mais 40 seriam levadas em caráter emergencial para centros de treinamento da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural (Epagri) de Santa Catarina. Por outro lado, o pouco que têm – ou que lhes restou – segue valioso. Com medo de roubos, algumas pessoas pediam por barracas para não precisarem se afastar. Para garantir-lhes segurança, a Guarda Municipal e a PM prometem passar à noite fazendo rondas no local.
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“Foi um desespero”
— Estou no aguardo da Defesa Civil para saber se podemos continuar em casa, pois o muro envergou e temos medo de que desabe – contava Ryan Antony, 20 anos, com o filho no colo, no começo da tarde.
Na noite passada, ele deixou o bebê de quatro meses com a mulher, no piso superior, e foi ajudar os vizinhos. Tirou 10 pessoas das residências, sendo quatro crianças.
— Foi um desespero. A água bateu quatro metros.
Ryan resume o pensamento dos moradores do Monte Cristo e foram atingidos pelo rompimento do reservatório da Casan:
— Do jeito que a água veio, com aquela força, só um milagre por não morrer ninguém.
A advogada Keren Ribeiro mudou-se há pouco do Monte Cristo, mas seus irmãos e sobrinhos seguem no bairro:
— Soube ainda na madrugada e voei para cá. Aqui moram nove pessoas e um bebezinho de dois meses. A casa está toda cheia de barro, os móveis encharcados, sem condições de uso. Em 2017 houve algo parecido, mas com menor proporção – disse.
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“Agora é que a gente está compreendendo o que aconteceu”
Enquanto a reportagem conversava com Karen, Antônio Marcos, tio na família, apresentou uma placa de sinalização da Casan que foi arrastada para dentro da casa da família. Uma distância de quase 100 metros. Portas do sobrado foram arrancadas e vidros quebrados.
— Agora é que a gente está compreendendo o que aconteceu – disse Antônio.
Com os braços arranhados, João Santos contava a força que fez para salvar o sobrinho, Robson, que precisou ser puxado pelo muro:
— Foi um estrondo muito grande e rapidamente alagou. A força d’água foi algo nunca visto, uma coisa assustadora – explicava.
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Caminhando de um lado para outro, Mario da Costa tentava achar o carro do genro. O veículo estava numa garagem que foi totalmente arrastada pela água. Enquanto isso, um funcionário da Casan marcava com um x em vermelho os veículos identificados pelos donos.
Memórias em um porta-retrato
Entre susto e lamentos, a solidariedade também se fez presente para as famílias do Monte Cristo.
— A gente veio distribuir água. Não é muito, mas até ouvir eles (os moradores) ajuda – contou uma estudante de psicologia acompanhada do namorado.
Além de atos solidários, existem pontos de recolhimento de doações através da Fundação Rede Solidária Somar, em Santo Antônio de Lisboa, e secretarias de Assistência Social e do Continente. As prioridades são roupas, produtos de limpeza, alimentos, utensílios domésticos.
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Ainda que demore, solidariedade e justa indenização poderão devolver um pouco de normalidade às famílias que tiveram suas moradias destruídas pelos 2 milhões de litros de água. Embora existam coisas que talvez não possam mais ser devolvidas, como as memórias do casal num porta-retrato que alguém encostou numa das esquinas do bairro hoje revirado.
— Quem será? – perguntou alguém.
— Não conheço. Mas certamente a água carregou – respondeu outra.
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