A agricultora Margarida Messiano dos Santos, 53 anos, não tem flor somente no nome. Honrando as raízes camponesas, ela também é responsável pela plantação de uma agrofloresta às margens da BR-282, em Florianópolis, onde mais de 100 mil carros passam diariamente.
Continua depois da publicidade
Saiba como receber notícias de SC no WhatsApp
A iniciativa começou despretensiosa, em 2001, quando Margarida se mudou para a comunidade Chico Mendes, na área continental da Capital de Santa Catarina, e precisou de uma horta para consumo próprio e dos vizinhos. Inscrita para receber alimentos das Centrais de Abastecimento (Ceasa), o que não era usado para as necessidades da família e dos vizinhos, era aproveitado como insumo ao cultivo. Até os mantimentos que caíam dos caminhões de abastecimento foram úteis para o plantio.
Com o tempo, o local passou a reunir milho verde, abacate, araçá, temperos e vários outros alimentos e flores que mostraram a resiliência e a capacidade de regeneração do solo — justamente uma das premissas dos sistemas agroflorestais, tipo de agricultura conhecido pela sustentabilidade (veja mais abaixo).
— Recolhia manga, abacate e todos os tipos de frutos com caroço. Fazia o aterro e germinava — conta.
Continua depois da publicidade
Margarida se alfabetizou já na vida adulta, mas se forma neste ano em Educação do Campo na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), após apresentar um TCC inspirado em sua trajetória. Atualmente, ela trabalha com hortas. Para a agricultura, ver o espaço tomado por lixo, tão perto de casa, não era uma opção. Ela não conseguiria “esquecer as raízes de camponesa” e também queria mostrar o ofício aos quatro filhos.
— Por isso, limpei [o terreno na frente da minha casa], e aproveitei o espaço para plantar várias espécies para muitas pessoas, que não conheciam o cultivo de alguns pés — diz Margarida, que precisou se mudar em 2021 para a comunidade de Vila Aparecida. A agrofloresta, no entanto, segue sendo visitada por sua idealizadora.
Margarida, de camponesa à universitária
Natural de Quedas do Iguaçu (PR), Margarida chegou em Florianópolis em 1997. Na Ilha de SC ela criou sua família e colocou em prática o conhecimento no trato da terra, que veio da necessidade de cultivar o próprio alimento. Porém, quando começou a limpeza da terra, ela não imaginava que a agrofloresta lhe daria também o primeiro diploma universitário da história da família — e que renderia tantos visitantes dedicados a trocas de saberes. O incentivo a voltar a estudar veio de um amigo agrônomo.
O TCC “Vida Margarida: narrativas de histórias de vida e a relação com o conhecimento”, apresentado no início do ano, é uma pesquisa a partir da sua própria história, com orientação da professora Gabriela Furlan Carcaiol.
Continua depois da publicidade
— Acredito que conseguimos construir um trabalho bonito, um trabalho robusto a partir dessa história, que é particular dela, mas que também é de muitos sujeitos do campo, das águas das florestas, das periferias — relata a docente.
No documento, Margarida detalha que, a partir do modo de compostar e produzir, as sementes e os restos de frutas germinavam e o espaço, aos poucos, foi regenerado.
— Quando me dei conta, não era mais uma simples horta, mas sim uma agrofloresta. Muitas pessoas vinham até a minha casa para trazer mudas para que eu plantasse — lembra.

Algumas plantas cultivadas na agrofloresta
- Abacate
- Abóbora
- Amoras
- Acerola
- Alface
- Araçá
- Goiaba
- Manga
- Milho Verde
- Carambola
- Limão
- Vergamota
- Cana-de-açúcar
- Banana
- Maracujá
- Feijão andu
- Ervas (para chá e para banhar o corpo)
Continua depois da publicidade
Quando a horta vira agrofloresta
Segundo Maiara Cristina Gonçalves, doutoranda em Biologia de Fungos, Algas e Plantas, na UFSC, as agroflorestas se diferenciam das hortas tradicionais pela diversidade de espécies e pelas diferentes camadas de plantas presentes no solo. Diferente da monocultura, sistema em que apenas um produto ocupa a área disponível, nos sistemas agroflorestais, a plantação divide espaço com árvores e dispensa o uso excessivo de agrotóxicos.
— A agrofloresta vai sempre se manter. O ciclo de nutrientes é continuo, diferente de uma horta, que quando finaliza o ciclo das hortaliças, a gente remexe os canteiros e coloca matéria orgânica retirada de outro lugar, para renovar o ciclo. A folha de bananeira, por exemplo, vai cair e vai ser deixada ali para ocorrer uma ciclagem de nutrientes — explica a especialista.
Nas agroflorestas, a produção costuma ser organizada em linhas com espécies de diferentes ciclos. Uma área pode ter plantas de ciclo curto, que levam alguns meses para ser colhida, com plantas de ciclo perene, além de árvores que protegem as plantas menores e podem ser colhidas depois de duas ou três décadas. Segundo Maiara, é interessante fazer um planejamento antes de iniciar o cultivo de uma agrofloresta.
— Tem que pensar quanto tempo a espécie vai demorar para crescer e produzir. Por exemplo, quando a gente inclui uma bananeira na nossa horta de alface, couve, cebolinha, a gente já sabe que aquela bananeira vai demorar determinado tempo para frutificar, e que ela não vai influenciar na vida das espécies de ciclo curto — conclui.
Continua depois da publicidade
Quantas Florianópolis cabem aqui? As histórias de quem escolheu viver na cidade nestes 350 anos
Leia também
“Fazer resumo e repetir exercícios”, indica “concurseiro” aprovado na UFSC
VÍDEO: Internado em hospital de Joinville, homem faz surpresa emocionante para a esposa