No ambiente caótico da internet, ganha importância a imprensa profissional com seus códigos de ética e suas técnicas de apuração de informações.
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Assim como as manifestações violentas, as depredações e os incêndios de ônibus aterrorizam o país e indicam ausência de autoridade, também a proliferação de justiçamentos e de linchamentos sinaliza para um rumo perigoso de barbárie e de ameaça à democracia. Depois da série de pessoas amarradas em postes e agredidas na rua, registra-se o terrível assassinato da mulher suspeita de sequestrar crianças, apenas por sua semelhança com um retrato falado irresponsavelmente divulgado na internet. Os boatos disseminados pelas redes sociais são recorrentes e, infelizmente, muitas pessoas se deixam convencer por informações e opiniões pouco fundamentadas, maldosas e até mesmo desatualizadas.
Não é incomum que episódios destituídos de qualquer comprovação ganhem status de verdade e sejam repassados até por ingenuidade, atingindo um público de desavisados. Internautas são constantemente convocados a compartilhar correntes suspeitas, fotos e textos supostamente engajados em alguma causa e mesmo denúncias sem qualquer fundamento, que se disseminam na velocidade da rede, sob o amparo da impunidade. Na maioria das vezes, as postagens são motivadas por razões políticas ou ideológicas. Redes são úteis, mas se prestam a tudo, inclusive para estimular as trevas, os baixos instintos, teorias conspiratórias e delírios.
A sociedade conectada precisa aprender a repelir e rejeitar o lixo virtual. No mais recente caso de assassinato coletivo com origem nas redes sociais, as supostas denúncias, baseadas num fato real, foram usadas para disseminar temores incorporados ao imaginário popular: o de uma mulher que sequestra crianças. Entre os comentários nos milhares de compartilhamentos da postagem, os mais comuns eram frases como “quem pegar primeiro deve encher ela de pau”. É o tipo de postagem que já deixa subentender o baixo nível de informação comum a quem age dessa forma e o elevado grau de intolerância, ao ponto de conclamar exércitos de justiceiros pela internet.
Na maioria das vezes, o primeiro linchamento se dá pelas redes sociais, com um agravante: nem os responsáveis pelos incitamentos virtuais, nem os autores dos crimes na vida real acabam de fato sendo punidos. No ambiente caótico da internet, ganha importância a imprensa profissional com seus códigos de ética e suas técnicas de apuração de informações. Jornalistas tem formação para conferir, para buscar fontes e para não divulgar irresponsavelmente boatos danosos à sociedade. Linchamentos virtuais e reais são inaceitáveis.
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O Brasil não pode retroceder dessa forma nas liberdades conquistadas com a redemocratização, até mesmo porque reações anárquicas invariavelmente derivam para a repressão, para a censura e para o autoritarismo, muitas vezes com o apoio popular.