Mesmo com a sanção da Lei de Acesso à Informação, acrescida da regulamentação feita pela presidente Dilma Rousseff e da validação do Supremo Tribunal Federal (STF), a divulgação dos nomes e salários dos servidores públicos abriu um debate sem precedentes no país.

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Embora o decreto de Dilma tenha determinado explicitamente a publicação das informações, uma série de governantes resistem à ideia, muitos deles pressionados por sindicatos de funcionários públicos que estão obtendo algumas vitórias em tribunais de primeira instância para suspender os efeitos da lei.

No cerne do debate, a linha tênue entre o público e o privado. O interesse coletivo e o pessoal. A moralidade e o descalabro. Os princípios constitucionais da publicidade e da privacidade, que acabam entrando em rota de colisão.

Defensores da plena divulgação de listas abertas com a remuneração bruta e o nome dos servidores, a exemplo do que fez o STF, partem do princípio de que os salários do funcionalismo são pagos com o dinheiro arrecadado com a cobrança de impostos da população. Consequentemente, entendem que o cidadão tem o direito de conhecer a plena aplicação das verbas. Além de destacar que mecanismos parecidos já existem em mais de 90 países, eles defendem o conceito de que a opção pelo serviço público acarreta consequências nem sempre agradáveis.

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– Quem atua na área pública não tem o mesmo grau de privacidade em relação a outros cidadãos. Essencialmente porque quem paga o salário desse servidor é o cidadão – afirma Cláudio Abramo, presidente da ONG Transparência Brasil, de São Paulo.

Também constam na lista de argumentos o fato de os gastos com folha de pagamento do funcionalismo representarem 14% do PIB do país, conforme estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA).

– Não é uma curiosidade sobre quanto ganha um servidor público. Uma das vantagens da publicação é a comparação entre os poderes, que vai permitir a identificação de distorções como a dos ascensoristas do Congresso que ganham mais do que um médico ou um professor – avalia Gil Castello Branco, secretário-geral da ONG Contas Abertas, de Brasília.

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Na trincheira oposta, trabalhadores do setor público protestam contra a invasão da sua intimidade. Alegam vulnerabilidade diante de criminosos, fomento de problemas familiares e desrespeito ao direito da privacidade. Não apenas os sindicalistas, mas também especialistas em Direito constitucional veem problemas na publicação de listas com salários e nomes.

– Em relação ao agente político, o presidente, o governador, o ministro, me parece natural a publicação. Mas, no caso daquele trabalhador que faz parte da carreira pública, não há razoabilidade na publicação dos vencimentos. É uma exposição visceral – destaca Antônio Augusto Mayer dos Santos, advogado especializado em Constituição.

Ele argumenta que os servidores não tem a “mesma autoridade e poder de mando em comparação com agentes políticos”. Por isso, esse item da Lei de Acesso à Informação seria excessivo e inconstitucional.

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As ações de primeira instância que determinaram a retirada das informações salariais de servidores de alguns portais de transparência são exaltadas por sindicatos como comprovação da existência de “irregularidades” no ato.