Marissa Mayer é exceção no mundo dos negócios. Aos 37 anos, largou uma posição consolidada de executiva em uma das empresas mais poderosas de internet, o Google, pelo Yahoo!. Só pelo fato de ser mulher e jovem nessa posição – uma entre as 19 empresas da lista Fortune 500 que são comandadas por um cérebro feminino – Marissa já seria uma raridade.

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Às proezas, soma-se o fato de ter assumido, grávida de seis meses, como presidente executiva da empresa.

Para estar à altura do desafio de salvar uma empresa em declínio em um mercado no qual gigantes desaparecem com a mesma facilidade com que surgem, Marissa anunciou algo que, no Brasil, é corriqueiro para os homens, mas nos Estados Unidos não é incomum nem para as mulheres: pretende se manter conectada com o trabalho e voltar após poucas semanas em casa.

As declarações dela provocaram polêmica nas redes sociais e repercutiram em artigos nos principais jornais americanos. “Guerreira” e “mau exemplo” são alguns dos adjetivos contraditórios. A partir de agora, não importa o que faça, será criticada, escreveu uma jornalista no Financial Times. Seja por não assumir o desafio profissional de forma integral, seja por não dar atenção total ao filho. Guardadas as proporções do cargo e de uma sociedade sem previsão legal para a licença-maternidade, a dualidade de Marissa não tem nada de exceção.

Um dos responsáveis pela pesquisa As 150 Melhores Empresas para Você Trabalhar no Brasil, da revista Exame, o professor Joel Souza Dutra, da Faculdade de Economia, Administração e Ciências Contábeis da USP, diz que, ao contrário da executiva da Yahoo!, as mulheres perdem posições e promoções pela relação “filhos versus trabalho”:

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– Isso é muito velado, mas ocorre. São raras as empresas em que há proporcionalidade de homens e mulheres em cargos de chefia, e isso está ligado à maternidade ou à visão preconceituosa que se tem em relação a ela.

Na prática, consultores de RH constatam o que as estatísticas ainda não captaram nesse ambiente de alta performance executiva. Mulheres em altos cargos de gestão ficam menos de quatro meses afastadas e se envolvem de alguma maneira com o trabalho à distância, de casa. Licenças de seis meses são mais do que luxo, são distantes da realidade, lamenta Clara Linhares, professora em ênfase de pessoas da Fundação Dom Cabral:

– As empresas exigem a presença delas lá porque dependem de resultados. Elas ficam dois meses em casa e depois começam a participar, despacham em casa, fazem videoconferências.

No Brasil, com a maternidade assegurada não só pela legislação, mas valorizada pela sociedade – bem diferente dos EUA -, boa parte das mães adiam a maternidade até o relógio biológico gritar para poderem se dedicar a ela. Mas a decisão é uma das que mais causam inquietação nas empresas, acrescenta Dutra:

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– A gente percebe essa dificuldade especialmente no nível estratégico das empresas. O gestor na organização precisa estar na arena política, estar presente, defendendo seu espaço. Esse é o complicador.

O conflito – “a penalidade da maternidade” – pode soar obsoleto quatro décadas depois da queima dos sutiãs, mas só ecoa porque as mulheres cresceram no mercado de trabalho, assim como Marissa.